‘Quando chove, a lama volta’: Dez anos após Mariana, atingidos ainda esperam água potável e limpeza completa

Para coordenadora do MAM, impunidade permite que mineradoras mantenham práticas que colocam comunidades em risco

Dez anos após o rompimento da barragem de Fundão, da mineradora Samarco, controlada pela Vale e pela BHP, em Mariana (MG), atingidos ainda lutam pelo básico: reconhecimento, água potável e retirada da lama que percorre toda a bacia do Rio Doce. É o que afirma Marta de Freitas, da Coordenação Estadual do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), em entrevista ao Conexão BdF, da Rádio Brasil de Fato.

Freitas destaca que, desde o início, a reparação foi estruturada para afastar a responsabilização direta das empresas. “Foi feito um TAC [Termo de Ajustamento de Conduta] e algo que eu nunca tinha visto: a terceirização do crime. Criaram a Renova, uma fundação para representar as mineradoras, e a Renova passou a responsabilidade. Ao invés de cobrarmos da Vale e da BHP, todo mundo ficou nove anos xingando a Renova, que estava ali para não cumprir o mínimo”, denunciou.

Segundo ela, apesar do acordo de repactuação firmado no ano passado, demandas essenciais continuam sem solução. “O grande anseio da população em toda a bacia do Rio Doce são duas coisas que não estão acontecendo: acesso à água potável de qualidade e a retirada da lama ao longo do leito e das margens do Rio Doce. Quando chove, a lama volta. Por isso que eu falo que o crime continua acontecendo”, apontou.

A coordenadora do MAM lembra que muitos atingidos sequer foram reconhecidos oficialmente, incluindo quem atuou na remoção da lama nos primeiros anos após o desastre. “Eu faço questão de citar os trabalhadores da Samarco e os que trabalharam na remoção da lama, especialmente em Barra Longa e Gesteira. Muitos estão doentes e não foram reconhecidos como vítimas”, indicou.

Ela também recorda o caso de Samuel Albino, funcionário da Samarco que morreu aos 34 anos no rompimento e cujo corpo nunca foi encontrado. “Dez anos depois, ninguém fala dele. Como de tantos outros trabalhadores enterrados nas barragens rompidas, sem possibilidade de sua família ter um destino digno”, lamentou. O rompimento ocorrido em 2015 matou 19 pessoas e deixou centenas de feridos, além de impactar milhões.

Impunidade e risco de novas tragédias

A Justiça Federal absolveu a Samarco, a Vale, a BHP e outros denunciados há um ano, em novembro de 2024. O Ministério Público Federal (MPF) recorreu, mas o recurso segue sem julgamento. Para Freitas, o andamento lento dos processos contribui para que o modelo minerário siga provocando riscos.

“Fundão não foi a primeira barragem a romper no Brasil, e Brumadinho não foi a última. Hoje convivemos com a incerteza de que outras barragens poderão romper”, destacou.

Ela também criticou a atuação da Agência Nacional de Mineração (ANM), que flexibilizou regras de segurança mesmo após as tragédias. “A ANM não reviu a segurança das barragens diante das mudanças climáticas. E ainda coloca que algumas medidas só valem a partir de 2027. Até lá, quem paga a conta é a população”, afirmou.

Editado por: Nathallia Fonseca

Fonte
Brasil de Fato

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