Sinpro Campinas e Região: Governo de SP não investe em estudo à distância durante a pandemia e alunos do ensino médio têm pior desempenho da história
Os alunos do ensino médio tiveram o pior desempenho da história em 2021, de acordo com os resultados do Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (Saresp) divulgado nesta quarta-feira (2) pela Secretaria Estadual da Educação (Seduc-SP).
96,6% dos alunos da rede estadual terminaram a escola com desempenho abaixo do adequado em matemática. A nota média de proficiência em matemática desse ciclo foi de 264,2, número abaixo dos 269,2 de 2010, quando se iniciou a série histórica. Em relação a 2019, a variação foi de -4,48%, a maior queda da série.
Na prática, o aluno da 3ª série do ensino médio saiu da escola com proficiência de matemática adequada a de um estudante do 7º ano do ensino fundamental, uma defasagem de quase seis anos. A média de conhecimento na matéria foi de 264 pontos, uma queda de 13 pontos em relação ao resultado de 2019 (277).
Já em língua portuguesa, o aluno do 3º ano do ensino médio saiu da escola com proficiência adequada ao estudante do 8º ano do ensino fundamental. Quatro em cada 10 estudantes apresentaram conhecimentos “abaixo do básico”.
Nessa matéria, 76% foram avaliados com conhecimentos abaixo do adequado em 2021. Um crescimento de 8,6 pontos percentuais em relação a 2019, quando 67,4% dos alunos receberam a mesma avaliação. A média de proficiência na disciplina foi de 263, queda de 12 pontos em relação a 2019 (275), e também a pior da série histórica.
As provas foram aplicadas em dezembro de 2021 para mais de 642 mil alunos do 5º e 9º anos do ensino fundamental e 3ª série do ensino médio da rede estadual. Houve queda no aprendizado em todos os ciclos avaliados em comparação à última prova realizada em 2019 e na série histórica.
O próprio secretário da Educação de São Paulo, Rossieli Soares, admitiu que o ensino que “já era ruim, ficou pior”.
“Aquilo que já era ruim ficou pior. Estou usando uma frase que já foi muito publicizada para dizer que o ensino médio já estava no fundo do poço e a pandemia mostrou que podia piorar”.
O secretário falou que não tem previsão do tempo necessário para os alunos recuperarem a defasagem. “É difícil afirmar com clareza o tempo de recuperação da aprendizagem dos alunos que a gente perdeu. Se a gente olhar os fatores históricos, a gente retroagiu a 2012”, disse.
“Para voltar ao mesmo estágio de 2019, seriam 7 anos se a gente voltar a crescer no mesmo ritmo e velocidade. Mas é difícil aplicar porque ainda estamos num momento fora da curva apesar de estarmos com os alunos dentro da escola. Acreditamos que podemos ter uma recuperação mais rápida da base da pirâmide. Como os que mais perderam foram os do quinto ano, que são menos autônomos, a recuperação deles deve ser muito mais rápida. Acho que estado e municípios terão de fazer esforço grande para voltarmos ao patamar de 2019”, completou.
“A primeira solução que eu defendo de recuperação é voltar para a sala de aula e ficar em sala de aula com os alunos. Não pode ser o carnaval a prioridade do nosso país, tem de ser escola presencial, que é o principal lugar”, afirmou Soares.
Soares afirmou que outros fatores também podem ter atrapalhado a aprendizagem dos alunos.
“Difícil afirmar que não houve outros fatores, alguns são não ter escola presencial e preparação para a prova. Mas o principal é ter aula presencial, o que faz uma falta absurda. Só voltamos presencialmente em novembro.”
O secretário afirmou que não sabe se o fato de não ter vinculado bônus pago a professores ao desempenho dos alunos pode ter influenciado no resultado da avaliação.
“Há outros fatores, como por exemplo, o Saresp pela primeira vez não foi considerado para pagamento de bônus e as escolas sabiam disso. A gente não sabe se isso influenciou. As tendências foram semelhantes em todos os estados, mas ainda vamos estudar as exceções.”
