Justiça do Trabalho pode deferir valor superior ao indicado em petição inicial de ação trabalhista
Decisão do ministro Maurício Godinho Delgado, do TST, pôs pá de cal em exigência de que indicação fosse precisa, e não estimativa, o que dificultava acesso à Justiça do Trabalho
Por José Geraldo de Santana Oliveira*
Não obstante o crescente e estampado distanciamento da Justiça do Trabalho de sua função protetiva dos direitos fundamentais sociais, em curso desde a de/reforma trabalhista de 2017 — Lei N. 13.467 —, quando se encetou a célere marcha à ré rumo à proteção do capital e consequente desproteção dos/as trabalhadores/as, vez por outra colhem-se das decisões do TST (Tribunal Superior do Trabalho) lampejos que, se não sinalizam volta ao leito normal anterior à de/reforma, ao menos repõem o direito por elas discutidos à sua função social.
Essa assertiva pode ser comprovada por recente decisão da 3ª Turma do TST no julgamento agravo de instrumento em recurso de revista (AIRR), com acórdão publicado ao dia 1º de julho corrente, que, acolhendo do voto do sempre vigilante ministro Maurício Godinho Delgado, pôs mais uma pá de cal na proposital exigência inserta no Art. 840 da CLT — com a redação dada pela Lei N. 13.467/2017 —, de indicação de valor de cada pedido contido em qualquer reclamação trabalhista já na petição inicial.
Claro que esse acréscimo legal, como muitos outros, teve como indisfarçável propósito dificultar o acesso à Justiça do Trabalho, trazendo para o processo trabalhista institutos do direito civil comum, que não guardam sintonia alguma com a função social nem com os princípios e garantias que regem o direito do trabalho.
A decisão sob destaque, bem assim aquelas às quais ela faz referência, merecem especial atenção dos/as advogados/as que atuam na Justiça do Trabalho, em defesa dos/as trabalhadores/as e seus direitos, pois que a referida exigência legal tem se constituído em nada desprezível entrave ao andamento e julgamento de mérito das reclamações trabalhistas, sejam individuais, plúrimas ou coletivas.
A não indicação de valor de cada pedido, que não se confunde com cálculo preciso, com frequência dá azo a decisões impertinentes e, via de regra, prejudiciais aos/às reclamantes trabalhistas, ensejando, sempre, determinação para emenda da inicial, com vistas a sua indicação ou arquivamento da reclamação, sem julgamento do mérito, por falta desse requisito legal.
Não raras vezes, quando se apura em sentença valor superior ao indicado na inicial, muitos juízes limitam o crédito ao montante indicado, em claro desvio de finalidade da intervenção judicial trabalhista, posto que beneficiam a empresa descumpridora de seu dever social maior, em flagrante prejuízo do/a trabalhador/a prejudicado por essa conduta inidônea e antissocial.
A decisão sob comentários repõe ao devido lugar a injustificada exigência legal de indicação de valores, assentando, de maneira cristalina, que o valor indicado é tão somente estimativo, jamais definitivo, não podendo por isso ser limitador do quantum devido em cada pedido julgado procedente, especialmente quando na reclamação consta essa ressalva, ou seja, que os valores indicados são apenas estimativos, como o foi no caso concreto recém-julgado.
