Prêmio de Fernanda Torres une Brasil, diz diretora de Festival do Rio
Ilda Santiago quer que Globo de Ouro abra portas para mais brasileiras
“Está todo mundo com o coração aquecido e batendo forte. É muito bacana”. Este é o sentimento da diretora do Festival do Rio, Ilda Santiago, sobre o Globo de Ouro, recebido pela atriz Fernanda Torres, pela atuação em Ainda Estou Aqui, com direção de Walter Salles. “É impressionante e que bom ter uma coisa que consegue nos unir de muitas formas. Que consegue não só falar de um orgulho de ter esse prêmio, mas do orgulho de ter um filme brasileiro que chega nesse lugar. É uma alegria sem limite”, comentou Ilda Santiago à Agência Brasil, sobre a comoção que a entrega do filme provocou no país.
Esse movimento que o filme causou no público, para a diretora do Festival do Rio, é ainda mais valioso por se tratar da história de Eunice Paiva, uma mulher que atravessou dificuldades em um momento sombrio da história do Brasil.
“Poder dizer que o Brasil coloca em um filme como esse, uma mulher contando uma história de uma mulher brasileira tão importante, isso fala tudo. Ter a Dona Fernanda no final em uma participação de 1 minuto que vale por muitas horas, acho que fala também um pouco de onde a gente quer chegar como lugar, como espaço de contar as histórias sobre mulheres femininas e por um outro ângulo”, pontuou.
Ilda Santiago diz esperar que o Globo de Ouro da Fernanda Torres seja capaz também de abrir caminhos para mulheres no cinema brasileiro. “Quero muito que esse prêmio seja capaz de abrir muitas portas para mais diretoras brasileiras e não só diretoras, mas em todos os níveis criativos do cinema e para atrizes como um tudo. É muito importante também para todos os atores e atrizes jovens, porque isso diz para eles, que na verdade, o trabalho da atriz e do ator é um trabalho da vida inteira. Aliás, o trabalho de quem faz arte é de aprimoramento contínuo. Acho que isso dá para quem trabalha nessa área essa noção muito clara, de que o trabalho é importante e que o trabalho como mulher é muito importante perseverar mais ainda”, apontou.
A diretora do Festival do Rio destacou ainda que basear o filme na história e trajetória de luta de Eunice Paiva, esposa de Rubens Paiva, ex-deputado federal levado preso e morto na época da ditadura militar no Brasil, é mais um ponto positivo do filme Ainda Estou Aqui. Enquanto, em geral, seria tratado pela tragédia, o filme traz a trajetória e a vitória dessa mulher. “Tem ainda uma coisa mais linda ainda que é a Fernanda Montenegro, uma mulher também, uma atriz brasileira que estava lá há 25 anos com [o filme] Central do Brasil e dessa vez é a Fernanda, a Nanda, a filha, que fecha esse ciclo virtuoso de mostrar uma história e uma história fora do Brasil, que atravessa as nossas fronteiras”, observou.
Ilda lembrou ainda que Fernanda Torres foi também a primeira atriz brasileira a ganhar o prêmio de melhor atriz no Festival de Cannes com o filme Eu Sei que Vou Te Amar, dirigido por Arnaldo Jabor, em 1986. “Isso também completa um grande ciclo virtuoso para a Nanda. Acho que a gente pode trazer essas histórias que conversam muito profundamente com o país e a gente vê que hoje a delicadeza do filme conversa com o mundo todo”.
Venceu em português
A atriz Leandra Leal comemorou no seu perfil no Instagram o prêmio de Fernanda Torres, uma mulher que venceu falando em português e abriu um caminho para a arte, além de contar uma história que não pode ser esquecida.
“Foi final de copa do mundo! Emocionante! Uma atriz, mulher, escritora, artista, filha de artistas, falando português, ganhou o globo de outro!!!! Fernanda abriu uma porta gigantesca com talento, amor e arte! Grata Fernanda! Viva Eunice e a memória, a importância de contar histórias para não esquecer!”.
A ministra da Cultura, Margareth Menezes, também elogiou a atuação da atriz “Fernanda Torres, parabéns pelo Globo de Ouro! Que alegria ver seu talento sendo reconhecido no mundo todo! Você é motivo de orgulho pra cultura brasileira e pra todos nós. Essa conquista é mais que merecida e reforça o quanto sua arte é gigante. Que momento maravilhoso!”, disse também no Instagram.
