18 anos da Lei Maria da Penha: avanços, desafios e a conscientização sobre a violência de gênero
A Lei Maria da Penha, na última quarta, completou 18 anos (Lei nº 11.340/2006), marcando quase duas décadas de esforços contínuos para combater a violência doméstica no Brasil. A norma foi sancionada, pelo então Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O nome homenageia a biofarmacêutica cearense Maria da Penha Maia Fernandes que sofreu duas tentativas de homicídio pelo marido, em 1983, e acabou ficando paraplégica. Ela se tornou uma grande ativista do direito das mulheres.
O arcabouço jurídico prevê a adoção de medidas protetivas de urgência para romper o ciclo de violência contra a mulher e impedir que o malfeitor cometa novas maneiras de violência doméstica, seja ela física, moral, psicológica, sexual ou patrimonial. Além disso, a lei serve como base para o desenvolvimento de políticas públicas voltadas à prevenção da violência, promoção dos direitos das mulheres e o despertar da consciência.
Ao longo desses anos, a Lei Maria da Penha promoveu a educação sobre esses direitos, destacando a importância do respeito mútuo nas relações interpessoais; incentivou a inclusão de temas relacionados à violência doméstica e à igualdade de gênero nos currículos escolares e gerou várias campanhas de conscientização, informando a população sobre os aspectos dessa pauta e as formas de buscar socorro.
Houve também um aumento expressivo na criação de serviços e instituições dedicados ao atendimento de vítimas de violência, como centros de acolhimento, juizados e linhas de apoio. No entanto, mesmo com as inegáveis conquistas, o sistema ainda enfrenta desafios substanciais. Por exemplo, em muitas regiões, especialmente nas áreas rurais e nas periferias urbanas, a infraestrutura necessária para a proteção efetiva das mulheres continua inadequada. O acesso a serviços de emergência e apoio é quase inexistente, e muitas vítimas enfrentam barreiras para denunciar a violência. Ver-se a implementação desigual da lei ao longo do território nacional.
Os números dos casos de violência também seguem alarmantes. Dados do Conselho Nacional de Justiça sobre a atuação do poder judiciário na aplicação da Lei Maria da Penha apontam que 640.867 mil processos de violência doméstica e familiar e/ou feminicídio ingressaram nos tribunais brasileiros em 2022.
Lamentavelmente, o quadro só agravou em 2023. Os dados do último Anuário Brasileiro de Segurança Pública revelam que todos os registros de crimes com vítimas mulheres cresceram em 2023 na comparação com 2022. Homicídio e feminicídio (tentados e consumados), agressões em contexto de violência doméstica, ameaças, perseguição (stalking), violência psicológica e estupro inclusive.
No ano passado, 258.941 mulheres passaram por episódios de agressão, o que sinaliza alta de 9,8% em relação a 2022. Já o número de mulheres que sofreram ameaça subiu 16,5% (para 778.921 casos), e os registros de violência psicológica elevaram 33,8%, totalizando 38.507.
Os dados do anuário são dos boletins de ocorrência policiais, compilados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). Outro levantamento do fórum aponta que ao menos 10.655 mulheres foram vítimas de feminicídio no Brasil de 2015 a 2023.
De acordo com o relatório, o número de feminicídios cresceu 1,4% em 2023 tendo em vista os dados do ano anterior, alcançando a marca de 1.463 vítimas no ano passado. Homens assassinaram mais de quatro mulheres por dia.
Diante do exposto, para que a Lei Maria da Penha seja de fato um instrumento efetivo de proteção e justiça em âmbito nacional, é essencial ampliar e uniformizar os serviços de apoio e proteção em todo o país, bem como aprimorar a letra da lei. Atualmente, está tramitando na Câmara dos Deputados cerca de 324 projetos de lei com a finalidade de fazer novas mudanças na norma. Destes, 89 foram apresentados nesta legislatura por 61 parlamentares.
Os Programas de capacitação contínua para profissionais do sistema de justiça e segurança também devem ser priorizados.
Por fim, é imprescindível que as políticas públicas evoluam para incluir estratégias que combatam a violência de forma preventiva, intensificando as ações educativas sobre a igualdade de gênero desde a infância e fortalecendo a rede de apoio comunitário.
As instituições precisam somar forças, trabalhar de forma mais colaborativa para que o sistema integrado funcione e seja capaz de assegurar a proteção efetiva às vítimas e a responsabilização dos agressores.
Os 18 anos da Lei Maria da Penha, sem sombra de dúvidas, representam um marco na luta contra a violência doméstica, mas também dá sinais de que há um longo caminho a percorrer. As autoridades competentes e sociedade como um todo devem se unir para superar os gargalos e sanar as lacunas. Somente com um compromisso contínuo e abrangente será possível assegurar que a proteção prometida pela Lei Maria da Penha se concretize na vida de todas as mulheres brasileiras.
Por Romênia Mariani