Eis a decisão que enseja essas reflexões, bem como as que a fundamentaram:
“PROCESSO Nº TST-AIRR-228-34.2018.5.09.0562
A C Ó R D Ã O (3ª Turma)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014 E DA LEI 13.467/2017. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES INDICADOS NA PETIÇÃO INICIAL. ART. 840, § 1º DA CLT. A presente controvérsia diz respeito à limitação da condenação nas hipóteses em que a parte autora atribui valores às parcelas pleiteadas judicialmente. No Processo do Trabalho, é apta a petição inicial que contém os requisitos do art. 840 da CLT, não se aplicando neste ramo especializado o rigor da lei processual civil (art. 319 do CPC/15), pois é a própria CLT quem disciplina a matéria, norteando-se pela simplicidade. Nessa linha, antes da vigência da Lei 13.467/2017, o pedido exordial deveria conter apenas a designação do juiz a quem fosse dirigida, a qualificação do reclamante e do reclamado, uma breve exposição dos fatos de que resultasse o dissídio, o pedido, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante. Com a nova redação do art. 840 da CLT, implementada pela Lei 13.467/2017, a petição inicial, no procedimento comum, passou a conter os seguintes requisitos: designação do juízo; qualificação das partes; breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio; o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor; data; e assinatura do reclamante ou de seu representante. Contudo, com suporte nos princípios da finalidade social e da efetividade social do processo, assim como nos princípios da simplicidade e da informalidade, a leitura do § 1º do art. 840 da CLT deve se realizar para além dos aspectos gramatical e lógico-formal, buscando por uma interpretação sistemática e teleológica o verdadeiro sentido, finalidade e alcance do preceito normativo em comento, sob pena de, ao se entender pela exigência de um rigorismo aritmético na fixação dos valores dos pedidos (e, por consequência, do valor da causa), afrontarem-se os princípios da reparação integral do dano, da irrenunciabilidade dos direitos e, por fim, do acesso à Justiça. Isso porque as particularidades inerentes ao objeto de certos pedidos constantes na ação trabalhista exigem, para a apuração do real valor do crédito vindicado pelo obreiro, a verificação de documentos que se encontram na posse do empregador – além de produção de outras provas, inclusive pericial e testemunhal -, bem como a realização de cálculos complexos. A esse respeito, vale dizer que o contrato de trabalho acarreta diversificadas obrigações, o que conduz a pedidos também múltiplos e com causas de pedir distintas, de difícil ou impossível prévia quantificação. Inclusive há numerosas parcelas que geram efeitos monetários conexos em outras verbas pleiteadas, com repercussões financeiras intrincadas e de cálculo meticuloso. Assim, a imposição do art. 840, § 1º, da CLT, após alterações da Lei 13.467/2017, deve ser interpretada como uma exigência somente de que a parte autora realize uma estimativa preliminar do crédito que entende ser devido e que será apurado de forma mais detalhada na fase de liquidação, conforme art. 879 da CLT.
De par com isso, a Instrução Normativa nº 41 do TST, no § 2º do art. 12, dispõe que: “Art. 12. Os arts. 840 e 844, §§ 2º, 3º e 5º, da CLT, com as redações dadas pela Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017, não retroagirão, aplicando-se, exclusivamente, às ações ajuizadas a partir de 11 de novembro de 2017. (…) § 2º Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado, observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil.” Logo, na medida em que os valores delimitados na petição inicial não vinculam, de forma absoluta, a condenação, revelando-se como mera estimativa dos créditos pretendidos pelo Autor, não há que se falar em limitação da liquidação aos valores indicados na peça exordial. Julgados desta Corte. Agravo de instrumento desprovido.”
