Seminário da Andifes debate qualidade no ensino médio

O seminário Qualidade do Ensino Médio realizado pela Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) no último dia 10, em Brasília, fez uma análise detalhada sobre o tema no cenário educacional atual. Importantes palestrantes relataram suas experiências para uma plateia de 120 educadores, entre reitores, pró-reitores e convidados, que tiveram acesso a um diagnóstico preciso sobre a fase de aprendizado que apresenta deficiências.

Para o presidente da Andifes, reitor Carlos Maneschy, se fazia necessário que as Universidades Federais propusessem o debate, haja vista que a preocupação com a qualidade do ensino é uma política constante para Associação. “Nossos estudantes provêm do ensino médio e as universidades precisam contribuir para elevar qualitativamente o nível destes discentes. O seminário demonstra nossa preocupação e compromisso com educação, seja qual for o seu nível”, disse Carlos Maneschy.

A abertura do evento foi feita pelo ministro da educação, Aloizio Mercadante, que falou da necessidade de fazer uma repactuação da relação do ensino médio com as Universidades Federais. Mercadante explicou que são necessários investimentos na formação dos professores, com ofertas de mais vagas de docência nas universidades, assim como no investimento de qualificação dos profissionais diretamente envolvidos com o ensino médio.

O secretário de educação superior do Ministério da Educação (Sesu/MEC), Amaro Lins, também esteve presente no seminário e destacou a importância da Andifes como articuladora de projetos para o ensino médio. Amaro Lins afirmou também ser necessário fomentar a formação dos professores já que a demanda causou desequilíbrio nas escolas, o que tem afetado diretamente na qualidade do ensino.

MESAS

Panorama do Ensino Médio no Brasil foi o primeiro assunto debatido, e teve a participação do conselheiro Antônio Ibañez, do Conselho Nacional de Educação (CNE). Ibañez apresentou várias sugestões para melhoria no ensino médio, como o investimento na valorização e capacitação dos professores. Para ele, os docentes precisam estar habilitados a trabalhar a interdisciplinaridade e que todo conhecimento adquirido seja aplicado em sala de aula.

O conselheiro sugeriu que a intervenção no ensino médio noturno seria uma alternativa de melhoria nos dados deste estágio escolar. Ibañez focalizou que o ensino noturno é responsável por 18,8% da taxa de abandono e concentrava, em 2011, 33% dos matriculados. “A partir de 2014 o governo poderia oferecer bolsas de estudos para que esses estudantes noturnos passassem a estudar durante o dia. Outra alternativa é atrair esses alunos para a Educação de Jovens e Adultos (EJA) e não mais mantê-los no ensino noturno, que comprovadamente derruba as boas estatísticas”, explicou.

Na mesma mesa de debate, falou o secretário de educação básica do Ministério da Educação (MEC), César Callegari. Baseando-se em dados do Censo Escolar 2011, ele reconheceu que a situação “inspira” preocupação, mas que o MEC está preparando uma estratégia juntamente com os governos estaduais para atuar diretamente no ensino médio.

Em consonância ao proferido pelo conselheiro Antônio Ibañez, Callegari disse que o projeto é reduzir a zero o número jovens estudando à noite, e reforçou essa intenção do governo ao mostrar dados que apontam mudanças no número de matrículas no ensino médio noturno, passando de 66% no ano de 1995, para 32,5% em 2011. O secretário afirmou ainda que a taxa de reprovação é a outra estatística a ser modificada, mas ele afirmou que o problema é oriundo das falhas no ensino fundamental.

Sobre a docência, César Callegari avaliou que existe um déficit muito grande de professores com licenciatura adequada, principalmente na área de ciências exatas, mas que o governo está em processo de atualização dos dados para atuar junto à formação destes profissionais. O secretário encerrou sua participação ao apresentar o plano de Ação Articuladas para uma política de Ensino Médio, com dados específicos que podem ser conhecidos aqui.

O tema seguinte do seminário foi a Avaliação do Ensino Médio, e teve como um dos palestrantes o ex-presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), professor João Batista Gomes. Com uma crítica positiva ao Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), afirmou ser necessário aprofundar o conhecimento de alguns indicadores para se ter noção das reais mudanças a serem feitas.

Batista avaliou que precisa haver incentivo para progressão dos estudantes de escolas públicas, já que no ensino médio 50% dos alunos não conseguem concluir na idade correta, de acordo com dados do Inep e IBGE de 2011. Para o professor João Batista, o nível de aprendizado é muito baixo, chegando a 11%, em disciplinas como matemática. Por fim, ele afirmou que as condições de estudos oferecidas ainda não são as mais adequadas, assim com o déficit de formação específica dos professores está distante dos padrões apropriados.

