Redução da Jornada: vitória do Sinpro-BA | Por José Geraldo de Santana Oliveira

Por José Geraldo de Santana Oliveira*

O Sindicato dos Professores da Bahia (Sinpro BA) acaba de obter duas significativas vitórias no Tribunal Superior do Trabalho (TST), no julgamento dos processos Ns. TST RR-101300-25.2009.5.05.0034, da Primeira Turma, e TST RR 81300-07.2009.5.05.0033, da Segunda.

Em ambos os processos, discute-se a possibilidade de redução da carga horária dos professores, com a consequente redução dos salários. Esta questão, há muito, vem afligindo a todos os professores, pois que, as escolas, de um modo geral e com frequência, teimam em fazê-la, quase sempre com o beneplácito da Justiça do Trabalho.

2. Desde que o TST baixou o Precedente Normativo N. 78, e, depois, a Orientação Jurisprudencial (OJ) 244, da SDBI-1, que consideram lícitas tais reduções, quando forem precedidas da diminuição do número de alunos matriculados, os (as) professores(as) não tiveram mais sossego e a mínima segurança jurídica, quanto à sua carga horária e à sua remuneração. A redução delas, como já se disse, tornou-se lugar comum.
2.1 Os citados PN e OJ assim dispõem:
2.1.1 PN 78:
“PROFESSOR- REDUÇÃO SALARIAL NÃO CONFIGURADA (NEGATIVO). Não configura redução salarial ilegal a diminuição de carga horária motivada por inevitável supressão de aulas eventuais ou de Turmas”.
2.1.2 OJ 244:
“PROFESSOR. REDUÇÃO DA CARGA HORÁRIA. POSSIBILIDADE (inserida em 20.06.20010. A redução da carga horária do professor, em virtude da diminuição do número de alunos, não constitui alteração contratual, uma vez que não implica redução do valor da hora aula).
2.2 Com base nesses dois instrumentos da jurisprudência do TST, a Justiça do Trabalho, notadamente de primeiro e segundo graus, como faz prova o Processo TST RR 81300-07.2009.5.05.0033, aqui, discutido, passou a entender que, na relação professor escola, somente o valor do salário aula é estável, isto é, não é passível de redução, sendo a fixação da carga horária semanal afeta apenas ao poder diretivo, ou seja, cabe ao dono da escola fixá-la, unilateralmente, sem qualquer formalidade e/ou consequência. Um absurdo jurídico legalizado.
2.3 Esse entendimento vesgo, da Justiça do Trabalho, faz tabula rasa de todos os cânones do Direito do Trabalho, começando pelos fundamentos e princípios, passando pelas normas e pela jurisprudência, que nada mais é do que a prudência do direito. Mas que, nos casos sob discussão, transformou-se em imprudência.
2.3.1 O mencionado entendimento despreza os fundamentos constitucionais dos valores e do primado do trabalho, respectivamente, insculpidos no Art. 1º, inciso IV, 170, o primeiro, e 193, o segundo, da Constituição da República (CR).
2.3.1.1 Assim sendo, porque a Justiça passou valorizar somente a livre iniciativa, em detrimento dos valores sociais e do primado do trabalho. Ou, o mesmo que dizer, ao capital, tudo é permitido. Ao trabalho, nada é assegurado.
2.3.2 Vale a pena trazer, aqui, a máxima da filosofia Humanitas, do personagem da obra de Machado de Assis, Quincas Borba, que reserva, ao vencido, compaixão ou ódio; e, ao vencedor, as batatas. Não é preciso dizer quem, para a Justiça do Trabalho, recebe as batatas e quem recebe compaixão ou ódio. Os seus julgamentos falam por si mesmos.
2.4 Do mesmo modo, nega eficácia ao princípio constitucional, insculpido, com letras indeléveis, no Art. 7º, inciso VI, da CR, que condiciona a redução salarial à sua previsão em convenção ou acordo coletivo de trabalho.
2.5 O entendimento da Justiça do Trabalho malfere, também, os princípios da norma mais favorável e da condição mais benéfica, haja vista fazer a inversão da ordem de sua aplicação: reservando-os ao patrão e não ao empregado.
2.6 Viola, igualmente, a função social do contrato, determinado pelo Art. 421, do Código Civil (CC), ao se preocupar apenas com o lucro do patrão, pouco importando se o contrato, nos moldes admitidos, trará algum benefício para o trabalhador e para a comunidade, ou se os seus frutos serão todos colhidos pelo dono do capital.
2.7 Afronta a literalidade do Art. 422, do CC, que exige das partes o respeito absoluto aos princípios da probidade e da boa, tanto na celebração, quanto na execução do contrato.
2.7.1 A Justiça do Trabalho, lamentavelmente, vem, em suas reiteradas decisões, repita-se, notadamente de primeiro e de segundo graus, liberando o dono de escola do respeito a esses princípios. Exigindo-o tão somente do professor. Uma posição teratológica.
2.8 Rasga os preceitos exarados no Art. 9º, Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que considera nulos todos os atos praticados com o objetivo de fraudar, impedir ou desvirtuar preceitos nela assegurados. Não restam dúvidas de que o dono de escola, ao reduzir unilateralmente a carga horária do professores, frauda direitos e garantias legais e constitucionais.
2.9 Nega validade ao Art. 468, da CLT, que não permite alteração do contrato de trabalho, se dela resultar prejuízos ao empregado, mesmo seja promovida com aparente consentimento deste. O que dizer, então, de alteração unilateral, como o são todas as reduções de carga horária e de salário.
2.9.1 O contrato de trabalho é, por sua natureza, bilateral, oneroso e sinalagmático, ou seja, com obrigações para as duas partes, inclusive as descritas no Art. 422, do CC.