Perfilhando da mesma diretriz, há diversas decisões desta Corte Superior Trabalhista:
“RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ATO COATOR CONSUBSTANCIADO EM DETERMINAÇÃO DE EMENDA DA PETIÇÃO INICIAL PARA JUNTADA DE PLANILHA CONTÁBIL. ÓBICE INJUSTIFICADO AO ACESSO À JUSTIÇA. LEI Nº 13.467, DE 2017. EXIGÊNCIA QUE NÃO CONSTA DO ART. 840, §1º, DA CLT TAMPOUCO DO ART. 319 A 324 DO CPC DE 2015. ATO TERATOLÓGICO. AFASTAMENTO DA APLICAÇÃO DA OJ Nº 92 DA SBDI-2 DO TST. SEGURANÇA CONCEDIDA. Cuida-se de mandado de segurança impetrado para impugnar despacho de emenda da petição inicial, em fase de conhecimento de reclamação trabalhista. A autoridade reputada coatora, com base no art. 840, §1º, da CLT, exigiu que o Reclamante complementasse a petição inicial com planilha contábil, sob pena de extinção do processo sem resolução do mérito. Na sessão de julgamento ocorrida em 6 de novembro de 2018, por ocasião do julgamento dos RO – 406-27.2017.5.10.0000 e RO – 144- 28.2011.5.05.0000, a SBDI-2/TST considerou inaplicável o teor da Orientação Jurisprudencial nº 92 da SBDI-2/TST sempre que o ato coator se revestir de ilegalidade ou for divergente da jurisprudência pacífica dessa Corte Superior e não houver meio processual para evitar o prejuízo imediato à parte impetrante. No caso em tela, verifica-se que, na petição inicial do processo subjacente, o Reclamante atribuiu valor a cada um dos pedidos. O pedido é certo e determinado, tal como exigem os arts. 840 e 319 a 324 do CPC de 2015. No âmbito da fase processual de conhecimento, não há a impreterível necessidade de que profissionais da contabilidade apurem, de início, o alegado ‘quantum’ devido. Com isso, o condicionamento do exercício do direito de ação à juntada de planilha contábil é medida manifestamente ilegal. Segurança concedida para assegurar o processamento da reclamatória independentemente da juntada de laudo pericial contábil. Recurso ordinário provido” (RO-368-24.2018.5.12.0000, SbDIII, Relatora Ministra Maria Helena Mallmann, DEJT 22/11/2019). (g.n.)
“III – RECURSO DE REVISTA. VALOR DA CONDENAÇÃO CONCERNENTE À EQUIPARAÇÃO SALARIAL. LIMITAÇÃO AO VALOR ESTIMADO NA PETIÇÃO INICIAL. ARTIGO 840, §1º, DA CLT. ALTERAÇÃO PROMOVIDA PELA LEI Nº 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA RECONHECIDA. 1. Cinge-se a discussão à viabilidade da limitação do valor da condenação ao montante indicado para cada um dos pedidos elencados na petição inicial, diante das alterações promovidas pela Lei nº 13.467/2017, especialmente no que concerne à interpretação a ser dada ao artigo 840, § 1º, da CLT, segundo o qual “sendo escrita, a reclamação deverá conter a designação do juízo, a qualificação das partes, a breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante”. 3. Com efeito, e a par da jurisprudência precedente à referida alteração legislativa, o TST aprovou a Instrução Normativa 41/2018, que regulamenta a aplicação das normas processuais contidas na CLT, alteradas ou acrescentadas pela Reforma Trabalhista, cujo artigo 12, §2º, estabelece que “§ 2º Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado, observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil” (grifei). 