Sinpro/RS: Trabalho escravo quase triplicou nos últimos três anos no RS

Os números do trabalho escravo no país caíram até 2018, quando se registrou uma explosão de casos, cujo ápice foi em 2022. Só nos primeiros dois meses de 2023 o RS já bateu recorde de resgates no triênio Por César fraga

Na semana passada 207 trabalhadores foram resgatados de trabalho análogo à escravidão na colheita de uvas. Com essa operação, antes mesmo de fechar o segundo mês de 2023, o Rio Grande do Sul já bateu o número recorde de resgates de trabalho escravo no estado, com 208 resgatados em janeiro e fevereiro, conforme números atualizados para o Extra Classe pelo auditor fiscal do trabalho GrT-TEM, Henrique Mandagará, do Ministério Público do Trabalho (MPT/RS). Em 2022 foram 156 e em 2021, 76  resgatados.

No caso recente, de Bento Gonçalves, os trabalhadores, provenientes da Bahia, em sua maioria, foram aliciados por empresa terceirizada pelas vinícolas Garibaldi, Aurora, Salton e mais 23 produtores rurais, em Bento Gonçalves, na Serra Gaúcha, o que mobilizou a opinião pública sobre um tema, que infelizmente não é novo no Brasil.

As mais de duas centenas de trabalhadores entraram para a estatística do trabalho escravo no Brasil. Conforme dados do Ministério Público do Trabalho (MPT), só em 2022 pelo menos 2.575 trabalhadores (número recorde, até então) foram resgatados de condições análogas à escravidão em 432 operações realizadas em todo o Brasil. Em 2021 foram 1.937 resgatesEm 2020, foram 942  em 2019 foram 1.054 pessoas resgatadas.

Até 2018, os números vinham caindo, conforme apurado pela reportagem do Extra Classe, naquele ano. Em 2018, porém quase triplicou. Foram registradas 1.723 pessoas trabalhando em condições análogas às de escravo, das quais 1.113 foram resgatadas. Em 2017 foram 645 resgates. Conformes dados do Ministério do Trabalho – que chegou a ser extinto em 2018 – a exploração de mão de obra escrava vinha caindo desde 2007, de 6 mil trabalhadores resgatados naquele ano para cerca de 5 mil em 2008; 3,7 mil em 2009, oscilou acima de 2,5 mil de 2010 a 2013, depois caiu para 1,7 mil em 2014; 1,2 mil em 2015, e menos de mil casos até o ano passado.

Procuradores explicam os números do trabalho escravo

O Jornal Extra Classe encaminhou algumas perguntas aos/às procuradores/as Ana Lucia Stumpf González, coordenadora da unidade do MPT-RS em Caxias; Lucas Santos Fernandes, coordenador regional da Conaete (Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas) do MPT-RS; e Franciele D’Ambros, vice-coordenadora. Todos atuaram no caso de Bento Gonçalves.

Extra Classe – Na avaliação do MPT, a que se deve o crescimento de 2018 para cá nos números gerais do trabalho escravo no Brasil?
MPT/RS – São vários os elementos. Um pouco disso se deve aos índices de pobreza e a maior vulnerabilidade social resultado tanto da crise econômica quanto ainda dos efeitos da pandemia de covid-19. Também é claro que há um aumento do número de denúncias. A sociedade está mais consciente do tamanho do problema, o que permite que a fiscalização esteja presente.

EC – O que explica os números do Rio Grande do Sul?
MPT/RS – Com o maior grau de vulnerabilidade econômica provocado pela crise, aumentam os casos de trabalhadores desesperados dispostos a acreditar em falsas propostas de emprego. A dificuldade econômica faz com que muitos trabalhadores saiam de seus Estados acreditando em propostas enganosas de outros lugares em situação financeira aparentemente mais promissora, como o Rio Grande do Sul. Nas operações têm encontrado um perfil de muitos são trabalhadores migrantes, por vezes de outros Estados, muitas vezes do Nordeste, ou de imigrantes vindos de outros países.

EC – Quais são os principais gargalos hoje para o combate ao trabalho análogo à escravidão?
MPT/RS – Há mais de um gargalo. A escravidão contemporânea, diferentemente da escravidão clássica, é de identificação mais complexa e pendente de sutilezas. A infraestrutura também é outro desafio. As atuais equipes de fiscalização se desdobram para averiguar um número cada vez maior de denúncias. Há dificuldades também no atendimento às vítimas no pós-resgate. A estrutura para o acolhimento a resgatados também é reduzida. Os abrigos existentes costumam ter mais condições e experiência no atendimento a pessoas em condição de rua, e os resgatados têm outras necessidades mais específicas.

EC – No caso de Bento Gonçalves, até onde vai a responsabilidade das vinícolas e produtores rurais que contrataram a empresa que colocou os 207 trabalhadores em situação análoga à escravidão?
MPT/RS – Em um caso como esse, é possível, dependendo do que for apurado, pedir a responsabilidade solidária, analisando a cadeia produtiva como um todo. A apuração, contudo, ainda está em curso.

Do jornal Extra Classe, do Sinpro/RS

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