O ano que exige coragem: para lutar, para resistir, para ousar
José Geraldo de Santana Oliveira
Consultor jurídico da Contee
“O correr da vida embrulha tudo.
A vida é assim: esquenta e esfria,
aperta e daí afrouxa,
sossega e depois desinquieta.
O que ela quer da gente é coragem.”
A paradoxalmente singela e profunda análise do cotidiano da vida humana, contida nas palavras da epígrafe, representa mais uma imortal e inesquecível lição ministrada pelo também imortal, o mago da alma humana, o mestre Guimarães Rosa – que, consoante as suas próprias palavras, acha-se encantado desde 1967.
Esta lição, atemporal e universal, reflete, com exatidão, a vida brasileira; muito embora esta quase sempre se esquente, quando se trata de agruras, e esfrie-se, no tocante a conquistas; e, por isso, aperta-se, muito mais do que se afrouxa; e desinquieta-se mais do que se sossega.
Apesar de tudo isto, à vida brasileira jamais faltou coragem, tendo sido esta, ao longo dos séculos, o seu farol e o seu porto seguro. O Estado democrático de direito, implantado pela Constituição de República Federativa do Brasil (CR) de 1988, representa a mais colossal e emblemática demonstração desta bravura indômita.
O ano de 2014, que se descortina no horizonte, terá, para a vida brasileira, a marca indelével de incontáveis desafios, que, como nas centenas de outros anos que o antecederam, com certeza exigir-lhe-á coragem: para lutar, para resistir, para ousar e para ampliar conquistas sociais e políticas. O certo que os desafios, para o ano de 2014, pululam-se.
A coragem, exigida pela vida, espera que as forças que pugnam pela justiça e pelo bem estar sociais sejam capazes de:
– não permitir a volta, ao centro do poder, dos fantasmas que perambulam pelo horizonte da democracia, ameaçando-o com promessas vazias e desprovidas de sinceridade, autointitulando-se o novo, não obstante o cheiro de ranço que exalam;
– conter a ensandecida sanha de supressão de direitos sociais, representada pela famigerada terceirização e prevalência do negociado sobre o legislado, que conta com a explícita cumplicidade do Palácio do Planalto;
– garantir, finalmente, a construção do padrão de qualidade social da educação, de maneira sistêmica, com regras comuns para o ensino público e privado, o que demanda mudanças profundas no Plano Nacional de Educação (PNE), sob discussão, bem como a sua aprovação e efetivação;
– assegurar que a composição do Congresso Nacional, para a próxima legislatura, a iniciar-se em 2015, seja mais obsequiosa com a cidadania e menos consigo mesma e com os seus financiadores de campanha, como vem se repetindo por décadas a fio;
– fazer com que a Presidência da República dispense aos trabalhadores e às suas relevantes bandeiras sociais, tais como o fim da dispensa imotivada, do fator previdenciário, da redução da jornada de trabalho sem redução de salários, da queda da taxa de juros, ao menos a mesma simpatia e o mesmo empenho na sua consecução até aqui dispensados aos empresários e aos seus interesses, na maioria escusos e negadores dos reais e únicos objetivos da ordem social brasileira, conforme preconiza o Art. 193, da CR: bem estar e da justiça sociais.
Afinal, parafraseando Machado de Assis – o bruxo do Cosme Velho – em sua incomparável obra Memórias Póstumas de Braz Cubas, “vida é luta; vida sem luta é um mar morto no centro do organismo universal”.
À luta, Brasil, pois que um verdadeiro filho seu a ela não foge, nunca.