4. Nesse contexto, e tendo-se em conta que houve pedido expresso da parte, no sentido de que fossem “h) … as verbas deferidas apuradas em regular liquidação por cálculos”, infere-se que a decisão regional, que limitou a condenação concernente à equiparação salarial ao valor do pedido indicado na petição inicial, viola o artigo 840, § 1º, da CLT. Com efeito, em relação à verba em apreço, é razoável que os valores objeto da condenação sejam apurados definitivamente em liquidação, quando então possível aferir, com base nos documentos e demais informações trazidas aos autos, o quantum realmente devido, razão pela qual não se pode, na espécie, limitar a condenação aos valores expressos na petição inicial, porquanto meramente estimativos. Recurso de revista conhecido e provido.” (RR1000514-58.2018.5.02.0022, 1ª Turma, Relator Ministro Hugo Carlos Scheuermann, DEJT 04/08/2021)
“LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AO VALOR DO RESPECTIVO PEDIDO ATRIBUÍDO NA PETIÇÃO INICIAL. 1. O princípio da simplicidade, que informa o Processo do Trabalho, mais do que afastar os formalismos exacerbados que vigoraram no Processo Civil Comum, busca dar efetividade ao processo, enaltecendo sua natureza de instrumento para a persecução e efetivação do bem da vida deduzido em Juízo. Assim, o Processo do Trabalho não pode ser considerado um fim em si mesmo, mas apenas o meio pelo qual se efetivam direitos sociais e fundamentais mínimos, consagrados na Constituição da República e na CLT. 2. Diante da complexidade que envolve os cálculos trabalhistas, além das inúmeras discussões doutrinárias e jurídicas acerca da incidência de reflexos, seria desarrazoado atribuir, ao valor do pedido lançado na petição inicial, a certeza absoluta de um mesmo valor que se fixa, por exemplo, no caso de uma execução de um título extrajudicial. Não se exige, no Processo do Trabalho, a mesma indicação “precisa” a que referia o CPC de 1939, nem tampouco o refinamento na individualização do valor da causa, disciplinado nos artigos 42 a 49 do CPC de 1939. 3. O valor atribuído pelo reclamante, no caso dos autos, representou mera estimativa, simplesmente para a fixação de alçada (artigo 852-B, I, da CLT), não servindo como limite ao valor efetivamente auferido, após regular procedimento de liquidação de sentença. 4. Ao deixar de limitar a condenação aos respectivos valores indicados na reclamação trabalhista, o juiz de primeiro grau não violou o princípio da congruência, como reconhecido pelo Tribunal Regional, razão pela qual, impõem-se a reforma do julgado, a fim de se restabelecer o critério de liquidação indicado na sentença. 5. Recurso de Revista conhecido e provido.” (RR-11064-23.2014.5.03.0029, Relator Desembargador Convocado: Marcelo Lamego Pertence, 1ª Turma, DEJT 23/06/2017) (g.n.)
“RECURSO DE REVISTA REGIDO PELO CPC/2015 E PELA INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 40/2016 DO TST. INDEFERIMENTO DA INICIAL. RITO ORDINÁRIO. AÇÃO AJUIZADA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. NOVA REDAÇÃO DO ARTIGO 840, § 1º, DA CLT. PEDIDO CERTO E DETERMINADO. APRESENTAÇÃO DE MEMÓRIA DE CÁLCULO. DESNECESSIDADE. A nova redação do § 1º do artigo 840 da CLT, inserida pela Lei nº 13.467/2017, incluiu novas exigências, dirigidas à parte autora, para o ajuizamento de reclamação trabalhista na modalidade escrita. Tais exigências dizem respeito ao pedido