O dia em que Gilmar repercutiu as denúncias sobre a indústria da delação no Supremo

Jornal GGN – Era o início do julgamento do habeas corpus (HC 143333) de Antonio Palocci na Lava Jato, que está preso provisoriamene há mais de um ano por ordem de Sergio Moro. Gilmar Mendes, então, pediu licença ao ministro Ricardo Lewandowski e abriu, diante dos colegas ministros, uma informação de bastidor que endossa o que GGN vem denunciando há tempos: que existe uma indústria da delação premiada em Curitiba, que escolhe quais escritórios de advocacia vão participar das negociações e ganhar fortunas e quais ficarão de fora.

No caso, Gilmar citou o exemplo do advogado Rodrigo Castor de Mattos, que atuou na delação de João Santana, mesmo sendo irmão do procurador da Lava Jato Diogo Castor de Mattos.

Gilmar parafraseou o advogado José Roberto Batochio para narrar o seguinte episódio: “Esteve comigo, quando imaginava que ia se julgar esse habeas corpus, o doutor Batochio, nos idos do ano passado. Ele disse: ‘fui constituído pelo doutor Palocci [como advogado de defesa na Lava Jato], mas estou deixando o caso. Estou deixando, mas sinto envolvido e, por isso, fiz questão de vir aqui despachar. Estou deixando o caso porque Curitiba assim exige.”

“Palavras do doutor Batochio”, disse Gilmar: “Curitiba assim exige.”

Segundo a revelação, Palocci estava em vias de negociar uma delação premiada e, por isso, foi obrigado pela força-tarefa a trocar de defensor.

“O que o doutor Batochio fez, com a seriedade do grau, foi apontar que estavam a escolher advogados para a delação, ou aqueles que nao poderiam sê-lo. Veja como esse sistema está engendrando armadilhas e, na medida em que estamos [no STF] diminuindo nossa competência, estamos o alimentando. É o ovo da serpente”, disparou Gilmar, convocando os colegas de corte a não esvaziar o uso dos HCs e consequentemente empoderar ainda mais a República de Curitiba.

Em meio à revelação, Gilmar olhou para a procurador-geral da República, Raquel Dodge, que estava sentada ao lado da presidente Cármen Lúcia, e disse: “Este é um ponto importante, doutora Raquel, para prestar atenção: para a necessidade de transparência nesse processo [de construção dos acordos de delação].”

“A corrupção já entrou na Lava Jato, na Procuradoria”, disse Gilmar, sacando um outro escândalo envolvendo o papel dos procuradores nas delações: “Alguém tem dúvida da atuação de Fernanda Tórtima e Marcelo Miller [no caso JBS]? É um classico de corrupção que tem que ser investigado e ser dito.”

“O que estou falando aqui não é segredo para mim nem para o relator [Edson Fachin, que é de Curitiba”, acrescentou Gilmar, ao advertir que “a Procuradoria-Geral tem que tomar providências em relação a isto, aos fatos conhecidos.”

O ministro Luiz Fux interrompeu a manifestação de Gilmar para frisar a gravidade da denúncia e pedir investigação.

“Eu nunca ouvi falar desse doutor Castor. Acho que temos, como magistrados, de registrar essa sua fala e instaurar um procedimento para apurar isso. Isso não pode ser ouvido assim. Somos juízes!”, disse Fux. “Um juiz não pode ouvir isso de forma passiva”, defendeu. “É o que estou dizendo à procuradora [Dodge]”, respondeu Gilmar.

Gilmar Mendes ainda lembrou que fora o escândalo da seleção de advogados, há ainda relatos dando conta de que “pessoas que são indicadas para serem delatadas. Temos o caso de André Esteves que foi delatado por Delcídio [do Amaral] e era falso, e mesmo assim ficou preso. Já temos um caldo de cultura para discutir isso.”

EM FAVOR DO HC

Ao final da manifestação, Gilmar disse que “não é possível que nós não estejamos observando” os abusos da Lava Jato.

“Esse tribunal só não é menor porque é composto por figuras que o cumpuseram no passado. Não tem nada mais importante na doutrina do tribunal do que o habeas corpus!”, advertiu.

“Essas invencionices [para derrubar o HC de Palocci] não apenas matam o instituto do HC, mas matam também, um pouco, a este tribunal.”

Em outra passagem, Gilmar disse que “se a gente não concede habeas corpus, veja o poder que se dá para essas instituições. Se chancelarmos esse poder, vamos ser, no mínimo, cumplices de várias patifarias que estão a ocorrer. O caso do doutor Castor, em Curitiba, o caso de Miller, aqui [em Brasíloia]. É notório que teve corrupção.”

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