MP pede suspensão do consignado do Auxílio Brasil por ser ‘medida eleitoreira’
Subprocurador do Ministério Público apontou caráter ‘fora das finalidades da Caixa’, banco que já está oferecendo a modalidade desde a última terça. Idec e economistas enxergam ‘agiotagem’ no consignado
A oferta de crédito consignado aos beneficiários do Auxílio Brasil, com descontos dos empréstimos nos próprios benefícios, foi contestada pelo Ministério Público (MP) do Tribunal de Contas da União (TCU), que entrou com uma liminar para que a Caixa Federal suspenda as operações.
Para o MP, a medida é eleitoreira do governo de Jair Bolsonaro (PL) para tentar ganhar a eleição a todo custo. Já o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), considera os juros, que chegam a 51% ao ano, extorsivos. Segundo Idec, é “uma agiotagem que só beneficiará os bancos e instituições financeiras”. Essa é a mesma avaliação da técnica do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Adriana Marcolino. Segundo ela, “o sistema financeiro vai drenar o recurso do auxílio que é destinado basicamente para a segurança alimentar das pessoas mais vulneráveis”.
No despacho em que orienta pela suspensão da operação, o subprocurador do MP, Lucas Furtado, pediu que que a Caixa se abstenha de realizar novos empréstimos consignados aos beneficiários do Auxílio Brasil, até que o TCU se manifeste sobre o assunto, justamente porque há indícios de uso eleitoral.
A medida, ainda de acordo com o subprocurador, visa “conhecer e avaliar” os procedimentos adotados pela Caixa Econômica Federal para a concessão de tais empréstimos, “de modo a impedir sua utilização com finalidade meramente eleitoral e em detrimento das finalidades vinculadas do banco, relativas à proteção da segurança nacional ou ao atendimento de relevante interesse coletivo”.
No cenário atual, com a aproximação do segundo turno das eleições e com as dificuldades enfrentadas pelo presidente nas pesquisas de intenções de voto, “tudo indica tratar-se de medida destinada a atender prioritariamente interesses político-eleitorais, que relegam o interesse público a segundo plano, com vistas à obtenção de benefícios pessoais em detrimento da população”, diz trecho do despacho.
Andamento dos empréstimos
Desde a última terça-feira, a Caixa já vem oferecendo os créditos consignados aos beneficiários com taxas de juros de 3,45% ao mês. O prazo máximo para pagamento é de 24 meses. Outros 11 bancos estão autorizados a conceder o empréstimo.
Até agora cerca de 700 mil pessoas já contrataram o consignado. A média dos valores dos empréstimos é de R$ 2,6 mi. O volume total de transações soma R$ 1,8 bilhão de reais.
Críticas
A possibilidade de beneficiários do Auxílio Brasil contraírem os empréstimos consignados é duramente criticada também por institutos de defesa do consumidor e por economistas.
“Talvez, a ideia de pegar um empréstimo de R$ 2.500, pode parecer uma boa solução momentânea, para desafogar. Mas as chances de se tornar uma dívida impagável, uma verdadeira bola de neve, são enormes”, diz o Idec. Veja no final os alertas que a entidade fez aos beneficiários do Auxílio Brasil.
A economista e coordenadora do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Patrícia Pelatieri concorda que a medida de Bolsonaro é eleitoreira.
“O presidente está desesperado para colocar dinheiro na economia e, para isso vem tomando medidas como essa”, diz Patrícia.
Também crítica ao programa, a presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Ramo Financeiro (Contraf-CUT), Juvandia Moreira, afirma que ‘se trata de uma medida no mínimo controversa’.
“O que pode parecer um benefício acaba sendo uma arapuca que vai prender as famílias em dívidas com os bancos. E diante dessa conjuntura, ao invés de criar políticas de geração de empregos, aumento da renda, redução da inflação e correção da tabela do imposto de renda, o governo propõe medidas que irão gerar ainda mais endividamento para as famílias brasileiras, inclusive entre as mais vulneráveis”, diz Juvandia.
No seu portal, o Idec fez um alerta para os riscos de os beneficiários do Auxílio Brasil tomarem esses empréstimos. “Apesar de parecer uma boa notícia, ela é recheada de armadilhas”, diz publicação do Idec.
Estre os alertas, estão:
Conferir os juros dos bancos: para beneficiários do Auxílio Brasil, a taxa máxima de juros de 3,5% ao mês, equivalente a 51% ao ano, taxa que para o Idec é abusiva por ser bem maior do que a praticada atualmente para outros tipos de empréstimo consignado, como os para aposentados, pensionistas e servidores públicos.
Valor do desconto: se o benefício é R$ 400,00, o desconto mensal poderá chegar aos R$ 160,00 pelos próximos 24 meses. É preciso ter em mente que nos próximos meses o benefício vira com valor de R$ 240.
Cuidado com o fim do Auxílio Brasil: Se fizer o empréstimo e, por algum motivo, sair do Auxílio Brasil, o beneficiário terá de pagar a dívida do mesmo jeito, com ou sem dinheiro e sem ajuda do governo.
Assédio e propaganda: O Idec recomenda que sejam denunciadas ofertas desses empréstimos. A portaria que instituiu a liberação do consignado para os beneficiários proíbe propaganda por parte dos correspondentes bancários e também na internet, televisão e outros meios.
Reflita antes de decidir pelo empréstimo: o Idec alerta que o valor do Auxílio Brasil ainda é muito baixo para as pessoas que precisam desse dinheiro para poder sobreviver.
Para os especialistas do Idec, “é melhor lutar agora para que haja um programa de renda mínima universal no país e que pague um valor justo para as pessoas mais pobres do que pegar um empréstimo que pode se tornar uma dívida de uma vida inteira”.