Vitória de mobilização dos professores do Paraná amplia unidade da categoria
Curitiba – Vinte e nove dias separaram o início da paralisação dos professores do ensino público estadual do Paraná e a suspensão da greve, decidida em assembleia na manhã de ontem (9) em Curitiba. Quando a greve foi deflagrada, no início de fevereiro, os professores estaduais e outras categorias do funcionalismo público paranaense viam-se na iminência de perder uma série de direitos e ver confiscado seu fundo de previdência em meio a uma série de medidas adotada pelo governo do tucano Beto Richa, sob o pretexto de que era preciso cortar gastos e aumentar a arrecadação para fazer frente a uma crise financeira no Estado. Crise esta que era desconhecida do público até algumas semanas depois das eleições de outubro do ano passado, quando Richa foi reeleito em primeiro turno com mais de 55% dos votos e um discurso de que o Paraná “estava bem e agora ficaria melhor”.
Ao longo das últimas semanas, a APP Sindicato, entidade que representa os professores estaduais paranaenses, conseguiu: reverter a dispensa de milhares de professores temporários que não seriam recontratados este ano; garantir a posse de mais de mil pedagogos concursados que foram convocados e dias depois dispensados pelo governo no ano passado; forçar o governo a pagar as indenizações atrasadas aos professores temporários dispensados no fim de 2014; garantias de que serão depositados no fim de março os terços de férias, que deveriam ter sido pagos em novembro e dezembro do ano passado; e um cronograma de implementação e pagamento das promoções e progressões devidas pelo governo desde o início de 2014. Além disso, a APP Sindicato convenceu o governo a promover uma reorganização escolar que levará à reabertura de turmas e até mesmo de escolas que teriam sido fechadas se a mobilização não tivesse ocorrido.
E estas são apenas as principais vitórias obtidas pelos professores paranaenses nas últimas semanas. Diante de todos esses resultados, “o sentimento da categoria neste momento é de suspensão da greve e manutenção do estado de greve”, resumiu o professor Luiz Fernando Rodrigues, secretário de comunicação da APP Sindicato, em entrevista à Rede Brasil Atual.
“Os núcleos entendem que esta é uma greve vitoriosa, que chegamos a um patamar significativo e que podemos sair unificados, com muita disposição de luta, para qualquer eventual retorno (à greve)”, explicou a professora Marlei Fernandes, secretária de Finanças da APP.
As conquistas da greve, no entanto, não se limitaram ao ensino. Na primeira semana de paralisação, os professores ocuparam a Assembleia Legislativa do Paraná (Alep) e impediram a aprovação de um projeto de lei por meio do qual o fundo de previdência dos servidores públicos – com saldo estimado em R$ 8 bilhões – seria incorporado a um caixa único do governo, sem garantias de que o dinheiro seria usado exclusivamente para pagar aposentados e pensionistas. Diante da reação dos professores, o governo comprometeu-se a submeter a amplo debate qualquer alteração na previdência do Estado e assegurou que nenhum centavo seria usado para outro fim que não o pagamento de aposentados e pensionistas.
Também por causa da mobilização dos professores, a Alep extinguiu na semana passada a “comissão geral”, um artifício regimental por meio do qual o governo do Estado impunha o chamado “tratoraço”, tendo os projetos de seu interesse aprovados a toque de caixa sem debate com a sociedade. A comissão geral era usada normalmente para aprovar projetos de lei considerados impopulares.
“A comissão geral ainda existiria se os professores não tivessem se mobilizado. A sociedade paranaense deve o fim dessa aberração à greve dos professores”, afirmou à RBA o deputado Tadeu Veneri (PT), líder da oposição ao governo Richa na Alep.
A greve teve adesão superior a 99% e impediu o início do ano letivo nas escolas da rede estadual de ensino do Paraná, mas a indignação da população em geral diante da postura do governo e os argumentos apresentados pelos professores fizeram com que pais, alunos e a sociedade paranaense se unissem em torno da causa dos educadores. Na semana passada, um instituto local de pesquisas apurou 90% de apoio à greve entre adultos paranaenses cientes da paralisação. Até mesmo o desembargador Luiz Mateus de Lima, apesar de ter ordenado o início imediato do ano letivo em liminar buscada pelo governo, recusou-se a declarar a greve ilegal ou abusiva.
“Nós estamos unidos nessa luta e não vamos permitir nenhum direito a menos”, declarou a professora de educação física Márcia Aparecida de Oliveira, que viajou de Guarapuava para Curitiba para votar na assembleia desta segunda-feira.
“O apoio dos pais e dos alunos, assim como toda essa união entre os professores, foi possível principalmente graças à velocidade com que a informação é transmitida hoje. Em greves passadas às vezes levava dias até a informação chegar a cidades distantes. Hoje todo mundo fica sabendo quase na mesma hora, seja por celular ou pela internet”, prosseguiu ela.
No decorrer da assembleia de hoje, os dirigentes da APP fizeram questão de frisar que a suspensão não significa o fim da greve. “Continuamos em estado de greve e podemos voltar a qualquer momento, caso assim decida a categoria”, salientou Marlei Fernandes. “Nós confiamos na nossa luta. A desconfiança da categoria em relação ao governo permanece a mesma de antes”, concluiu.
“Estamos prontos para fazer o trabalho que a gente sempre quis fazer”, reforçou o professor Hermes Leão, presidente da APP Sindicato. “Nós só ficamos em greve porque o governador Beto Richa provocou a greve”, afirmou ele.
“Essa greve é uma resposta dos professores à arrogância do governo, que achou que podia fazer o que bem entendesse só porque tinha ganhado a eleição”, analisou por sua vez o deputado Veneri.
E esse sentimento não está restrito aos professores, nem à oposição. Reeleito há menos de seis meses com 55% dos votos e em primeiro turno, Beto Richa experimenta a avaliação negativa de sua administração, que atingiu 76% na semana passada.