Saída de governadores tira efetividade do Conselho da Amazônia, diz especialista
Decreto vetou participação dos estados. “É um método geral do governo Bolsonaro, infelizmente”, lamenta Flávio Dino
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) decretou a exclusão dos governadores dos estados amazônicos do Conselho Nacional da Amazônia Legal. O decreto publicado nesta quarta-feira (12) no Diário Oficial da União também transfere o órgão colegiado do Ministério do Meio Ambiente (MMA) para a vice-presidência.
Criado em 1995 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), o conselho agora será composto por 14 ministros do governo e ficará sob a coordenação do vice-presidente Hamilton Mourão. Os ministérios da Saúde e Educação também foram retirados do órgão.
Entre as atividades do conselho estão a formulação e o acompanhamento de políticas públicas para a Amazônia Legal, que abrange os estados do Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins, e parte do Maranhão.
Ao anunciar a medida, em cerimônia nesta terça-feira (11) no Palácio do Planalto, Bolsonaro afirmou que a medida vai dar “a devida resposta” aos que criticam a proteção da floresta. Em janeiro, ele também prometeu instituir uma Força Ambiental Nacional.
A especialista em politicas públicas socioambientais com 25 anos de experiência, Adriana Ramos, discorda da análise do presidente. Coordenadora do Instituto Socioambiental (ISA), Ramos explica que não há nada o governo esteja dizendo que altera as preocupações existentes.
“Muito pelo contrário. Ontem, no anúncio a única menção a uma medida mais concreta foi a menção que o próprio presidente fez em relação a mineração em terras indígenas, que está longe de ser considerada uma medida de proteção e contribuição para o desenvolvimento sustentável”, aponta.
A especialista também lamenta a retirada da representação dos estados no Conselho e destaca que há um prejuízo na agilidade e efetividade do colegiado, uma vez que não dispõe de recursos próprios para executar as políticas públicas.
“O Conselho tem que trabalhar com os órgãos públicos que existem para fazer políticas funcionarem. Neste sentido a integração com os estados é fundamental, principalmente, se a agente pensa na agenda ambiental e na agenda de fiscalização e controle.”
O governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), considerou a exclusão dos governadores do Conselho um novo ato de fechamento de diálogo entre a União e os estados, contrariando a opção brasileira pelo modelo federativo.
“É um método geral do governo Bolsonaro, infelizmente. É um governo extremista, belicista, de afastamento de setores sociais, políticos e econômicos. Isso não é bom para a democracia brasileira.”
Por outro lado, Dino considera que há aspectos positivos na recriação do Conselho — “um importante mecanismo de soberania” –, mas cobrou a retomada do diálogo para outros temas reivindicados pelos estados amazônicos, como a volta do Fundo Amazônia.
“É preciso complementar com outras medidas e corrigir a composição do Conselho da Amazônia para torná-lo mais participativo e por isso mais eficiente. A presença dos governadores no Conselho da Amazônia iria qualificar sua atuação e traria melhores resultados para o país.”
Sem novidades
Só em 2019 o desmatamento da Amazônia cresceu 30%, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), e para a representante do ISA não há perspectiva de mudança.
“Todas as manifestações do presidente ontem confirmam a postura que o governo brasileiro demonstrou no ano passado que suscitou as preocupações internacionais sobre o futuro da Amazônia. Na postura do presidente não houve nenhuma mudança que esta comissão vai ter algum tipo de política diferente daquilo que ele vem reafirmando.”
O Fundo Amazônia, citado por Dino como importante mecanismo de financiamento de ações de proteção da floresta, está congelado desde o ano passado, desde que a Noruega, principal país financiador, exigiu mudanças de atitude do governo Bolsonaro em relação à preservação da Amazônia.
À época, o ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles atacou a atitude, chamando noruegueses de hipócritas por questionarem a permissividade do governo Brasil em relação à destruição da floresta enquanto, segundo Barros, permite a exploração de petróleo no Ártico e a caça de baleias.