PM reprime ato de professores e estudantes em mais um leilão de privatização das escolas paulistas

Consórcio SP + Escolas venceu a parceria público-privada do governo de Tarcísio de Freitas com lance de R$ 11,5 milhões

Enquanto mais 16 escolas paulistas eram leiloadas, na tarde desta segunda-feira (4), na bolsa de valores de São Paulo (B3), professores e estudantes, que realizavam um ato contra a medida, foram reprimidos pela Polícia Militar (PM) com uso de bombas de gás e cassetetes. Os manifestantes são contrários à parceria público-privada (PPP) do governo estadual que prevê a concessão de unidades da rede a consórcios que serão responsáveis pela construção e pela manutenção dessas escolas.

Professores e estudantes argumentam que o edital do leilão desconsidera o princípio da gestão democrática da educação, desrespeitando a integração entre a administração do espaço físico e as funções pedagógicas. Segundo o Sindicato dos Professores do Ensino Oficial de São Paulo (Apeoesp), trata-se da terceirização de uma atividade essencial ao serviço público de educação.

“A gestão das escolas deve ser democraticamente organizada com a direção da unidade e o Conselho de Escola. Assim como determina a LDB [Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional] e a Constituição Federal”, defende o presidente da Apeoesp, Fábio Moraes.

Repressão

“A PM, sob orientação do governador [Tarcísio de Freitas], cercou a bolsa de valores para evitar o acesso de manifestantes. Os estudantes, em determinado momento, querendo se aproximar mais, tentaram passar uma barreira que fizeram, e os policiais jogaram bomba de gás lacrimogêneo em cima dos meninos e dos professores, que estavam um pouco mais afastados”, relatou Roberto Guido, secretário de Finanças da Apeoesp, que esteve no ato.

Guido conta que o grupo também teve problemas na dispersão. “Queríamos sair de forma organizada, pacificamente, mas eles cercaram inclusive áreas que não eram perto da B3 e não deixaram a gente sair, foi até uma forma de castigo, porque estava uma chuva danada, estou encharcado”, acrescentou.

Fábio Moraes questionou o fato de o aparato policial ter sido usado em favor de empresas privadas. “[É um] absurdo utilizar a estrutura de segurança policial, um serviço público, contra a população e em defesa dos interesses de empresas que não têm qualquer conhecimento e relação com a Educação. Ao contrário, são empresas que visam somente o lucro e não a melhoria do processo ensino-aprendizagem de nossas escolas públicas.”

O professor Douglas Izzo, secretário de Administração e Finanças da Central Única dos Trabalhadores de São Paulo (CUT-SP), destacou, em um vídeo nas redes sociais, a continuidade da luta com a privatização da educação no estado. “Nós viemos aqui democraticamente manifestar nossa posição contrária à privatização de 33 escolas [total de dois lotes], porque educação não é mercadoria. Esse foi o recado que nós demos aqui para o Tarcísio. Foram privatizadas as escolas, mas a nossa luta continua, e nós vamos continuar na luta sempre, porque educação não é mercadoria”, reforçou.

A Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP) informou, por meio de nota, que a ação da PM ocorreu após “os participantes derrubarem o gradil e tentarem invadir o local”. Os policiais, portanto, “adotaram técnicas de controle de distúrbio civil para conter o grupo e restabelecer a ordem”. Ainda de acordo com o órgão, as equipes permanecem no local “para garantir o direito de livre manifestação e a segurança de todos os presentes, além da preservação do espaço público”.

Resultado do leilão

O Lote Leste, que prevê a concessão de 16 unidades, foi arrematado pelo Consórcio SP + Escolas com lance de R$ 11,5 milhões. A empresa venceu a disputa contra outros dois proponentes, representando um deságio de 22,51% sobre o valor máximo de contraprestação pública proposto pelo governo. O valor teto da contraprestação era de R$ 14,9 milhões mensais.

O consórcio vencedor fica responsável, durante 25 anos, pela manutenção da infraestrutura, gestão de limpeza, alimentação, vigilância e jardinagem e pela contratação de funcionários para essas áreas. Sob a responsabilidade da empresa também estão as atividades diárias escolares envolvendo o apoio aos alunos que não conseguem acessar com autonomia as instalações escolares.

Disputa judicial

Em 29 de outubro, ocorreu o leilão do primeiro lote, que incluiu 17 unidades da região oeste. O caso foi levado à Justiça pela Apeoesp, que conseguiu uma liminar para suspender o primeiro resultado. A decisão também impedia a negociação do Lote Leste, que ocorreu hoje.

Ao acolher o pedido, o juiz Luís Manuel Fonseca Pires, da 3ª Vara da Fazenda Pública, afirmou que a licitação pressupõe, equivocadamente, que é possível separar o espaço físico da atividade pedagógica.

A decisão, no entanto, foi derrubada pelo presidente do Tribunal da Justiça, Fernando Antônio Torres Garcia, que acolheu recurso do governo estadual e afirmou que a suspensão dos leilões afetava o cronograma de implementação de obras e serviços essenciais.

Luta contra privatizações

O secretário de Finanças da Apeoesp destaca que o grupo segue mobilizado na luta contra as privatizações das escolas. “Continuamos na Justiça, vamos fazer o debate político necessário, com manifestações e outras ações. A diretoria da Apeoesp se reúne essa semana para ver como respondemos a esse ataque”, relatou.

Ele pontuou ainda a mobilização contra o corte de verbas previsto pela Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 9, que diminui o percentual de repasse do ICMS para Educação, de 30% para 25%. “Ele [leilão de privatização das escolas] não está isolado, está articulado com o corte de verba da PEC 9, [que retira] os R$ 10 bilhões da Educação. Temos esta semana para dar uma resposta política, vamos analisar a conjuntura, o contexto”, indicou.

Guido também critica o fato de que o consórcio vencedor da primeira licitação é o mesmo que passou a fazer a gestão de cinco cemitérios na capital paulista após a privatização do sistema funerário em março do ano passado. De lá para cá, o valor do serviço popular ficou 500% mais caro.

Edição: Thalita Pires

Do Brasil de Fato

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