O recado das manifestações em defesa da educação
Educação e o projeto para Brasil Soberano e Democrático
Por Maria Clotilde Lemos Petta*
“… Se você esteve entre o milhão de pessoas — só em São Paulo — que tomou conta das ruas em defesa do ensino brasileiro no dia 15 de maio, presenciou a combinação de educação solidária, defesa de um ensino cidadão e outra forma de sonhar o país. A multidão não só sabia a fórmula da água, como com quantos cidadãos se faz um tsunami” (Vera Iaconelli — artigo — Rua, Bolsonaro! — Cotidiano/Folha de São Paulo — 21/05/2019).
As manifestações que ocorreram no último dia 15, reunindo cerca de dois milhões de estudantes, professores e trabalhadores, são demonstrações de que a pauta educação adquire cada vez mais centralidade no debate político do país. Em que pese a complexidade do fenômeno educativo, o papel estratégico da educação no desenvolvimento social, econômico e cultural de um país tornou-se consenso. O que explica o repúdio crescente às medidas implementadas pelo governo Bolsonaro, que impõe graves retrocessos à área educacional do país.
Além do grande número de participantes, em sua maioria jovem, as centenas de cartazes produzidas pelos manifestantes apresentavam frases cujo conteúdo se diferencia das que surgiram nas manifestações de 2013, na medida em que contemplavam as diversas bandeiras históricas das lutas educacionais que têm sido defendidas pelos setores democráticos e progressistas do país. Ao invés de frases tipo “Educação padrão Fifa”, manifestantes de 2019, com muita criatividade, ressaltavam, entre outras questões, a defesa da escola pública, o papel da universidade pública como produtora de ciência, o combate à mercantilização e privatização da educação, a inclusão das disciplinas como filosofia e sociologia no currículo escolar.
Sendo assim, o conteúdo dos cartazes, além de oposição às medidas do governo Bolsonaro e ao corte de verbas para educação, revela um posicionamento que extrapola o senso comum na defesa da educação. As frases escolhidas demonstram um posicionamento claro sobre qual educação, qual escola, qual universidade é necessária para a construção de um projeto de país soberano e democrático. Os inúmeros cartazes reforçando a importância da produção acadêmico-científica das universidades públicas demonstram a crescente resistência à concepção hegemônica e neotecnicista de educação, que entende o processo de aprendizagem como treinamento para determinados empregos, tendo seu papel restrito ao atendimento ao mercado de trabalho, por sinal cada vez mais excludente.
Especialistas em educação têm alertado para as consequências nefastas dessa concepção neotecnicista, no momento em que a descoberta científica e as novas tecnologias são aplicadas de forma acelerada, alterando drasticamente a natureza do trabalho em todos os setores e ocupações. Isso torna estratégico, para um projeto de país soberano, o papel das universidades na fomentação de pesquisas pioneiras de base e as adaptações técnicas inovadoras. Coloca-se para a escola, em todos os níveis, o desafio de, tendo como base a transmissão da herança cultural da humanidade em todas as áreas, a construção de modelos de formação que propiciem o desenvolvimento de habilidades sociais e criativas, possibilitando a elaboração de novas ideias.
Nessa perspectiva, Klaus Schwab, fundador e presidente executivo do Fórum Econômico Mundial, no seu livro “A Quarta Revolução Industrial”, alerta para a necessária “visão abrangente e global sobre como a tecnologia tem mudado nossas vidas e mudará as das gerações futuras, e sobre como ela está remodelando o contexto econômico, social, cultural e humano em que vivemos” (Schwab Klaus, 2018).
Portanto, as medidas do governo Bolsonaro merecem total repúdio dos setores comprometidos na construção de um país soberano e democrático. A convocação de um dia de protesto, 30 de maio próximo, pelas entidades estudantis — União Nacional dos Estudantes (UNE), União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes) e Associação Nacional de Pós-graduandos (ANPG) —, com apoio do movimento sindical e popular, é muito importante. As entidades solicitam que os estudantes compareçam às ruas com suas produções acadêmicas e materiais de estudo.
O que está em jogo é o futuro das novas gerações e de nosso país. Sendo assim, o posicionamento da juventude estudantil, unida aos movimentos sociais, na defesa dos interesses nacionais deve fortalecer as mobilizações para a greve geral de todos trabalhadores no dia 14 de junho, em defesa da aposentadoria.
Vivas aos estudantes!
*Maria Clotilde Lemos Petta é professora licenciada da PUC Campinas, coordenadora da Secretaria de Relações Internacionais da Contee, diretora do Sinpro Campinas e Região e vice-presidente da Confederação dos Educadores Americanos (CEA)