Professores escritores que inspiram com suas obras
A conexão entre a educação e a literatura é profunda, e muitos professores se destacam também como grandes escritores, levando suas vivências pedagógicas e experiências pessoais para o papel. Seus livros oferecem não só aprendizado acadêmico, mas também reflexões sobre o mundo e a sociedade. A seguir, apresentamos cinco desses mestres da palavra, destacando obras que todo leitor deve conhecer. Entre eles, Conceição Evaristo, que além de professora e escritora, também é uma notável poeta.
1 – Conceição Evaristo
Conceição Evaristo, de origem humilde, trabalhou de empregada doméstica antes de graduar-se em Letras na Universidade Federal do Rio de Janeiro. A professora Evaristo se tornou uma das mais importantes escritoras brasileiras contemporâneas. Sua obra é marcada por temas relacionados à identidade, discriminação racial e o papel da mulher negra na sociedade. Um de seus trabalhos mais significativos é o romance “Ponciá Vicêncio”, onde narra a trajetória de uma mulher negra em busca de sua ancestralidade e liberdade.
Além de seu trabalho como romancista, Conceição Evaristo é reconhecida como poeta, e suas poesias são carregadas de uma força lírica que retrata a resistência e o protagonismo de mulheres negras.
2 – Paulo Freire
Reconhecido internacionalmente por suas contribuições à educação, Paulo Freire também é autor de várias obras literárias. Seu livro mais famoso, “Pedagogia do Oprimido”, é leitura obrigatória para quem deseja entender as complexas relações entre educação, sociedade e opressão. Nesta obra, Freire defende uma educação crítica e libertadora, em que os alunos são coautores de seu processo de aprendizado.
3 – Cristovão Tezza
Cristovão Tezza é professor e escritor, conhecido por suas obras que exploram as complexidades da vida cotidiana e os dramas familiares. Sua obra mais aclamada pela crítica e pelo público, “O Filho Eterno”, narra a história do nascimento de uma criança com síndrome de Down coincidindo com o momento de ruptura na vida dos pais. Na obra, Cristovão Tezza expõe as dificuldades, inúmeras, e as saborosas pequenas vitórias de criar um filho especial, esmiuçando a saga por clínicas e consultórios médicos no início da década de 1980, época em que o assunto não era tão estudado e debatido na sociedade. O livro oferece uma reflexão sensível e poderosa sobre os desafios da vida.
4 – Nélida Piñon
Nélida Piñon, primeira mulher a presidir a Academia Brasileira de Letras, também tem um histórico acadêmico como professora. Em “A República dos Sonhos”, sua obra mais celebrada, Nélida mistura realidade e ficção ao retratar a trajetória de uma família de imigrantes galegos no Brasil, abordando questões como identidade, memória e exílio. A trama conta a história de Madruga, jovem camponês que deixa a Galícia com rumo ao Rio de Janeiro, embarcando com o amigo Venâncio. Com um emprego humilde numa pensão da Praça Mauá, a vida de Madruga passa por uma trajetória de sucessos e fracassos, que põem à prova seus ideais de liberdade e felicidade.
5 – Lélia Gonzalez
Além de professora e ativista, Lélia Gonzalez contribuiu para a consolidação do movimento negro brasileiro, como a fundação do Movimento Negro Unificado – MNU, em 1978. Ela também colaborou para a redemocratização e participou da política institucional no País. Foi uma das pioneiras na luta pelos direitos das mulheres negras no Brasil. Em sua obra “Festas populares no Brasil”, ela aborda a construção da identidade negra neste território e a importância da resistência cultural. Suas reflexões continuam a influenciar movimentos sociais e acadêmicos.
Dia do Poeta
Em homenagem ao Dia do Poeta, comemorado anualmente em 20 de outubro, próximo domingo, encerramos com o poema “Vozes-Mulheres” de Conceição Evaristo. Esta poesia reflete as vozes silenciadas das mulheres negras ao longo da história, trazendo à tona a força e a resiliência delas.
Vozes-Mulheres
A voz de minha bisavó
ecoou criança
nos porões do navio.
Ecoou lamentos
de uma infância perdida.
A voz de minha avó
ecoou obediência
aos brancos-donos de tudo.
A voz de minha mãe
ecoou baixinho, revolta
no fundo das cozinhas alheias,
debaixo das trouxas,
roupagens sujas dos brancos,
pelo caminho empoeirado
rumo à favela.
A minha voz
ainda ecoa versos perplexos
com rimas de sangue
e fome.
A voz de minha filha
recolhe todas as nossas vozes,
recolhe em si
as vozes mudas, caladas, engasgadas nas gargantas.
A voz de minha filha
recolhe em si
a fala e o ato.
O ontem — o hoje — o agora.
Que essas vozes ecoem e continuem a inspirar leitores e escritores!
Por Vitoria Carvalho, estagiária sob supervisão de Romênia Mariani