formulado, ‘que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor’. Entende-se por pedido certo aquele que não é realizado de forma implícita, em caráter vago ou genérico, mas sim expresso na petição inicial, por exemplo, o pagamento de horas extras não adimplidas no curso do contrato. Por outro lado, o pedido determinado é aquele realizado de modo preciso, sem que haja margem de interpretação sobre o bem da vida que se deseja, ou seja, em prosseguimento do exemplo referido, o pagamento da 7ª e 8ª horas trabalhadas durante um período determinado. Por fim, a indicação de valor é expressão autoexplicativa, sendo obrigação da parte apontar o valor que pretende receber em razão de cada pedido certo e determinado que formular. Verifica-se, portanto, que a norma legal em questão em momento algum também determina que a parte está obrigada a trazer memória de cálculo ou indicar de forma detalhada os cálculos de liquidação que a levaram a atingir o valor indicado em seu pedido. Ademais, importante destacar que o § 2º do artigo 12 da IN nº 41/2018 do TST prevê, para “fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado, observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil’ (grifou-se), não havendo a necessidade da precisão de cálculos exigida na decisão Regional. Observa-se que a previsão legal em questão tem por objetivo (mens legis), possibilitar ao polo passivo o pleno exercício de seus direitos processuais fundamentais de ampla defesa e de exercício do contraditório, como garantido pelo artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal. Assim, havendo o reclamante apresentado em sua peça inicial pedido certo e determinado, com indicação de valor, está garantido ao reclamado a possibilidade de amplo exercício de seus direitos, visto que este sabe precisamente, desde o início do processo, quais são os pleitos formulados contra si. Ainda, não se pode interpretar tal previsão legal de modo a, de forma irrazoável e desproporcional, atribuir um peso desmedido sobre o reclamante que, ao início da demanda, não tem e nem pode ter conhecimento nem possibilidade de acesso a todos os documentos e informações necessárias para a precisa liquidação de suas pretensões, exigindo-se lhe que apresente pedido com indicação precisa de valores, inclusive com planilhas de cálculo detalhado, sob pena de, assim, impedir o seu direito de acesso ao judiciário (artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal), direito este igualmente fundamental, tão importante quanto os da ampla defesa e contraditório, ora mencionados. Resulta, portanto, que, ao exigir do reclamante a formulação de pedido certo, determinado e com indicação de valor, não pode o juiz da causa também lhe exigir a simultânea apresentação de cálculos detalhados como, no caso em exame, indevidamente exigiram as instâncias ordinárias, com a flagrante e direta violação dos direitos fundamentais, constitucionalmente assegurados a ambas as partes, de acesso ao Judiciário e de defesa de seus direitos materiais alegadamente violados ou ameaçados , (artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição da República). Há precedente da SbDI-II desta Corte superior. Recurso de revista conhecido e provido.” (RR-1001734- 65.2019.5.02.0084, 2ª Turma, Relator Ministro José Roberto Freire Pimenta, DEJT 26/02/2021) (g.n.)