Para o professor de políticas educacionais na Universidade Federal do ABC (UFABC) e integrante do grupo Rede Escola Pública e Universidade (Repu), Fernando Cássio, o governo não investiu no ensino à distância.
“É precisa ser lembrado que a Secretaria não viabilizou ensino remoto para os estudantes. É evidente que o quadro piorou, mas já era grave antes. Fica parecendo que a pandemia é vilã, mas os indicadores já eram bem ruins antes e agora estão piores. O que vemos é que havia uma subida lenta dos indicativos, mas agora houve uma queda”.
Fernando cita a demora de quase um ano para o governo disponibilizar os chips para os alunos terem acesso à internet e acompanharem as aulas via aplicativo. Além disso, um levantamento do Tribunal de Contas do Estado (TCE) concluiu que pelo menos metade dos estudantes não acessou o aplicativo para acompanhar as aulas do ensino à distância. O aplicativo, em alguns casos, não funcionou.
“É evidente que a pandemia tem sua parcela, mas é uma forma fácil da secretaria se eximir da responsabilidade. Eles falam do fechamento das escolas como se isso fosse um fenômeno fora do controle da secretaria. Eles criaram todas as condições de segurança nas escolas? Eles ofereceram todas as possibilidades para os alunos manterem o vínculo com as escolas através das plataformas criadas? Parece que fizeram todo o possível e infelizmente por causa do fechamento das escolas e da pandemia temos esse resultado. É preciso assumir as responsabilidades. Inclusive se o objetivo é mitigar os efeitos da pandemia, é preciso antes de tudo reconhecer os próprios erros.”
Soares afirmou que forneceu dados patrocinados aos alunos para acesso ao aplicativo, além de canal no YouTube e na televisão aberta para acompanhamento das aulas. Nesses canais, porém, secretário afirmpu não ser possível aferir a quantidade de acessos.
“Eles também podiam assistir às aulas gravadas dentro do nosso repositório, então alguns assistiam no aplicativo, outros na televisão, outros no Youtube e sabemos que outros não assistiam. As escolas optaram por usar outras plataformas, não foi proibido às escolas de usar outras soluções. É um mix. Não dá para saber o tamanho disso, mas o que sabemos é que o maior canal de educação no Brasil no YouTube é o do Estado.”
Recuperação
Dentre medidas para mitigar os danos de alunos que já encerraram a escola, o secretário Rossieli Soares afirma que existe a possibilidade de um “quarto ano”, mas que não faria “diferença”.
“O terceiro ano do ensino médio talvez seja a geração mais prejudicada de todas. Qual a chance dela de recuperar se estiver em outro processo educacional? Nós temos a possibilidade de fazer um quarto ano, mas não é algo que vá fazer diferença numa escala. Mas realmente essa geração é mais complicada. Tive uma conversa com universidades para eles prepararem a chegada desses estudantes. Por mais que eles tenham passado no vestibular, eles precisam fazer algum tipo de capacitação para chegar à universidade. É como se houvesse um degradê, os mais prejudicados são os que estão mais próximos da saída. Os demais a gente também tem mais tempo para a recuperação”, afirmou.
De acordo com Soares, um quarto ano do ensino médio, que serviria para ajudar a recuperar esses alunos, está sendo discutido e planejado. Ele afirmou que em janeiro foi feita uma recuperação intensiva para os estudantes do 3° ano. Eles não foram aprovados automaticamente. No estado de São Paulo não tem aprovação automática.
Abaixo do adequado
A Secretaria Estadual da Educação dividiu a classificação de conhecimento dos alunos nas disciplinas avaliadas em: avançado, adequado, básico e abaixo do básico. Os componentes avaliados foram língua portuguesa, matemática e área de ciências da natureza, além de redação e preenchimento de questionário socioemocional e econômico. Foram divulgados somente os resultados de língua portuguesa e de matemática. Em 2021, 68,9% do total de alunos do 3º ano fizeram a prova, contra 80,4% em 2019.
Fonte: G1