A ação do Movimento Sindical Brasileiro contra a pandemia e o governo de Jair Bolsonaro
Por Luiza Bezerra
O Brasil vive um momento de grandes ataques à classe trabalhadora. Mesmo antes da chegada da pandemia já vínhamos sofrendo com as diversas medidas neoliberais de retirada de direitos, iniciadas com o golpe de 2016 e a ascensão do governo Temer e aprofundados no governo Bolsonaro. Assim, a crise sanitária se une às crises social, econômica e política que o país vinha enfrentando.
A tentativa de impor a chamada Carteira Verde-Amarela é exemplo disto. Trata-se de uma Carteira de Trabalho diferenciada para os jovens que estivessem ingressando no mercado de trabalho. Esse novo contrato significava menos direitos e salários mais baixos para a juventude, que já enfrenta sérias dificuldades no acesso ao mercado de trabalho. Com muita luta, pressão e diálogo com o Congresso Nacional, conseguimos derrotar esta medida lançada em meio à pandemia. Mas a equipe econômica comandada por Paulo Guedes ainda insiste nela.
A Reforma da Previdência é outro exemplo da retirada de direitos que, assim como em outros países, temos sofrido no Brasil. Derrotamos pontos importantes da proposta do governo, como a capitalização e a desconstitucionalização, preservando seu caráter público. Apesar disto, impuseram a idade mínima (65 anos para homens, 62 para mulheres), acabando com a aposentadoria por tempo de contribuição, e aumentaram o período mínimo de contribuição de 15 para 20 anos, o que vai impedir o acesso deste benefício a milhões de brasileiros.
Desde o início do Governo Bolsonaro também temos presenciado sérios ataques à nossa recente democracia. Vão desde discursos autoritários diários, com ameaças de fechamento do Supremo Tribunal Federal e do Congresso Nacional, a ataques à liberdade de imprensa. Recentemente vários veículos de comunicação informaram que não iriam mais fazer a cobertura jornalística presencial em Brasília (capital do Brasil) por falta de segurança a seus jornalistas.
Ainda em 2019, seu primeiro ano de mandato, Bolsonaro perdeu muita popularidade, o que piorou com a chegada da pandemia. Quando começou o governo, 49% da população o avaliavam positivamente, enquanto apenas 11% avaliavam negativamente. Hoje, 50% da população avaliam seu governo como ruim ou péssimo, enquanto em torno de 25% seguem fiel e mobilizados para defender o atual governo.
Com quase 900 mil casos confirmados de Covid-19 e 43 mil mortos, o Brasil é o 2º no ranking mundial de vítimas da doença, atrás apenas dos EUA. Estes números só não são piores porque os governos estaduais e municipais tomaram ações independentemente das orientações federais. Nos principais estados houve isolamento social, fechamento de comércio e mesmo lockdown em algumas localidades. Ao mesmo tempo, o governo Bolsonaro segue menosprezando os efeitos sanitários da pandemia, insistindo numa dicotomia inexistente entre saúde ou economia. Aliado a grandes empresários, têm pressionado os estados a abrirem o comércio antes da hora.
É importante destacar também o papel do Congresso Nacional neste cenário. Apesar de dominado pela direita, sendo parceiro da agenda neoliberal de Bolsonaro,
o Congresso tem cumprido papel importante na defesa das instituições democráticas e para amenizar os impactos da pandemia. Com muita pressão do movimento social e sindical, o Congresso aprovou uma série de medidas para possibilitar a renda básica emergencial para um grande contingente de trabalhadores informais (hoje são mais de 40% da população ocupada no Brasil), no valor de US$ 120,00 mensais por pessoa (o governo queria apenas US$ 40,00).
As Centrais Sindicais brasileiras, em especial desde o início do governo Bolsonaro, têm tentado construir uma forte unidade de ação, buscando variados interlocutores. No Congresso Nacional, em parceria com os partidos de oposição, estamos construindo essa aliança ampla para avançar numa agenda de interesse da classe trabalhadora. Além da renda básica, aprovamos uma lei que irá garantir o salário de trabalhadores formais que tiverem seus contratos suspensos ou a jornada reduzida. Apesar de conter pontos negativos, como a possibilidade de negociações individuais entre patrão e empregado, a transformação em lei da MP 936, no atual cenário, pode ser considerada um avanço para a classe trabalhadora, já que o governo Bolsonaro queria aprovar uma dispensa sem pagamento algum para os trabalhadores. Outra lei importante aprovada pelo Congresso foi a que objetiva socorrer micro e pequenas empresas. Até aqui, Bolsonaro só havia lançando medidas que beneficiavam os médios e grandes empresários, embora ¾ dos trabalhadores brasileiros estejam empregados em micro e pequenas empresas.
Em conversas com os governos estaduais e também com empresários, as Centrais tentam garantir que, numa retomada das atividades, elas sejam feitas de forma planejada e segura para todos os trabalhadores. Além disso, há um esforço em construir uma agenda de desenvolvimento conjunta para enfrentar o pós-pandemia.
Nos sindicatos, o trabalho de base permanece nos locais que não estão em isolamento. Diversas entidades têm realizado suas assembleias de modo virtual, bem como utilizado de grupos em redes sociais para manter o diálogo com a base. Em todo o Brasil há iniciativas de solidariedade lideradas pelo movimento sindical, garantindo cestas básicas às comunidades. Assim como em outros países, entidades cederam sua estrutura para que órgãos de saúde possam utilizar os prédios. Houve, ainda, o fechamento de diversos acordos coletivos visando a manutenção de direitos dos trabalhadores. Na CTB, além das ações já mencionadas, temos realizado uma série de debates virtuais com o intuito de investir na formação da classe trabalhadora neste momento desafiador.
Diante deste cenário turbulento, aprofundado pela chegada da pandemia, o movimento sindical tenta construir a unidade. Acreditamos que precisamos explorar as contradições do Governo Bolsonaro, que perde popularidade e aliados. O setor progressista, por sua vez, segue sendo minoria (para se ter ideia, a esquerda detém cerca de apenas ⅕ dos votos no Congresso Nacional), o que nos mostra a necessidade de manter forte diálogo com diferentes setores, em especial neste momento de ataques frontais à democracia. A avaliação de que não é possível vencer a pandemia e defender a democracia com Bolsonaro no poder é cada vez abraçada por mais segmentos dentro da sociedade, fortalecendo o ˜Fora Bolsonaro˜.
Luiza Bezerra é bancária, socióloga e secretária de juventude da CTB