Marcio Pochmann: a destruição de empregos no Brasil e nos Estados Unidos

Brasil ingressou na pandemia com o mundo do trabalho profundamente debilitado, cenário refletido na destruição de empregos do setor produtivo e industrial, três vezes maior que a dos EUA

Por Marcio Pochmann

A crise sanitária aberta pela pandemia do coronavírus impactou negativamente a economia e, por consequência, a classe trabalhadora. A forma com que os governos conduziram as medidas de enfrentamento da onda viral ajuda a entender diferentes resultados em relação ao emprego destruído, por exemplo.

De maneira geral, o nível de emprego contraído recentemente também reflete a composição da estrutura ocupacional existente, bem como o seu comportamento nos últimos anos. Destaca-se, nesse sentido, como o nível e a composição das ocupações foram afetados negativamente desde o início da grave recessão em 2015 no Brasil.

Entre o último trimestre de 2014 e o trimestre móvel (nov/dez2019/jan2020) que antecedeu a chegada da covid-19 no país, o total da ocupação aumentou 1,2 milhão de pessoas, pois passou de 92,9 milhões para 94,1 milhões de trabalhadores. Em contrapartida, o desemprego que era de 6,4 milhões de pessoas aumentou para 11,9 milhões no mesmo período de tempo.

Também se pode ressaltar a queda de 7,6% na taxa de assalariamento formal que passou de 51,3% do total dos ocupados no último trimestre de 2014 (47,7 milhões de empregados) para 47,4% no trimestre móvel de nov/dez2019/jan2020 (44,6 milhões de empregados). Com 3,1 milhões de empregos assalariados formais a menos, nota-se que a ocupação que aumentou em 4,3 milhões de trabalhadores foi justamente aquela desprotegida de direitos sociais e trabalhistas, cujas reformas trabalhista e previdenciária realizadas teriam por objetivo resolver. Ledo engano.

Composição dos empregos destruídos em abril de 2020 no Brasil e EUA (em %)

 

Itens Brasil EUA
Emprego não agrícola 100 100
Administração pública 2,7 4,8
Emprego privado 97,3 95,2
Produção 30,7 11,5
Construção 7,8 4,8
Indústria 22,9 6,7
Serviços 66,6 83,7
Comércio 26,9 14,9
Transporte 6,0 2,8
Informação 1,5 1,2
Atividades financeiras 0,6 1,3
Profissionais e serviços em negócios1 2,5 10,4
Lazer e entretenimento 18,5 37,3
Outros 10,6 15,8

Fonte: Seprt/ME – Caged e Department of Labor/BLS

Em função disso, o Brasil ingressou na pandemia do coronavírus com o mundo do trabalho profundamente debilitado, diferentemente de outras nações. Em comparação com os Estados Unidos, a composição dos empregos não agrícolas destruídos no mês de abril de 2020 se apresentou relativamente diferente no Brasil.

Nos EUA, por exemplo, quase 84% dos empregos destruídos ocorreram no setor de serviços. Enquanto no Brasil esse mesmo setor econômico respondeu por menos de 67%. A diferença encontra-se no fato de que a destruição dos empregos dos brasileiros ter sido quase 3 vezes mais elevada no setor produtivo, sobretudo na indústria.

No mês de abril, a destruição de empregos na indústria dos EUA correspondeu a menos de 7% do total. Ao passo que o Brasil representou quase 23%. Ou seja, 3,4 vezes maior no Brasil, que nos EUA, o peso da manufatura no total de emprego destruído.

Por fim, no setor de serviços, dois aspectos interessantes a registrar. O primeiro relacionado ao fato do comércio no Brasil ter respondido por quase 27% do total da destruição dos empregos e o de lazer e entretenimento por 18,5%. Enquanto nos EUA o comércio respondeu por menos de 15% dos empregos perdidos e o entretenimento e lazer por 37,3%.

O segundo aspecto deriva do reconhecimento que nos EUA a administração pública atingiu quase 5% do total do emprego destruído em abril de 2020. No Brasil em contrapartida, a administração pública representou menos 3% do total dos empregos destruído.

Em síntese, a participação do comércio no total do emprego destruído no Brasil foi 1,8 vezes maior que nos EUA, cujas atividades de lazer e entretenimento tiveram 2 vezes mais importância relativa na destruição do total do emprego do que no Brasil. Na administração pública, por fim, o peso relativo nos empregos destruídos nos EUA foi 1,8 vezes maior que o Brasil.

Rede Brasil Atual

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