Sintep-AL: Empresa não pode interferir na contribuição sindical e assembleia é soberana para definir regras, diz coordenadora do MPT
A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que validou a cobrança de contribuição assistencial a sindicatos por todos os trabalhadores, inclusive os não sindicalizados, já está em vigor e tem amparado a inclusão do dispositivo em acordos de trabalho pelo país.PUBLICIDADE
A adoção da medida não pode ser alvo de interferência das empresas, e as assembleias de trabalhadores são soberanas para definir as regras da cobrança, conforme disse à CNN a procuradora Vivian Brito Mattos, coordenadora nacional de Promoção da Liberdade Sindical e do Diálogo Social do Ministério Público do Trabalho (MPT).
“A assembleia de trabalhadores vai definir a pauta de reivindicação, e é essa assembleia que vai definir a cobrança da contribuição”, afirmou Mattos, e continuou: “a contribuição é decorrente de negociação. Se não tiver acordo, não tem cobrança. A contribuição é resultado da vitória. Os direitos conquistados vão ser aplicados a todo mundo, mesmo filiado ou não filiado”.
A instituição da contribuição assistencial permite que seja fixado um valor a ser descontado do salário dos trabalhadores como forma de custear as negociações coletivas feitas pelos sindicatos.
É por meio dessas negociações que são estabelecidos reajustes salariais e demais direitos e benefícios, como auxílio-creche ou extensão do tempo de licença-maternidade.
Os resultados e eventuais conquistas dessas negociações se estendem a toda a categoria, independentemente de o trabalhador ser sindicalizado ou não.
O desconto só pode ser feito uma vez, mas seu valor pode ser parcelado ao longo dos meses. Tudo depende de como a assembleia de trabalhadores definir.
“A contribuição assistencial tem a finalidade de financiar a negociação, não é igual a contribuição do imposto sindical, ela se dá em razão da negociação. Toda negociação tem custo, deslocamento de dirigentes, então a contribuição tem essa finalidade”, afirmou Mattos.
A validade da contribuição foi decidida em setembro de 2023 pelo STF e dividiu advogados e especialistas da área. Parte classifica o instrumento como um “retrocesso” e potencialmente causadora de insegurança jurídica.
Outro grupo entende que a medida trará benefícios e “amadurecimento” às entidades sindicais, fortalecendo a ideia por trás da reforma trabalhista, que privilegiou os acordos negociados entre patrões e empregados sobre a lei.
Denúncias
Segundo a procuradora Vivian Mattos, o MPT tem recebido denúncias sobre tentativas de interferência indevida no assunto.
Ela afirmou que há casos de empresas que deixam de repassar os valores descontados aos sindicatos, sob o argumento de que a discussão sobre o tema no STF ainda não se encerrou. A decisão da Corte já foi alvo de recursos da Procuradoria-Geral da República (PGR) e de entidades patronais.
Outro tipo de interferência patronal, segundo a procuradora, é a pressão de empregadores para que seus funcionários exerçam o direito de se opor à cobrança, que é garantido pela decisão do Supremo.
Esse tipo de conduta, que pode se configurar um constrangimento ao trabalhador, é considerado pelo MPT um exemplo de prática antissindical. A coordenadora do MPT compara inclusive ao assédio eleitoral, em que patrões tentam influenciar como o empregado deve votar.
“Esperamos uma enxurrada de atos antissindicais, que já estão ocorrendo e temos recebido denúncias”, afirmou.
Dados do próprio MPT compilados pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) apontam que em 2022, do total de 32 mil acordos de trabalho, 65,5% tinham cláusula de contribuição assistencial.
Em 2016, um ano antes da reforma trabalhista, o volume era de 53,7%.
Como a decisão do STF que validou a contribuição assistencial de todos os trabalhadores é de 2023, a tendência é que haja aumento do número de sindicatos incluindo essa cláusula. Os dados para o ano ainda não foram totalmente fechados.
Para tentar uma delimitação mais precisa do tema e evitar abusos, a PGR recorreu da decisão do Supremo a pedido do MPT. A demanda é para que os ministros definam sobre três pontos:
- proibição de cobrar a contribuição de forma retroativa, referente a anos anteriores à decisão do STF;
- valor da contribuição não pode ser estabelecido em patamares “abusivos”;
- explicitação de que o patrão não pode interferir na escolha do trabalhador em pagar ou não a contribuição.
Ainda não há data para que o recurso seja julgado na Corte.
Funcionamento
A cobrança da contribuição só poderá ser feita se a negociação coletiva entre patrões e trabalhadores resultar em acordou ou convenção coletivos.
Eventuais abusos dos sindicatos, como a fixação de patamares muito altos para a contribuição ou falta de transparência, podem ser denunciados pelos próprios trabalhadores.
Essas denúncias, no entanto, devem ser analisadas sob o prisma da liberdade sindical, que garante a não intervenção de outros poderes nesses assuntos.
“A liberdade sindical é princípio constitucional e precisa ser respeitado. Ela implica na autonomia coletiva da vontade, dos próprios trabalhadores decidindo seu destino”, disse Mattos.
A decisão do STF garantiu ao trabalhador exercer o direito de oposição à cobrança. Ou seja, é preciso ser assegurada a possibilidade de se opor ao pagamento dessa contribuição, formalizando que não querem ter esse desconto no salário.
Para Vivian Mattos, é preciso critérios para que esse direito seja exercido de forma regular.
“Se eu disser que o direito à oposição seja exercido na empresa, isso é um ato antissindical. Porque estou permitindo uma ingerência de um terceiro na relação, no caso, a empresa. Você permite eventual coação do trabalhador”, declarou.
“Tem um caso recente de filas na porta do sindicato para o direito à oposição. Para isso acontecer, foi a empresa que colocou ônibus, pagou, abonou o dia, para que o sindicato não tenha a verba necessária para poder ter força de negociação”.
Autorregulação
Há um esforço das próprias entidades de trabalhadores em fixar balizas para evitar abusos. Ainda em setembro de 2023, as centrais sindicais elaboraram um termo de autorregulação com princípios a serem seguidos na instituição da taxa assistencial.
O documento pontua que as assembleias deverão ser convocadas com “garantia de ampla informação a respeito da pauta a ser tratada”, o que inclui a informação sobre a cobrança da contribuição negocial. Também sugere que deve se promover a “possibilidade de participação de sindicalizados e não sindicalizados”.
Outro item abordado é quanto ao valor do desconto, que segundo as centrais deve ser feito em patamares “razoáveis, com limites que não caracterizem formas indiretas de filiação obrigatória”.
Para Fausto Augusto Júnior, diretor-técnico do Dieese, eventuais acordos abusivos fechados por sindicatos são “pontos fora da curva” dentro do universo de acordos fechados, e que as centrais deverão organizar o seu próprio sistema de controle.
“A discussão hoje, tanto no STF como no Ministério do Trabalho, nada mais é do que regular algo que já existia. Dar tranquilidade, legitimidade jurídica, estabilidade jurídica, que é importante para o sindicato e para as empresas”, afirmou.
“Os parâmetros são importantes porque vão coibir os abusos que apareçam. Estamos no momento de reorganizar isso a partir da decisão do STF”.