Pixinguinha e Lupicínio: a música popular como patrimônio cultural
A dica cultural da CONTEE desta semana celebra um marco para a memória musical do país. Em setembro, o Brasil reafirmou sua valorização da música popular com a sanção da Lei nº 15.204/2025 pelo presidente Lula, que declarou os compositores Lupicínio Rodrigues (1914-1974) e Alfredo da Rocha Vianna Filho, o Pixinguinha (1897-1973), patronos da música popular brasileira. A medida reconhece não apenas a genialidade de dois de nossos maiores mestres, mas também a força de tradições musicais que ajudaram a moldar a identidade nacional.
Alfredo da Rocha Vianna Filho, o Pixinguinha, é celebrado como um dos maiores compositores e instrumentistas brasileiros. Flautista, saxofonista, maestro e arranjador, ele foi responsável por consolidar o choro como gênero sofisticado, abrindo espaço para novas harmonias, diálogos com o jazz e arranjos que até hoje servem de referência. Obras como Carinhoso e Lamentos se tornaram parte do repertório afetivo de gerações.
O gaúcho Lupicínio Rodrigues é outro nome que ingressa na galeria do patrimônio cultural. Conhecido como o grande mestre da “dor-de-cotovelo”, levou o samba-canção a patamares de poesia e intensidade emocional que marcaram época. Canções como Loucura, Vingança e Nervos de Aço transformaram a dor amorosa em arte universal.
Nervos de Aço
“Você sabe o que é ter um amor, meu senhor
Ter loucura por uma mulher
E depois encontrar esse amor, meu senhor
Nos braços de um tipo qualquer”
Lupicínio Rodrigues compôs e Francisco Alves gravou em 1947.
A inscrição de Pixinguinha e Lupicínio Rodrigues como patrimônio cultural reforça a ideia de que a música popular brasileira é parte essencial da formação da identidade nacional. Mais do que símbolos artísticos, suas obras representam modos de viver, sentir e expressar o Brasil.
Para além dos registros musicais, o cinema brasileiro oferece caminhos para conhecer melhor a vida e a obra desses dois patronos. O filme “Pixinguinha, Um Homem Carinhoso” (2021), dirigido por Denise Saraceni e Allan Fiterman, com roteiro de Manuela Dias, traz uma abordagem sensível da trajetória do compositor. A produção mostra Pixinguinha em sua dimensão humana, com suas conquistas e dificuldades, e permite que o público vivencie, de forma dramatizada, o ambiente musical do início do século XX, quando o choro se consolidava como um dos símbolos da identidade nacional.
No caso de Lupicínio Rodrigues, o documentário “Lupicínio Rodrigues: Confissões de um Sofredor” (2024), dirigido e roteirizado por Alfredo Manevy, com colaboração de Armando Almeida e Márcia Paraíso, revela o universo íntimo e poético de suas composições. O filme mostra o quanto suas canções nasceram de experiências pessoais intensas que transformaram dores de amor em obras universais, contextualizando sua importância dentro da cena musical do Rio Grande do Sul e do Brasil, além de oferecer ao público contemporâneo um retrato sensível do artista que fez da “dor-de-cotovelo” uma verdadeira estética da canção.
Ao mesmo tempo, esse reconhecimento impõe responsabilidades. É dever do Estado e da sociedade criar políticas de salvaguarda, apoiar iniciativas de pesquisa, promover a difusão e incentivar a transmissão dessas tradições às novas gerações. Isso significa registrar histórias, digitalizar acervos, fomentar festivais, rodas e encontros que mantenham viva a herança desses mestres.
Ao transformar em patrimônio a obra de Pixinguinha e Lupicínio Rodrigues, o Brasil inscreve definitivamente a música popular no rol de seus bens mais preciosos. Trata-se de uma vitória simbólica, mas também prática: abre-se caminho para que novos recursos, programas e ações públicas sejam mobilizados em favor da preservação cultural.
Mais do que celebrar o passado, o gesto é um chamado ao futuro: que a genialidade de Pixinguinha e a poesia de Lupicínio sigam ecoando nos ensaios de rua, nas gravações, nos palcos e na memória afetiva do povo brasileiro.
Para quem desejar assistir às obras audiovisuais, “Pixinguinha, Um Homem Carinhoso” (2021) pode ser encontrado no catálogo do Globoplay, além de estar disponível para aluguel ou compra no Google Play e no Prime Video, bem como no canal Telecine. Já o documentário “Lupicínio Rodrigues: Confissões de um Sofredor” (2024) está disponível na plataforma CurtaOn, no canal Curta! via streaming na Amazon e também na Claro tv+.
Por Antônia Rangel

