Prefeitos confirmam que pastores bolsonaristas pediam propina em dinheiro e até em ouro para liberar recursos no MEC

Representantes municipais participaram de audiência pública na Comissão de Educação do Senado após denúncias de que pastores evangélicos teriam influenciado ações na pasta

Em audiência pública ocorrida, nesta terça-feira (5), na Comissão de Educação do Senado, três prefeitos afirmaram que pastor evangélico cobrava propina em dinheiro, ouro e até por meio da compra de bíblias para conseguir liberar verbas no MEC (Ministério da Educação) para prefeituras.

Conforme os relatos dos prefeitos na audiência pública, as cobranças de propina partiam do pastor Arilton Moura. Segundo esses, ele também ajudava a viabilizar reuniões no MEC com o então ministro Milton Ribeiro e com o presidente do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), Marcelo Lopes da Ponte.

O pastor Gilmar Santos também foi citado entre os participantes das conversas. Os dois tinham trânsito livre no MEC.

O fato lembrou o esquema montado no Ministério da Saúde para compras ilícitas de vacinas contra a covid-19 desvendado pela CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Covid-19 realizada no Senado em 2021.

Prefeitos confirmaram denúncias

Os prefeitos foram chamados à comissão do Senado para prestar depoimento após denunciarem suposta atuação de pastores evangélicos com recursos do MEC para prefeituras.

As cobranças se davam em troca da construção de escolas e creches, disseram os prefeitos. Eles reforçaram ainda que, após a negativa do pagamento de propina, a verba para as obras não foi empenhada — liquidada e paga.

Entenda o caso

Em 22 de março, se tornou conhecida gravação na qual o então ministro da Educação, Milton Ribeiro, dizia a prefeitos que, a pedido do presidente Jair Bolsonaro (PL), repassava verba a municípios indicados por pastores evangélicos. O episódio levou à demissão de Milton Ribeiro.

De acordo com o prefeito de Luís Domingues (MA), Gilberto Braga, em 7 de abril do ano passado, ele foi a Brasília para participar de reunião no MEC. O objetivo do encontro seria discutir obras inacabadas vinculadas à pasta. Após a reunião, disse Braga, o pastor Arilton Moura convidou os prefeitos para almoço.

“Até então, eu não conhecia o ministro da Educação. O pastor estava, sim, sentado à mesa na hora da palestra no MEC e, em seguida, nós fomos para esse almoço. E, lá nesse almoço, que não estava o ministro, só estavam os dois pastores, tinha uma faixa de uns 20 a 30 prefeitos. E a conversa era muito bem aberta. Ele virou para mim e disse: ‘Cadê suas demandas?’”, relatou.

E seguiu: “E ele falou rapidamente: ‘Você vai me arrumar os R$ 15 mil para eu protocolar as demandas e depois que o recurso tiver empenhado, depois, como a sua região é de mineração, vai me trazer 1 quilo de ouro’. Eu não disse nem que sim nem que não, me afastei da mesa e fui almoçar”, acrescentou Gilberto Braga.

Ainda durante a audiência na CE do Senado, o prefeito de Luís Domingues disse que a conversa foi “aberta” e que todos que estavam à mesa ouviram.

“Então, eu acredito que ele tenha feito várias propostas para outras pessoas”, disse Braga.

Pedido de R$ 40 mil

O prefeito de Boa Esperança do Sul (SP), José Manoel de Souza, ainda durante a audiência pública na CE, reiterou que o pastor Arilton Moura pediu R$ 40 mil de propina, também para conseguir a liberação de recursos no MEC.

“O Arilton perguntou: ‘você sabe muito bem como funciona, né? O Brasil é muito grande, não dá para ajudar todos os municípios. Mas eu consigo te ajudar com uma escola profissionalizante. Eu faço um ofício agora, chamo a Nely, você assina um ofício, coloco no sistema e, em contrapartida, você deposita R$ 40 mil na conta da igreja evangélica’”, relatou o prefeito na audiência pública.

“Gabinete paralelo”

Os pastores evangélicos Arilton Moura e Gilmar Santos integravam, segundo as denúncias dos prefeitos, o chamado “gabinete paralelo” do MEC, tendo trânsito livre na pasta, com influência sobre a destinação de verbas e também sobre a agenda do então ministro Milton Ribeiro.

Na audiência pública, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) disse, em razão da influência do “gabinete paralelo”, que este era “oficial”, pois era o que funcionava efetivamente na parte de liberação de recursos para prefeituras, mediante esquema de pagamento de propina.

Quando o áudio de Milton Ribeiro se tornou conhecido, Gilmar Santos divulgou nota na qual negou envolvimento com qualquer ato ilícito ligado ao MEC.

Afirmou ainda não fazer parte do chamado “gabinete paralelo” e negou ter atuado em qualquer “ato de corrupção”, acrescentando também não exercer influência sobre a pasta ou sobre Milton Ribeiro.

Marcos Verlaine

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