Homenagem
Em outubro de 2024, logo após o término da programação, o Festival do Rio fez uma sessão especial do filme para homenagear as duas atrizes e o diretor e para destacar a importância de Ainda Estou Aqui. Ilda Santiago contou que até aquele momento nunca tinha ocorrido uma sessão especial após o fim do festival.
“O filme tem uma relevância para o Brasil como história como percepção do que é o país, do que a gente quer que justifique isso, e era também uma forma de ter as atrizes e todo elenco junto. A dona Fernanda está obviamente viajando menos, então, foi uma deferência também às Fernandas e ao Walter, fazer essa sessão especial e não me arrependo nem um pouco de ter aberto essa exceção, da gente ter feito este esforço de realmente poder ter o filme dentro do escopo do Festival do Rio, por tudo que ele está mostrando o que é. É sempre mais fácil de dizer depois que o sucesso já está acontecendo, o mais importante é poder perceber que existe alguma coisa especial e esse filme, de fato, tem alguma coisa especial, tem algo que fala com o momento do país e que fala com todos nós brasileiros e brasileiras”, afirmou.
Volta do público
A diretora comemorou ainda a procura do público brasileiro pelo filme. “A gente tem a sorte de ter filmes que vêm para dar essa virada de chave no público brasileiro para o cinema brasileiro. Esse filme teve essa capacidade. O mais lindo nisso é que é um filme que fala profundamente sobre a história do país e sobre a história de uma mulher, que coloca luz na trajetória de luta de uma mulher. Esse filme mais uma vez foi capaz de virar essa chave e de verdade levar o público brasileiro de volta às salas de cinema para um filme brasileiro, em um momento que é essencial. É essencial este retorno ao cinema, é essencial esta experiência coletiva como emoção. É isso que as pessoas contam: ‘saí do cinema chorando, saí do cinema emocionado’. Acho que é essa emoção que faz com que cinema valha a pena”.
Plateia mais jovem
Outro dado a se destacar, segundo Ilda, é a presença de uma plateia mais jovem.
“Esse é um filme que leva essa história e esse tempo sombrio do país para uma juventude, uma faixa etária que não viu e que mal ouviu falar ou que ouviu falar muito atravessado sobre um momento tão triste e tão sombrio da história do Brasil. Ter um filme que fala ao mesmo tempo com o público jovem e com um público que viveu ou leu sobre isso, é um mérito muito especial para o filme e para o cinema brasileiro também”.
O escritor Marcelo Rubens Paiva, autor do livro Ainda estou aqui, que deu origem ao filme, e um dos filhos de Eunice Paiva e de Rubens Paiva, enalteceu o prêmio de Fernanda Torres e lembrou outros artistas que também destacaram o cinema brasileiro no exterior.
“Tentaram acabar com o cinema brasileiro, criminalizar leis de incentivo à cultura, mas nós ainda estamos aqui. Eles se vão, a gente fica! Viva Fernanda Torres e Montenegro, Sônia, Marília, Glauber, Nelson, Babenco, Walter, Meirelles, Padilha, Kleber, Karim, Anselmo e tantos…”, postou em seu perfil no X.
Campanha
Tanto nas redes sociais, quanto em lojas já é possível ver a defesa para que Fernanda Torres conquiste também o Oscar em 2025. Uma camiseta que estampa a demanda já está popular no Rio com a mensagem: Dá o Oscar para ela. “A gente inventou isso e a coisa pegou. É o máximo”.
Ilda Santiago aponta semelhanças entre mãe e filha nas indicações a prêmios importantes. “É uma elegância e ao mesmo tempo está ‘tudo certo’, ‘onde chegamos está lindo. Eu estou gostando do que eu estou vivendo’. Acho que ela está nos conduzindo também dessa forma. Estamos gostando do que estamos vivendo com ela. Sem pressão, sempre com expectativa, mas muito mais com prazer de ver o processo do filme. A trajetória dela e do filme, isso é muito bonito também. Ela está nos pegando pela mão, o país inteiro, e nos levando dizendo ‘vamos lá, está tudo certo’. O que vier é maravilhoso e o que está vindo é maravilhoso”.