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA SOB A ÉGIDE DA LEI 13.467/2017. RITO SUMARÍSSIMO. PEDIDOS LÍQUIDOS. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES DE CADA PEDIDO. APLICAÇÃO DO ART. 840, § 1º, DA CLT, ALTERADO PELA LEI 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA NÃO RECONHECIDA. A controvérsia gira acerca da aplicação do artigo 840, § 1º, da CLT, que foi alterado pela Lei 13.467/2017. No caso em tela, o debate acerca do art. 840, § 1º, da CLT, detém transcendência jurídica, nos termos do art. 896-A, § 1º, IV, da CLT. A controvérsia acerca da limitação da condenação, aos valores liquidados apresentados em cada pedido da inicial, tem sido analisado, pela jurisprudência dominante, apenas sob a égide dos artigos 141 e 492 do Código de Processo Civil. Por certo que aludidos dispositivos do CPC são aplicados subsidiariamente no processo trabalhista. Entretanto, no que se refere à discussão acerca dos efeitos dos pedidos liquidados, apresentados na inicial trabalhista, os dispositivos mencionados do CPC devem ceder espaço à aplicação dos parágrafos 1º e 2º do artigo 840 da CLT, que foram alterados pela Lei 13.467/2017. Cumpre esclarecer que o TST, por meio da Resolução 221, de 21/06/2018, considerando a eficácia da Lei 13.467/2017 e a imperativa necessidade de o TST posicionar-se, ainda que de forma não exaustiva, sobre a aplicação das normas processuais contidas na CLT alteradas ou acrescentadas pela Lei 13.467/2017, e considerando a necessidade de dar ao jurisdicionado a segurança jurídica indispensável a possibilitar estabilidade das relações processuais, aprovou a Instrução Normativa 41/2018, que no seu art. 12, § 2º, normatizou que “para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado (…)”. A Instrução Normativa 41/2018 do TST, aprovada mediante Resolução 221, em 02/06/2018, registra que a aplicação das normas processuais previstas na CLT, alteradas pela Lei 13.467/2017, com eficácia a partir de 11/11/2017, é imediata, sem atingir, no entanto, situações pretéritas iniciadas ou consolidas sob a égide da lei revogada. Portanto, no caso em tela, em que a inicial foi ajuizada no ano 2018, hão de incidir as normas processuais previstas na CLT alteradas pela Lei 13.467/2017. Assim, a discussão quanto à limitação da condenação aos valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial deve ser considerada apenas como fim estimado, conforme normatiza o parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 desta Corte. Agravo de instrumento não provido. (…)” (AIRR-10854-63.2018.5.03.0018, 6ª Turma, Relator Ministro Augusto César Leite de Carvalho, DEJT 12/02/2021). (g.n.) ‘RECURSO DE REVISTA. RECLAMANTE. LEI Nº 13.467/2017. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES ATRIBUÍDOS AOS PEDIDOS NA PETIÇÃO INICIAL. AÇÃO AJUIZADA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. 1 – No caso dos autos, discute-se a limitação da condenação ao pagamento de gorjetas ao valor apontado na inicial de R$ 500,00 mensais, em ação protocolada na vigência da Lei nº 13.467/2017. O TRT limitou a condenação ao valor estipulado na exordial, por entender que foram observados os limites objetivos da lide. 2 – A jurisprudência desta Corte Superior vinha se firmando no sentido de que, na hipótese em que há pedido líquido e certo na petição inicial, eventual condenação deveria se limitar aos valores atribuídos a cada um desses pedidos. 3 – Esse entendimento, contudo, é aplicável aos processos iniciados antes da Lei nº 13.467/2017. Com a Reforma Trabalhista, foi alterado o §1º do art. 840 da CLT, que passou a ter a seguinte redação: “Art. 840 – A reclamação poderá ser escrita ou verbal. § 1o Sendo escrita, a reclamação deverá conter a designação do juízo, a qualificação das partes, a breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio, o pedido, que deverá ser certo, determinado e com indicação de seu valor, a data e a assinatura do reclamante ou de seu representante”. 4 – A fim de orientar a aplicação das normas processuais introduzidas pela Lei nº 13.467/2017, foi editada por esta Corte a IN nº 41, que assim dispôs sobre a aplicação do art. 840, §1º, da CLT: “Art. 12. Os arts. 840 e 844, §§ 2º, 3º e 5º, da CLT, com as redações dadas pela Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017, não retroagirão, aplicando-se, exclusivamente, às ações ajuizadas a partir de 11 de novembro de 2017. […] § 2º Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado, observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil”. 5 – Desta feita, não há se falar em limitação da condenação aos valores estipulados nos pedidos apresentados de forma líquida na inicial, uma vez que estes são apenas estimativas do valor monetário dos pleitos realizados pela parte reclamante. A questão já foi decidida por esta Turma, quando do julgamento do ARR-1000987- 73.2018.5.02.0271. 6 – Assim, tem-se que os valores estipulados na inicial são apenas para fins estimativos. Ademais, no caso dos autos, ficou evidente que era a reclamada que detinha os documentos necessários à estimativa contábil das gorjetas (“In casu, a própria preposta informou que o valor das gorjetas era repassado pelo setor contábil da empresa, de modo que a ré tinha ciência do valor e era responsável pelo repasse aos empregados”), além de ter confessado que o valor devido mensalmente era superior ao pleiteado na exordial, conforme se observa do depoimento da preposta “que é rateada entre os garçons uma importância semanal de R$900,00/R$1500,00 a título de gorjeta”. 7 – Recurso de revista a que se dá provimento.” (RR-1001033-52.2018.5.02.0048, 6ª Turma, Relatora Ministra Kátia Magalhães Arruda, DEJT 22/10/2021). (g.n.)
“RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO A ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.467/2017. INDICAÇÃO DO VALOR DA CAUSA. VALOR ESTIMADO. ARTIGO 840, § 3º, DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. 1. Cinge-se a controvérsia em saber se o artigo 840, § 1º, da CLT, introduzido no diploma consolidado por meio da Lei nº 13.467/2017, exige a liquidação dos pedidos e, por conseguinte, a indicação precisa do valor da causa. 2. Considerando a atualidade da controvérsia, bem assim a ausência de uniformidade de entendimentos sobre a questão ora examinada, revela-se oportuno o reconhecimento da transcendência da causa, sob o aspecto jurídico. 3. Consoante disposto no artigo 840, § 1º, da Consolidação das Leis do Trabalho, com a redação conferida pela Lei n.º 13.467/2017, deve a parte autora, na petição inicial, formular pedido certo, determinado e com indicação de seu valor. Esta Corte superior editou a Instrução Normativa nº 41/2018, dispondo acerca da aplicação das regras processuais introduzidas na CLT por meio da Lei nº 13.467/2017 e, no seu artigo 12, § 2º, fez constar que “para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado”. 4. Resulta daí que a indicação do valor da causa, por estimativa, é suficiente para atender a exigência legal. 5. Recurso de Revista conhecido e provido” (RR-55- 11.2019.5.12.0006, 6ª Turma, Relator Ministro Lelio Bentes Correa, DEJT 01/10/2021). (g.n.) “[…] B) AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA RECLAMADA. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES INDICADOS NA INICIAL. Segundo o Tribunal de origem, o reclamante apontou valores dos pedidos de modo meramente estimativo, requerendo seja o valor real apurado em regular liquidação do feito mediante perícia contábil. Nesses termos, a decisão do Regional não implica violação dos arts. 840, § 1º, da CLT e 141 e 492 do CPC, na medida em que, nas causas sujeitas ao rito ordinário, o montante atribuído à causa não pode ser reconhecido como limite máximo do crédito trabalhista, pois se destina especificamente à atribuição de competência, à fixação do rito procedimental e às custas processuais arbitradas ao sucumbente no objeto da demanda. Agravo de instrumento conhecido e não provido”. (AIRR-10728-69.2018.5.15.0150, Relatora Ministra: Dora Maria da Costa, 8ª Turma, DEJT 23/08/2021) (g.n.) “[…] 4. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO. Segundo o Tribunal de origem, “ausente documentação cabal necessária para a exata indicação dos valores devidos, admite-se o apontamento por estimativa, notadamente no caso de procedimento ordinário”. A decisão do Regional não implica violação do art. 840, § 3º, da CLT, na medida em que, nas causas sujeitas ao rito ordinário, o montante atribuído à causa não pode ser reconhecido como limite máximo do crédito trabalhista, pois se destina especificamente à atribuição de competência, à fixação do rito procedimental e às custas processuais arbitradas ao sucumbente no objeto da demanda. […]” (AIRR – 11549-18.2018.5.15.0039 Data de Julgamento: 28/04/2021, Relatora Ministra: Dora Maria da Costa, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 03/05/2021) Na hipótese, o Tribunal Regional asseverou que, em relação aos pedidos relacionados na petição inicial, “o autor foi cauteloso ao expressar tratar-se de ‘valor estimativo’ naquelas parcelas que dependem de liquidação de sentença.” Ressaltou, ainda, que a ”mesma cautela teve o autor ao obedecer ao comando de emenda à petição inicial, pois consignou tratar-se de valor ‘sujeito a complementação’ (fls. 408/409)”. Nesse contexto, a decisão apresenta-se em conformidade com a jurisprudência do TST, o que torna inviável o exame das indicadas violações de dispositivo legal e/ou constitucional, bem como superada a eventual divergência jurisprudencial (Súmula 333 do TST e art. 896, §7º, da CLT). Ademais, avulta notar que, diante dos pedidos reconhecidos e deferidos na presente lide, não é possível exigir do Reclamante a apresentação de uma memória de cálculo detalhada, pois a reclamação trabalhista contém pedidos de apuração complexa – como é o caso, exemplificativamente, da pretensão a horas extras, que demanda usualmente o acesso aos documentos relativos à jornada e produção de prova oral para demonstração da pretensão correlata. Assim, somente por ocasião da liquidação judicial, é possível a quantificação da parcela. Em situações como a dos autos, na qual o Autor depende de atos que serão praticados pelo Réu, reitere-se que o art. 324, § 1º, III, do CPC/2015, autoriza que a Parte apresente pedido genérico. Logo, uma vez que os valores delimitados na petição inicial são considerados mera estimativa dos créditos pretendidos pelo Autor, não há que se falar em limitação da condenação aos valores indicados na peça exordial. Mantém-se, portanto, incólume a decisão do Tribunal Regional. Pelo exposto, NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento.
ISTO POSTO ACORDAM os Ministros da Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, à unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento.”
Ao debate, com as devidas e necessárias cautelas e observância das lições expressas nas decisões retrotranscritas.
*José Geraldo de Santana Oliveira é consultor jurídico da Contee