2.9.1.1 Assim sendo, o estabelecimento da carga horária semanal, com a definição do número de aulas e dos dias em que serão ministradas, obrigatoriamente, tem de ser feito de forma bilateral, sob pena de nulidade do ato que o fizer.
2.10 Ainda, o entendimento da Justiça do Trabalho inverte a lógica e a ordem do disposto no Art. 2º, da CLT, que, de maneira solene, expressa e límpida, determina que os riscos do negócio são do empresário. No caso sob análise, a Justiça do Trabalho vem afirmando que esses são do professor e não do dono de escola. Uma aberração social e jurídica.
2.11 Por fim, acham-se vilipendiados os princípios da segurança e da confiança jurídicas. Nas escolas particulares, não há segurança alguma, pois, comumente, o professor dorme com uma carga horária de 20 aulas semanais e acorda com 8, como é o caso do Processo N. TST RR 81300-07.2009.5.05.0033. Assim sendo, porque o patrão quis e a Justiça do Trabalho carimba: aprovado.
2.12 Ante essas razões, as vitórias alcançadas pelos professores, representados pelo Sinpro BA, ora sob comentários, se não são alvissareiras- porque o TST continua aceitando como plausível a transferência do risco do negócio ao empregado, ao admitir que, em caso de comprovada diminuição de aluno, a redução salarial é legal, sinalizam a sedimentação de um novo entendimento, muito menos prejudicial aos professores, como vinha ocorrendo, até agora.
2.13 A Ementa do Acórdão, proferido no Processo TST RR 101300-23.2009.5.05.0034, abaixo transcrita, dá um novo alento aos professores e aos seus sindicatos, como se extrai de sua literalidade:
“RECURSO DE REVISTA. PROFESSOR. REDUÇÃO DO NÚMERO DE AULAS. ALTERAÇÃO CONTRATUAL LESIVA. SALARIAL. DIFERENÇAS SALARIAIS DEVIDAS.
1. Esta Corte Superior posiciona-se no sentido de que, estabelecida a carga horária semanal ou mensal, o o direito à sua fiel observância pelo empregador, salvo diminuição no número de alunos matriculados na instituição de ensino, reduzindo a receita, o que pode importar na alteração de turmas, com reflexos sobre a carga horária semanal ou mensal.
2. A possibilidade de se reduzir a carga horária do professor universitário, todavia sem o efetivo registro da diminuição do número de alunos, não deve ser invocada de modo isolado como motivo para validar a alteração da jornada; na forma, aliás, expressamente proclamada nos precedentes que originaram a Orientação Jurisprudencial nº 244 da SBDI-1. A causa da alteração –diminuição do número de alunos- há de ser demonstrada, não bastando a redução do número de aulas.
3. Logo, a redução do número de horas-aula implica alteração contratual lesiva, ante o disposto no art. 468, da Consolidação das Leis do Trabalho.
4. Consignada, no caso concreto, apenas a redução do número de aulas, porém, sem o registro do pressuposto da diminuição do número de alunos matriculados na instituição de ensino, consideram- se devidas as diferenças salariais correspondentes.
5. Violação, que se reconhece, no art. 468, da CLT”.
2.14 Em que pesem as decisões sob realce provirem de turmas, não servindo para caracterizar divergência jurisprudencial, capaz de ensejar e autorizar o conhecimento de recurso de revista, não se pode negar o alcance delas.
2.15 Frise-se que, do Acórdão prolatado no Processo do Sinpro BA, TST RR 101300-25.2009.5.05.0034, a própria Segunda Turma colacionou decisão da SBDI1, no mesmo sentido. Esta, sim, capaz de autorizar o conhecimento de recurso de revista, por divergência jurisprudencial.
2.15.1 “EMBARGOS EM RECURSO DE REVISTA. APLICAÇÃO DA SÚMULA 126 EQUIVOCADA. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 896 DA CLT. Para aferição de violação do art. 7º, VI, da Constituição Federal, acenada no recurso de revista da reclamante, em razão da diminuição do número de horas-aula por parte do empregador, desnecessário o pronunciamento da Corte Regional acerca da redução do número de alunos, já que aludido aspecto interessaria apenas à reclamada(OJ 244 da SDI1 do TST), que não cuidou de provocar manifestação a respeito via embargos declaratórios. Violação do artigo 896 da CLT caracterizada, por má-aplicação da Súmula 126 do TST. PROFESSOR. REDUÇÃO DO NÚMERO DE HORAS-AULA. IRREDUTIBILIDADE SALARIAL. VIOLAÇÃO. O acórdão regional, ao julgar a alteração do contrato de trabalho promovida pela empregadora, que acarretou a diminuição do número de horas-aula, com a consequente redução salarial, por causa outra que não a excepcionada na Orientação Jurisprude4ncial nº 244 da SDI-1 do TST ( diminuição do número de alunos), violou o artigo 7º, VI, da Constituição da República. Embargos conhecidos e providos. (E-ED-RR-744980/2001.0, SBDI-1, Rel. Min. Rosa Maria Weber, DJ de 19/12/2006).

Parabéns ao Sinpro BA, pela perseverança, pela vitória, que beneficia a todos professores de escolas particulares, em âmbito nacional, e pela estupenda Jornada Pedagógica, realizada aos 12 e 13 de setembro último, que reuniu centenas de professores, da qual tive o privilégio de participar com debatedor.

Goiânia, outubro de 2012.

* José Geraldo de Santana Oliveira é Assessor Jurídico da Contee, da Fitrae-BC, da Fitrae-MT/MS, do Sinpro Goiás, do Sintrae-MS e do Sintrae-MT.

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