Reforma Trabalhista: que os bons ventos espanhóis soprem por aqui
O debate em torno da Reforma Trabalhista brasileira (2017) sofreu grande influência das mudanças praticadas na Espanha. As profundas alterações na legislação laboral, para pior, naquele país ibero europeu aconteceram em 2012. Sob o vendaval neoliberal que varreu o mundo após a crise do subprime (crédito de risco) de 2008.
Gilson Reis*
Quase uma década depois, essa legislação trabalhista foi revogada por vitoriosa concertação política de centro-esquerda (PSOE e Podemos) naquele país, porque não produziu os efeitos anunciados. Ao contrário.
A ampla flexibilização nas relações de trabalho na Espanha estimulou o trabalho temporário e de curta duração, facilitou demissões, deu prevalência aos acordos por empresa, inclusive para reduzir salários, fez o desemprego aumentar de 21 para 27%, motivado pela redução do custo de demissão dos trabalhadores com contratos por prazo indeterminado.
Depois caiu para 18% em decorrência do surgimento de empregos predominantemente precários, temporários, inseguros e de curta duração. A taxa de desocupação na Espanha é uma das maiores da Zona do Euro.
Lá, como aqui, a chamada Reforma Trabalhista não resultou em desfecho positivo. Por aqui, durante o debate do projeto de lei no Congresso Nacional, o discurso governista era de que após 2 anos da reforma seriam gerados 6 milhões de novos postos de trabalho.
Entre o discurso ou desejo e a realidade houve imenso abismo. Desde então, o desemprego só aumentou e os que surgiram foram trabalhos precários, com salários aviltantes.
Desemprego entre 2015 e 2021
Vamos aos números. A crise no mercado de trabalho em 2015 foi a pior já registrada. O número de pessoas desempregadas subiu 38% no ano e alcançou 10 milhões de brasileiros, segundo dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), divulgados pelo IBGE. Tratou-se do maior contingente de desempregados já registrado e da maior evolução da taxa de desocupados em um único ano desde o início da série história, em 2004.
Em 2016, a taxa de desocupação no País ficou em 11,9%, segundo dados revelados pela Pnad Contínua.
No ano em que a contrarreforma entrou em vigor, em 2017, a taxa de desemprego ficou em 12,7% e foi recorde da série histórica segundo a Pnad Contínua, iniciada pelo IBGE em 2012.
O percentual em 2018 foi 12,3%. Caiu levemente em 2019 para 11,9%.
Em 2020, a taxa média de desemprego no País atingiu 13,5%. Em 2021, a taxa de desemprego atingiu 12,6% no 3º trimestre, que significou leve queda de 1,6 ponto percentual na comparação com o segundo trimestre de 2021.
Como se vê, pelos percentuais, desde a implementação da contrarreforma, em nenhum ano houve queda significativa na taxa de desocupação no País.
Prevalência do negociado sobre o legislado
A coluna vertebral da contrarreforma (Lei 13.467/17) é o chamado “negociado sobre o legislado”. Esta foi e é a grande enganação em que chafurdou a “Reforma Trabalhista”. Isto porque, segundo o MPT (Ministério Público do Trabalho) esse mecanismo existia desde que a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) foi criada, em 1º de maio de 1943.
Ainda segundo o MPT, embora o mecanismo não estivesse explícito na CLT, as negociações coletivas ou por empresa, nunca eram abaixo do que estava previsto na legislação, no caso da CCT (Convenção Coletiva de Trabalho), e nos acordos por empresa, no caso dos ACT (acordos coletivos de trabalho), as negociações eram sempre acima das CCT.
Então, ainda segundo o MPT, se o legislador quis colocar na “letra fria da lei”, a “prevalência do negociado sobre o legislado” não era para ampliar direitos. Ao contrário.
Asfixia financeira
Outro dado que deixa claro esse aspecto do debate em torno da contrarreforma foi o enfraquecimento das estruturas sindicais — das centrais aos sindicatos —, por meio de asfixia financeira dessas estruturas.
Assim, as negociações foram desestruturadas. Diante disso, hoje os sindicatos negociam para manter o que os trabalhadores não perderam, não para ampliar direitos, o que deveria ser o objetivo central das negociações coletivas.
Diante destes fatos concretos, passados 4 anos da contrarreforma trabalhista chegou a hora de o movimento sindical debater e cobrar dos presidenciáveis e dos candidatos ao Congresso — deputados e senadores — a revogação da chamada Reforma Trabalhista pelo rotundo fracasso que representa.
Que os bons ventos que sopram da Espanha soprem também por aqui.
(*)Gilson Reis é Coordenador-geral da Contee (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino)