Os trabalhadores em guerra pela vida, pelo emprego e pelo salário
Nivaldo Santana
O movimento sindical brasileiro enfrenta desafios inéditos. Para atravessar essa conjuntura adversa, é fundamental uma vigorosa unidade das diferentes correntes do sindicalismo nacional – uma unidade gestada a partir da definição democrática de uma agenda consensual.
Em meio aos múltiplos ataques que os trabalhadores sofrem, até a definição das prioridades gera polêmica. Por onde começar? Como definir formas de luta em meio a uma pandemia? Como garantir emprego, salários e direitos sob uma grande desaceleração econômica? Como incorporar à resistência os trabalhadores desempregados, informais e precários?
Não existem respostas simples para problemas complexos. Em primeiro lugar, os sindicatos ainda sofrem os impactos dos retrocessos iniciados no governo Michel Temer (2016-2018), como a terceirização irrestrita (inclusive nas atividades-fim) e a reforma trabalhista – que legalizou o trabalho precário, limitou a atuação da Justiça do Trabalho e debilitou os sindicatos em sua sustentação financeira.
A partir de 2019, com o governo Jair Bolsonaro, o que era ruim ficou pior. Seu primeiro ato foi extinguir o Ministério do Trabalho, sinalizando sua vocação autoritária contra os trabalhadores. Na sequência, apresenta a medida provisória que cria a chamada “carteira de trabalho verde amarela”, jogando na lata do lixo os direitos trabalhistas que sobreviveram aos ataques.
Todas as medidas adotadas pela dupla Bolsonaro/Guedes, além de radicalizarem os ataques aos direitos e ao sindicalismo, não entregaram a mercadoria prometida: a economia continua no fundo do poço e o desemprego continua nas nuvens. Para seguir a rota ultraliberal – que é a marca central do governo –, essas medidas vêm acompanhadas de restrições crescentes à democracia.
Como tragédia pouca é bobagem, o Brasil também é vítima da pandemia do coronavírus, provavelmente a maior ameaça à saúde pública mundial em um século. São centenas de milhares infectados no Planeta e dezenas de milhares de mortos – números que, desgraçadamente, devem crescer ainda mais.
Diante dessa tragédia cruzada – retração econômica e pandemia –, o drama maior do Brasil é estar praticamente sem governo. Isolado política e socialmente, de forma irresponsável e até criminosa o governo subestima a gravidade do coronavírus e o drama da parcela mais pobre dos brasileiros. Seu saco de maldades parece não ter fim.
Diminui o número de beneficiários do Bolsa Família e do Programa de Benefício Continuado (BPC), congela a tramitação dos processos de aposentadoria, acaba com a política de valorização do salário mínimo. Em contrapartida, abre as burras do Tesouro para os bancos e grandes empresários. A última maldade foi a Medida Provisória (MP) 927/2020, que, entre outras perversidades, ataca salários e direitos dos trabalhadores, mas cria linhas de crédito e financiamento subsidiados para grandes empresários.
Resisitir a tudo isso é necessário. Necessário e complexo. As medidas de combate à pandemia, para além das obrigações do poder público, tem duas medidas essenciais: higiene e isolamento social.
Com isso, formas clássicas de luta como greves, manifestações e atos públicos – atividades que pressupõem aglomeração de pessoas – são inviáveis nas circunstâncias atuais de pandemia. A própria pressão política no Congresso Nacional está dificultada, pela adoção no parlamento nacional da votação virtual.
Nesse quadro, despontam como novas formas de luta a guerrilha virtual nas redes sociais e as manifestações nos bairros, à noite, com os panelaços. Podem não ter a mesma força e eficácia das grandes mobilizações de rua, mas contribuem poderosamente para o isolamento crescente do governo.
Por último, uma questão importante: essa crise crescente e generalizada – política, econômica, social – pode ser o caldo de cultura para aventuras golpistas dos governantes de plantão. O caos e o desgoverno do País, associado à crescente revolta do povo diante do atual descalabro, podem reavivar tentações autoritárias por parte da gestão Bolsonaro.
Por isso, além de ter uma agenda de defesa da vida, do emprego e dos salários, o movimento sindical precisa compor uma ampla frente política e social contra as ameaças à democracia. Dessa frente devem participar os movimentos populares, as organizações democráticas, os setores empresariais comprometidos com o desenvolvimento nacional e com responsabilidade social, os governadores (independentemente de sua orientação política), o Congresso Nacional (inclusive segmentos conservadores) e dissidentes do bolsonarismo.
A resistência unitária, ampla e afirmativa, com uma agenda democrática de valorização do trabalho e conteúdo social para salvar o País do descalabro, é o imperativo da hora presente. E deve ocupar o topo da agenda do sindicalismo nacional.
Nivaldo Santana é Secretário de Relações Internacionais da CTB e secretário de Movimento Sindical do PCdoB. Foi deputado estadual em São Paulo por três mandatos (1995-2007)