Além de vetar livros, governo Tarcísio quer espionar professores em sala de aula
Portaria estabelece “apoio presencial” por parte da gestão escolar duas vezes por semana. E esse monitoramento das aulas terá de ser relatado em formulário específico
São Paulo – O governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos), que quer vetar livros didáticos impressos, divulgou outra ação no mínimo polêmica para a educação paulista: o “apoio presencial em sala de aula” por gestores das escolas. Uma portaria da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo que estabelece essa espécie de monitoramento determina ainda a produção de relatórios (Confira modelo do formulário no final da reportagem).
Pelas novas regras, a cada bimestre esses relatórios deverão ser encaminhados à Diretoria de Ensino. Ou seja, conforme o texto, “a rotina de observação de aulas deve cobrir o maior número de professores possível ao longo do bimestre letivo”. Para a Secretaria de Educação, a medida “atua para fortalecer o protagonismo e a autonomia do educador em sala de aula”. E “visa garantir suporte com maior interação e apoio por meio das equipes de coordenação e direção”.
A medida tem sido criticada pelos professores. Para o sindicato dos professores da rede estadual (Apeoesp), a prática fere o princípio da liberdade de cátedra. “É totalmente inaceitável a portaria impondo a presença de diretores e coordenadores nas salas de aula para fiscalizar as atividades dos professores com os estudantes”, afirma o sindicato.
LDB estabelece “liberdade de cátedra” aos professores
A liberdade de cátedra, como destaca o sindicato em nota, é um princípio constitucional, previsto também na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. “Dentro da sala de aula o(a) professor(a) é autoridade (…) estando totalmente capacitado para a função. Não tem cabimento que professores e professoras sejam assediados e que tenham seu trabalho tolhido desta forma”.
Professor da Universidade Federal do ABC (UFABC) e integrante da Rede Escola Pública e Universidade (Repu), Fernando Cássio afirmou ao Brasil de Fato que a reação do sindicato se justifica também frente a um contexto de extrema precarização do trabalho.
“Já temos políticas de avaliação que são punitivas na rede estadual de São Paulo, isso não é de agora. Então, é compreensível que exista essa reação. Muito embora pudéssemos pensar que isso poderia ter um efeito pedagógico positivo, o ambiente de trabalho e as condições de trabalho são tão degradadas que a última coisa que deveríamos fazer neste momento seria estabelecer um instrumento como esse”, disse.
Vigilância instalada
O especialista alertou que a medida chega à rede de educação em um cenário já permeado pela desconfiança. “Quando temos reclamações de que esse tipo de coisa pode soar como vigilância, mais uma camada de controle, que pode gerar, por exemplo, censura e perseguição, é porque não temos um clima de confiança instalado”.
Segundo ele, o contexto das condições de trabalho é negativo em todos os sentidos, “tanto do ponto de vista objetivo – do salário, das carreiras, do controle de trabalho, dos recursos de infraestrutura – quanto subjetivo, dessa própria sensação de que você está sendo vigiado por alguém de fora, que vai controlar o seu trabalho, que vai transformar isso em punição”.
Redação: Cida de Oliveira, com Brasil de Fato