O crescimento do EaD no Brasil e seus impactos na educação

Nos últimos anos, o Ensino à Distância (EaD) tem se expandido de forma significativa no Brasil. Entre 2018 e 2024, o número de polos EaD saltou de 15 mil para 47 mil, refletindo um aumento expressivo na oferta de cursos nessa modalidade. No entanto, essa expansão desenfreada tem levantado preocupações quanto à qualidade da educação oferecida, especialmente em áreas que exigem uma formação técnica rigorosa.

Segundo dados divulgados pelo Ministério da Educação (MEC) e levantados pela Folha de S. Paulo, cerca de 46% dos polos EaD são terceirizados, ou seja, não são administrados diretamente pelas instituições que os criaram. Esse modelo de gestão, que entrega parte expressiva das mensalidades (aproximadamente 30%) a terceiros, muitas vezes desqualificados, tem sido alvo de críticas. A falta de controle e a terceirização indiscriminada transformaram a educação em um negócio lucrativo para alguns, mas prejudicial para muitos.

Um dos principais críticos do atual modelo de EaD é o Conselho Federal de Enfermagem (Cofen). O presidente do Cofen, Manoel Neri, expressou sua preocupação com a formação de profissionais de Enfermagem através dessa modalidade. Ele destaca que a educação à distância para cursos que envolvem práticas de saúde pode resultar na formação de profissionais de baixa qualidade, colocando em risco a segurança dos pacientes. “Essa modalidade tem provocado uma verdadeira tragédia no campo da saúde”, afirma Neri, enfatizando que o modelo de EaD é inadequado para profissões que exigem habilidades práticas e contato direto com pacientes.

Além disso, a presidente da Associação Nacional das Universidades Particulares (ANUP), Elizabeth Guedes, critica a proliferação descontrolada de polos EaD, afirmando que eles podem ser encontrados em locais inusitados, como funerárias e áreas remotas. A falta de inspeções presenciais, uma prática abandonada pelo MEC desde 2017, contribuiu para essa “bagunça”, como descrito por Guedes, permitindo que o mercado educacional operasse sem regulamentação adequada.

A discrepância entre o número de alunos ingressando em cursos EaD e presenciais também é notável. Em 2022, mais de 3,1 milhões de pessoas se matricularam em cursos à distância, comparado a 1,6 milhão no ensino presencial. Profissões como Pedagogia, Administração, Contabilidade, Sistemas de Informação, Gestão de pessoas e Enfermagem são as mais afetadas por essa mudança. Para o professor Julio Bertolin, da Universidade de Passo Fundo, o que ocorreu foi uma “massificação” da educação superior, em vez de uma verdadeira democratização.

Atualmente, existem 17,2 milhões de vagas disponíveis em cursos EaD, contra 5,6 milhões no ensino presencial, segundo o último Censo da Educação Superior. Essa diferença substancial reflete a preferência crescente pelo ensino à distância, mas também levanta questões sobre a qualidade e eficácia dessa modalidade, especialmente em áreas que exigem formação prática.

Diante desse cenário, há um consenso entre especialistas sobre a necessidade de rever o atual modelo de EaD no Brasil, especialmente em profissões regulamentadas. A preocupação é que a formação inadequada possa comprometer a qualidade dos serviços prestados à sociedade, como é o caso na área da saúde. O MEC, por sua vez, já tomou medidas para proibir a abertura de novos cursos EaD e está em processo de criar um novo marco regulatório para o setor, buscando assegurar uma educação de qualidade e evitar que a educação continue sendo tratada como mera especulação financeira.

Por Vitoria Carvalho, estagiária sob supervisão de Romênia Mariani

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