Sobre o mesmo assunto falou o conselheiro do CNE, professor Chico Soares, que afirmou ser necessário repensar o atual projeto do ensino médio, não fazendo críticas ao que já existe, mas para a construção de uma nova forma de ensino.

Chico Soares foi enfático em dizer que o atual modelo de ensino médio é ineficiente, dando como exemplo o insucesso decorrente dos dezenove componentes curriculares obrigatórios que não permitem ao aluno desenvolver conhecimentos mais específicos sobre o que lhes interessa.

O conselheiro apresentou números, do SAEB, PISA e ENEM de 2009, os quais constatam que os alunos de ensino médio das escolas públicas não possuem um bom desenvolvimento de aprendizado. Segundo Chico Soares, esses dados refletem diretamente nas universidades por serem estes estudantes os potencias candidatos a uma vaga no ensino superior. “É neste sentido que entendo a importância das universidades e da Andifes no processo de mudanças para o ensino médio”, justificou o conselheiro.

A mesa foi encerrada com a apresentação do atual presidente do INEP, Luiz Cláudio Costa, que trouxe os mais novos dados relacionados ao ensino médio. Ele mostrou quais os gargalos que precisam ser superados para que a educação dos jovens alavanque as estatísticas educacionais.

Luiz Cláudio foi otimista ao revelar que, mesmo com um aumento no número de alunos reprovados no ensino médio, também cresceu a taxa de permanência desses estudantes nas escolas. “De fato, a reprovação sofreu uma variação negativa, mas é importante destacarmos que estes alunos estão ficando mais na escola. Este é um dado importante que não tem sido destacado”, disse o presidente.

No final de sua apresentação Luiz Cláudio colocou para os presentes os questionamentos que estão sendo feitos pelo MEC para mudanças no sistema de avaliação, como o ENEM, que poderão ser censitários e não mais por amostragem. Ele falou também da possibilidade de substituir o SAEB pelo próprio ENEM. O presidente do INEP não deu prazos para estas mudanças, mas afirmou que elas estão em estudo.

POLÍTICAS AFIRMATIVAS

A última rodada de discussão do período da manhã foi sobre o Perfil Socioeconômico e Acadêmico dos Ingressantes nas Universidades Federais. O professor Sérgio Franco, pró-reitor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), apresentou uma reflexão sobre os critérios de seleção das políticas afirmativas e sobre a permanência e suporte destes alunos nas universidades.

Para justificar os investimentos em ações de inclusões nas universidades, ele mostrou gráficos que apontam uma queda brusca na taxa de integralização dos estudantes de escolas públicas, negros e com renda familiar de até cinco salários mínimos na UFRGS. “Quando vemos que estes estudantes não estão tendo condições de acompanhar o curso, comprova-se que a democracia racial e social não existe”, disse Sérgio Franco.

Já a professora Vera Lúcia, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), trouxe uma série histórica dos dados dos inscritos no vestibular entre os anos de 1992 e 2013, analisando renda e raça. De acordo com os números, houve um aumento quantidade de aprovados no vestibular da UFMG a partir de 2008, quando foi implantado o sistema de bonificação para estudantes oriundos de escola pública e declarados negros; de 23% aprovados, passou para 45%.

Um índice similar de inclusão também foi verificado quando analisada a renda dos candidatos, que dobrou no ingresso na UFMG dos que ganhavam até cinco salários mínimos. Vera Lúcia ressaltou, no entanto, que a aprovação destes estudantes oriundos de políticas afirmativas ocorreu em cursos de menor concorrência, com exceção das engenharias que tiveram aprovação de alunos de escolas públicas federais.

Para finalizar a mesa de trabalho, a pró-reitora de graduação da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), Rosana Parente, mostrou o perfil do aluno e o desempenho acadêmico entre os anos de 2006 e 2011, nos 114 cursos oferecidos pela universidade. Rosana focalizou na preocupação com o plano de assistência estudantil e o índice de desistência dos alunos oriundos de escolas públicas.

A pró-reitora explicou que a UFAM aprova atualmente um número maior de estudantes de escolas públicas, mas estes são os que mais desistem. Segundo ela, eles justificam que não se identificam com o curso, fazem opção pelo Prouni e precisam trabalhar. “Nossa bolsa de permanência para estes alunos carentes é de R$ 300,00. É um valor irrisório”, afirmou.

Rosana Parente avaliou que mesmo ocorrendo aumento do repasse do PNAES, apresentação de planos de investimentos em restaurantes universitários e moradias, o problema da desistência não será sanado nas universidades. Ela explicou que a falta de conhecimento destes alunos requer atenção ao ensino médio público, e criação de tutorias especiais nas universidades.

