Vai com um beijo, Zé Celso!

Por Silvio Queiroz*

Ah… vi um bocado de coisas do Oficina num tempo precioso, transição da adolescência pro início da vida adulta. ali, Zé Celso era uma referência pra gente, pelo papel corajoso no enfrentamento da ditadura.

corajoso, aqui, vale umas palavras mais. porque pode sugerir aquela coisa machista da força física, armada até. com ele, não: era uma subversão erótica. desde o histórico Rei da Vela e, depois, Roda Viva, que o infame CCC atacou.

tenho uma lembrança clara, direta e preciosa bem da época em que eu me atirava na militância política, eu secundarista. em 79, o pessoal do Oficina foi ao Equipe, onde eu fazia colegial, exibir o documentário “25”, sobre a independência de Moçambique.

terminado o filme, abriu-se o debate. alguém que assistia perguntou por que o Oficina se apresentava como te-ato. o ator que representava o grupo ali devolveu a questão: “o que você acha?”

nos meus nem 20 anos – lembrando Fábio Junior – esse nível de questionamento parecia um tanto “deslocado” da nossa agenda. o foco era derrubar a ditadura. adiante, na campanha das diretas já, um evento no Bixiga, território do Oficina. acho que era carnaval. a turma do te-ato irrompeu com um cordão, todo mundo agarrado. o refrão da marchinha pedia “ereções diretas”.

na época, me soou um tanto bobo e “desviado” da pauta. confesso: aborreceu. hoje, vejo um pouco diferente. não vou agora incensar pra “embelezar” epitáfio. até porque um personagem da estatura do Zé Celso não precisa disso – muito menos de alguém com a minha dimensão nesse debate.

ao contrário: aproveito eu a ocasião pra fazer meu reconhecimento. a gente, que na adolescência mergulhou de cabeça numa luta como quem pega o bonde andando, tinha e tem pra sempre como inspiração essa energia transgressiva, subversiva. pra sempre, vai ser preciso dizer e reafirmar que a liberdade não aceita nenhum tipo de canga.

e sempre que a gente pensar nisso… vai sentir o vento suave, mas cortante, do bater de asas desse anjo insubmisso que acaba de voar pro espaço diáfano que se insinua entre o cotidiano rude e cru e o fluido gentil e ilimitado dos sentimentos, dos instintos, das ideias.

vai com um beijo, Zé Celso

*Silvio Queiroz é colunista do Correio Braziliense e diretor do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal

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