Reforma trabalhista facilitou fraudes em contratos de empregos por cooperativas
Para secretário da CUT, cooperativas de fachada cresceram a partir da mudança na legislação trabalhista. Procurador do MPT alerta que nas cooperativas não deve existir qualquer tipo de relações de emprego
Escrito por: Luiz Carvalho | Editado por: Rosely Rocha
Além de não gerar os 6 milhões de empregos que prometia, conforme a CUT alertava desde o início, a reforma Trabalhista em vigor desde a aprovação da Lei 13.467, em 2017, também abriu as portas para a implementação de relações trabalhistas fraudulentas.
Dois casos na última semana escancaram o problema. No último dia 23 de julho, a Vara do Trabalho de Barreiras, na Bahia, apontou uma série de obrigações trabalhistas que a Fazenda Bom Amigo Doalnara, localizada no povoado de São Marcelo, região Oeste do estado, deveria passar a cumprir.
A partir da investigação sobre a morte por soterramento de cinco crianças entre seis e 11 anos, em abril de 2022, o Ministério Público do Trabalho (MPT) descobriu a existência de uma cooperativa fraudulenta criada pela empresa à qual quase todos os empregados eram ligados e que servia para encobrir relação de emprego.
A fazenda pertence ao grupo sul-coreano Doalnara, instalado na região desde 2004, e responsável pela gestão de uma agroindústria voltada ao mercado asiático.
Um dia depois, o MPT divulgou uma sentença que condenou a Camisaria Colombo (Q1 Comercial de Roupas S.A) a não utilizar mão de obra fornecida por cooperativas de trabalho e a formalizar a relação de emprego de todas as unidades da empresa, sob pena de multa mensal de R$ 5 mil por trabalhador encontrado em situação irregular. De acordo com a decisão, a cooperativa Coop Retail, tem de rescindir os contratos que possui.
Agulha no palheiro
Os casos são apenas alguns encontrados em um universo de difícil averiguação. Segundo dados do AnuárioCoop da Organização de Cooperativas do Brasil, lançado em julho de 2022, em 2021, havia 18,8 milhões de pessoas associadas a 4.880 cooperativas no país.
Porém, nem todas cumprem preceitos básicos para esse tipo de associação e o cenário piorou muito a partir da reforma trabalhista, afirma o Secretário de Relações de Trabalho da CUT, Ari Aloraldo do Nascimento.
“A reforma abriu um conjunto de possibilidades para empresários fraudarem mão de obra e aliada à lei 13.429/2017, da terceirização sem limites, promoveu uma imensa precarização, acentuando a banalização dos direitos e focando na individualização dos trabalhadores. Instalou-se, a partir da reforma, uma sensação de impunidade muito grande para quem não cumpre direitos”, explica.
O dirigente destaca que a livre organização da classe trabalhadora faz parte dos valores que a CUT defende, porém, dentro das regras e não como forma de precarizar relações de trabalho.
“As autênticas, que cumprem com o interesse coletivo, nós defendemos, mas aqueles que se cria para aumentar a exploração nós somos contra e denunciamos”, explica.
O setor de cooperativas é organização pela Lei 5.764/71, responsável por definir a Política Nacional de Cooperativismo. Em 2012, a Lei 12.690/2012 acrescentou definições ao setor e apontou o segmento como um modelo de produção composto por trabalhadores e trabalhadoras com o objetivo de obter melhores condições socioeconômicas e gerais de trabalho como qualificações, renda e gestão sobre a própria produção.A autogestão deve ser feita de forma coletiva e coordenada, possuir regras fixadas democraticamente em assembleia, que não podem ser confundidas com relações trabalhistas. Exatamente o contrário do que ocorre com as chamadas ‘coopergatos’, nome popular para empresas criadas de maneira ‘artificial’ para burlar a legislação.
O vice-coordenador Nacional da Coordenadoria Nacional de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho (Conafret), do MPT, o procurador do trabalho Renan Bernardi Kalil destaca que muitas empresas patrocinam a criação de cooperativa como forma de reduzir custos.
Em muitas ocasiões, os trabalhadores e trabalhadoras são demitidos e recontratados para realizar a mesma tarefa por salários menores e sem direitos, mas dessa vez por meio de associações. Ou são contratados diretamente por meio delas.
“O tomador de serviços não pode dar ordens, controlar o trabalho dos cooperados. Não deve existir qualquer elemento típico de relações de emprego. Além disso, a adesão dos cooperados deve ser livre e voluntária, não podem ser obrigados a criar uma cooperativa e a gestão deve se organizar sob princípios democráticos, cada pessoa tem direito a um voto”.
Ele lembra ainda que a Lei nº Lei 12.690 apresenta como um dos princípios a não precarização do trabalho e o impedimento de que seja usado para intermediação de mão de obra subordinada.
Para denunciar irregularidades trabalhistas, o MPT disponibiliza um canal de denúncias em que o nome e outras informações sigilosas são preservadas.