Diretrizes Curriculares e Condições de Trabalho no Ensino Médio abriram as exposições da tarde. A professora Raquel de Souza, representante do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) falou sobre as dificuldades enfrentadas ao discutir novas diretrizes e apresentou aos participantes uma nova proposta de ensino que será implantada em Minas Gerais, intitulada “Reinventando o Ensino Médio”.

De acordo com Raquel de Souza, os três pontos principais deste novo modelo serão: a contribuição para a ressignificação da escola pública no ensino médio; a geração de competências em áreas de empregabilidade e a preparação para o prosseguimento dos estudos. As especificações de cada ponto do projeto podem ser conferidas aqui.

Dentro do mesmo tema, o assessor técnico, Eduardo Beurmann, da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), fez uma análise crítica ao afirmar que as novas diretrizes curriculares do ensino médio são propostas avançadas, mas que foram “construídas para alunos de século 21, professor do século passado e para condições de trabalho ultrapassadas”.

Para Beurmann, é necessária a construção de um sistema nacional de educação com capacidade de gestão e indução, e com regime de cooperação financeira. O representante da CNTE apresentou sua visão sistemática sobre o ensino médio, falando a respeito dos paradoxos educacionais como a formação e remuneração dos professores, financiamento e diretrizes.

MODELO

O professor Marcos Magalhães, do Instituto de Co-responsabilidade pela Educação, abriu a mesa sobre Experiências de Sucesso no Ensino Médio, e apresentou o modelo de escola de ensino médio concebido em Pernambuco, e que se transformou em um exemplo de política pública bem sucedida. Magalhães demonstrou através de pesquisas que o atual modelo de ensino para os jovens possui graves falhas que levam à distorção de idade e à evasão.

Em um das pesquisas apresentadas, os estudantes afirmaram que o modelo de ensino médio não funciona porque a escola é “chata” e não tem “conexão com a realidade”. Os próprios estudantes pontuaram na pesquisa que desejam uma escola dinâmica e atrativa, conceitos que levaram à elaboração do modelo defendido pelo Instituto de Co-responsabilidade pela Educação.

O professor Júlio Gregório Filho, membro do Conselho Técnico-científico de Educação Básica da Capes, trouxe a experiência de êxito na gestão da escola pública Setor Oeste, em Brasília. Ele confirmou que após a implantação do projeto, a taxa de perda (reprovação + evasão) caiu de 31,63% em 2004 para 12,37% em 2011.

Gregório apresentou todas as particularidades do projeto, que podem ser acessadas aqui, e falou das dificuldades enfrentadas para sua implantação. O professor afirmou que foi necessário um pacto com o corpo técnico e docente da escola para que o planejamento funcionasse, e criticou a falta de apoio do governo, tanto para gestão quanto para a estrutura de implantação de um novo projeto pedagógico.

Para fechar as explanações sobre o tema, o diretor da Faculdade Farias Brito, de Fortaleza, Tales Sá Cavalcante, revelou detalhes da estratégia de como a escola particular de ensino médio Farias Brito consegue atingir altos índices de aprovação dos estudantes nas principais instituições de ensino superior do Brasil, como o Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA) e o Instituto Militar de Engenharia (IME).

FINAL

As Experiências de Sucesso de Universidades Federais com Estados e Municípios foram relatadas na última mesa de debate com a participação da coordenadora de avaliação da COPERVES, da Universidade Federal da Santa Maria (UFSM), Thaís do Canto-Dorow, que apresentou o programa que tem como meta a integração do ensino médio com o ensino superior.

A professora Ângela Almeida, assessora de assuntos estudantis da Universidade Federal Rural de Pernambuco explicou como tem sido a experiência da UFRPE de assumir a gestão pedagógica administrativa de uma escola integral. Por fim a secretária de educação do Rio Grande do Norte, Betânia Ramalho falou a respeito da experiência com a população jovem trabalhadora, junto com a política de inclusão social da UFRN por meio do programa de acesso à rede púbica com alunos noturnos.

As convidadas integrantes da mesa Experiências de Sucesso de Universidades Federais com Estados e Municípios disponibilizaram todos os projetos de sucesso que foram apresentados no seminário aqui.

Ao final do evento promovido pela Andifes, o presidente da Associação, Carlos Maneschy, avaliou que foi possível fazer um diagnóstico do ensino médio no Brasil e incentivar ações que impulsionem os jovens de escolas públicas para o sucesso escolar. Maneschey destacou, que as análises apontam falhas no ensino médio decorrem também de problemas no ensino fundamental, e que este precisa ser revisto com a mesma preocupação dos anos finais.

Fonte: Andifes
*Texto: Iara Malta
*Fotos: Thiago Andrade/ Iara Malta/ João Neto (MEC)
*Revisão: Andréa Teixeira

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