Fepesp: ‘Inteligência Artificial’: avanço de software alerta sobre trapaça de estudantes em trabalhos acadêmicos
Programa pode elaborar argumentos e escrever textos convincentes, causando preocupação sobre trapaças em trabalhos escritos
As universidades estão sendo instadas a se protegerem contra o uso de inteligência artificial (IA) em redações, após o surgimento de um sofisticado programa de chatbot que pode imitar o trabalho acadêmico. Isso provocou um debate sobre as melhores maneiras de se avaliar os alunos no futuro.
O programa ChatGPT, criado pela empresa OpenAI, apoiada pela Microsoft, pode elaborar argumentos e escrever textos convincentes, causando uma preocupação generalizada de que os estudantes usem o software para trapacear em trabalhos escritos.
Acadêmicos, consultores de ensino superior e cientistas cognitivos em todo o mundo sugeriram que as universidades desenvolvam novos modos de avaliação para reagir à ameaça representada pela IA à integridade acadêmica.
A ampla acessibilidade dessa ferramenta, que é gratuita para o público, tem gerado dúvidas sobre se ela torna as redações redundantes ou exige outros recursos para corrigir o conteúdo.
O Turnitin é um software usado por cerca de 16 mil sistemas escolares em todo o mundo para detectar trabalhos plagiados e pode identificar alguns tipos de escrita assistida por IA. A empresa sediada nos Estados Unidos está desenvolvendo uma ferramenta para orientar os educadores a avaliarem trabalhos com “vestígios” de IA, disse Annie Chechitelli, diretora de produtos da Turnitin.
Chechitelli também alertou contra uma “corrida armamentista” na detecção de trapaceiros e disse que os educadores devem incentivar habilidades humanas, como pensamento crítico e edição de textos.
A dependência excessiva de ferramentas on-line pode afetar o desenvolvimento ou a criatividade. Um estudo em 2020 da Universidade Rutgers sugeriu que os alunos que usam o Google para responder a seus deveres de casa obtêm notas mais baixas nos exames.
“Os alunos não obterão A automaticamente ao apresentar conteúdo gerado por IA; é mais um ‘burro de carga’ do que um Einstein”, disse Kay Firth-Butterfield, chefe de inteligência artificial do Fórum Econômico Mundial em Davos, acrescentando que a tecnologia vai melhorar rapidamente.
Os acadêmicos alertaram que a educação tem demorado a responder a essas ferramentas. “O sistema educacional em geral está apenas acordando para isso, [mas é] o mesmo tipo de problema que os telefones celulares na escola. A resposta foi ignorá-lo, rejeitá-lo, bani-lo e depois tentar acomodá-lo”, disse Mike Sharples, professor emérito da Open University e autor de “Story Machines: How Computers Have Become Creative Writers” [Máquinas de histórias: como os computadores se tornaram escritores criativos].
Mudar para avaliações mais interativas ou trabalho reflexivo pode ser caro e desafiador para um setor já sem dinheiro, disse Charles Knight, consultor de ensino superior.
“A razão pela qual o ensaio escrito é tão bem-sucedido é em parte econômica”, acrescentou. “Se você fizer [outras] avaliações, o custo e o tempo necessário aumentam.”
A Universities UK, que representa o setor no Reino Unido, disse que está acompanhando de perto, mas não trabalhando ativamente na questão, enquanto o órgão regulador independente australiano do ensino superior, TEQSA, disse que as instituições precisam definir suas regras com clareza e comunicá-las aos alunos.
“O aprendizado é um processo, não se trata do resultado final em muitos casos, e um ensaio não é útil em muitos empregos”, disse Rebecca Mace, filósofa digital e pesquisadora educacional do Instituto de Educação da University College London (UCL).
*publicado originalmente em 20/12/22 no jornal Folha de S. Paulo, aqui: https://bit.ly/3BQI1F4