O obscurantismo se aloja no Ministério da Educação
A confirmação do nome do colombiano Ricardo Vélez Rodrígues como ministro de Educação do governo Jair Bolsonaro é o epítome da interferência do conservadorismo fundamentalista nas políticas educacionais e um prenúncio das dificuldades que vêm pela frente. Mozart Neves Ramos, diretor do Instituto Ayrton Senna, cujo nome havia sido ventilado antes, foi barrado pela bancada evangélica por ser “progressista demais”. Em seu lugar, entra um filósofo e professor universitário, aposentado da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), que, num paradoxo, dá a impressão de considerar o ensino de filosofia como doutrinação e a universidade pública brasileira como celeiro marxista — para usar um clichê do qual eles gostam bem.
A nomeação representa o alojamento do obscurantismo no Ministério da Educação. E, como o obscurantismo não é democrático, não aceita o diálogo, pode-se afirmar que a educação no Brasil não será mais educação; será perseguição, repressão. Em resumo, trata-se de um profundo retrocesso, uma grande tristeza para aqueles que são educadores de fato e uma enorme vergonha internacional.
“Gostaria de comunicar a todos a indicação de Ricardo Velez Rodriguez, Filósofo autor de mais de 30 obras, atualmente Professor Emérito da Escola de Comando e estado Maior do Exército, para o cargo de Ministro da Educação”: foi assim que Bolsonaro anunciou a escolha ontem (22), via Twitter. De outra rede social, o Facebook, saiu a postagem do nomeado usada pela mídia para ilustrar e explicar a indicação: “o que é necessário na educação, senhor Cortella? Em primeiro lugar que se limpe todo o entulho marxista que tomou conta das propostas educacionais de não poucos funcionários alojados no Ministério da Educação. Isso para início de conversa.”
Não é a única pérola. Em seu perfil na rede, Vélez Rodríguez também já escreveu que a “iniciativa da educação de gênero é uma grande estupidez da esquerda petralha, que pretende substituir o Pátrio Poder pela doutrinação gramsciana, para acabar com a família tradicional e os valores cristãos”. É pouco provável que os defensores do movimento Escola Sem Partido — que de apartidário, como já repetido inúmeras vezes pela Contee, não tem nada — e os celerados em marcha contra uma suposta “ideologia de gênero” tenham lido os tais 30 livros publicados pelo futuro novo ministro; suas palavras ao vento da Internet lhes bastam.
Com o projeto do Escola Sem Partido em pauta no Congresso Nacional e às vésperas do julgamento, no Supremo Tribunal Federal (STF), da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) movida pela Contee contra a Lei da Mordaça de Alagoas — um processo no qual a Confederação já conquistou uma importante vitória com a liminar que suspendeu a norma, por meio do relatório do ministro Roberto Barroso —, a indicação de Vélez Rodríguez é mais uma afronta ao magistério (cada vez mais atacado e perseguido, algo que se acentuou após as eleições) e aos defensores de uma educação democrática. Ao mesmo tempo, ela demonstra a necessidade e a urgência desta luta em defesa de princípios que estão garantidos na Constituição: a livre manifestação do pensamento e a livre expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença, bem como a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber, assim como o pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas.
Por Táscia Souza