A escuta como pilar das ações: Edilene Arjoni à frente da Secretaria da Mulher da Contee

Filha de metalúrgico no ABC paulista, Edilene Arjoni cresceu em meio às grandes mobilizações sindicais do final da década de 1970. Desde criança, acompanhava as greves e sentia fascínio pela luta por direitos, experiências que a inspiraram a seguir o caminho do sindicalismo.

“Meu pai nunca foi sindicalista, mas sempre esteve envolvido na luta. Aquilo me encantava mesmo sendo criança”, lembra Edilene, recordando a participação na fundação de partidos e nas mobilizações estudantis, onde já tinha contato com a organização e a mobilização popular.

Ao iniciar a carreira como professora, Edilene encontrou um cenário de precarização e ausência de direitos consolidados na educação. Foi nesse contexto que começou a se envolver mais ativamente nas lutas sindicais, inicialmente como delegada sindical. Sua trajetória tomou um rumo surpreendente: antes mesmo de se tornar dirigente em seu sindicato local, o Sinpro ABC, foi convidada a integrar a diretoria da Federação dos Professores do Estado de São Paulo (Fepesp) em 1994.

“No ano seguinte, ingressei na direção do Sindicato dos Professores do ABC (Sinpro ABC), atuando em diferentes frentes: diretoria plena, jurídico, Secretaria de Organização de Base, vice-presidência — cargo que ocupei por oito anos — e, posteriormente, a presidência. Atualmente, estou na metade do meu segundo mandato como presidenta do Sinpro e assumo também a coordenação da Secretaria da Mulher da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee), reafirmando meu compromisso com a luta por direitos trabalhistas e pela igualdade de gênero na educação.”

Superando desafios: pandemia, base sindical e comunicação

Ao assumir o comando do Sinpro ABC pouco antes da pandemia de COVID-19, Edilene enfrentou um período extremamente desafiador.

“Foi imediato e sofrido. Perdemos dois diretores, ambos por infarto, um deles muito jovem. A pandemia estava acontecendo, e tivemos que nos reinventar sem saber exatamente como agir”, lembra.

Mesmo diante das dificuldades, o sindicato protagonizou uma das primeiras campanhas por prioridade de vacinação dos profissionais da educação em São Paulo.

“Começamos com 35 lideranças, depois 70, e conseguimos formar um grande movimento pedindo vacinação prioritária para a educação. Esse movimento chegou às ruas, mesmo em plena pandemia. Foi um momento marcante”, destaca.

O ABC Paulista também enfrentou redução significativa de sua base, principalmente no ensino superior. “Nosso trabalho foi manter essas pessoas, proteger os empregos e garantir que continuassem associados ao sindicato”, afirma Edilene.

Ela também destacou as inovações na comunicação: “A comunicação com a base é uma tarefa desafiadora. Muitos professores e professoras têm medo de se manifestar publicamente, acreditando que o patrão pode acompanhar e punir. Para driblar essas limitações, produzimos vídeos em formato de quadrinhos, carrosséis de notícias, conteúdos com participação direta de diretores e diretoras, além de presença em TikTok e outras mídias digitais. O retorno do público não acontece diretamente nas redes sociais, mas principalmente via WhatsApp, onde os profissionais se sentem mais seguros para tirar dúvidas, relatar problemas e interagir com a entidade.”

Com estrutura enxuta e sem dirigentes liberados da sala de aula, a militância é feita por dedicação extra.

“Você dedica 16, 20, 30 horas por semana para o sindicato, mas ainda precisa cumprir suas aulas. É uma vida sofrida, mas é apostando na luta que conseguimos avançar. A militância, por si só, é viciante: você vai lutar com recurso ou sem recurso, e está tudo bem”, acrescenta.

Combate à precarização e à pejotização

Para Edilene, combater formas de exploração como a pejotização é “uma luta diária”: “Quando você é pejotizado ou recebe apenas pela aula, está trabalhando para comer. Quem trabalha só para se manter vivo está em condição de escravidão.”

Arjoni frisa ainda a importância da atuação nacional da Contee: “O que fazemos regionalmente é importante, mas sempre limitado. Para extinguir esse tipo de prática, é necessário um trabalho robusto e bem articulado na esfera nacional.”

Secretaria da Mulher da Contee: a escuta como pilar das ações

Agora, Edilene encara um novo desafio: a coordenação da recém-criada Secretaria da Mulher da Contee. Para ela, essa tarefa só pode ser construída a partir da escuta.

Edilene Arjoni revelou que a escolha do seu nome para coordenar a nova Secretaria foi uma surpresa positiva.

“Fiquei muito feliz e me sinto lisonjeada e grata por ter sido eleita para ocupar esta importante pasta”, disse. Ela destaca que a secretaria deve nascer de forma coletiva e democrática e representa uma oportunidade ímpar de atuar diretamente na realidade das mulheres no ambiente de trabalho.

“Nesse momento inicial, o meu único plano é reunir o maior número de mulheres, de opiniões, de estados diferentes, de realidades diferentes, para decidir o que fazer e como fazer. Acho que tem que ser uma secretaria extremamente democrática: ouvir a todas, detectar os problemas das diversas regiões e aí sim construir uma política de valor nacional.”

A dirigente reforça que a prioridade é consolidar conquistas, enfrentar o assédio, a precarização e ampliar a participação das mulheres nas instâncias sindicais: “Até nas nossas instâncias sindicais, sempre tivemos maioria de homens. Agora, com a Contee mais paritária, isso dá voz às mulheres. Vamos escutar todas, em regiões diferentes, realidades distintas, para construir um trabalho que traga novas perspectivas.”

“Primeiro precisamos ouvir, detectar e depois planejar juntas soluções para tantos problemas que envolvem o ambiente de trabalho, de modo especial o que acontece no chão da escola”, salienta.

Ampliar direitos para mães gestantes e pais adotantes

Entre as pautas centrais de sua atuação, Edilene destaca a necessidade de avançar na licença-maternidade e de incluir mães e pais adotantes.

“É uma luta que nós temos de estender a licença-maternidade pós-gestação para seis meses, porque atualmente só temos quatro. Em alguns segmentos, conseguimos ampliar um pouco”, elucida.

No caso das famílias adotivas, a dirigente denuncia desigualdades ainda mais graves: “Adoção é um tema muito importante. Eu tenho dois filhos adotados e posso dizer como é difícil passar por esse processo no trabalho. No meu primeiro filho, o INSS não reconheceu minha licença-maternidade. Fiquei cinco meses sem salário, com um bebê desnutrido nos braços. Tive que quase abrir mão da licença para poder sustentar meu filho. Anos depois, com minha filha, ainda fiquei três meses sem salário.”

Ela também critica a limitação da licença-paternidade: “O pai que adota sozinho tem uma licença menor. E quando você adota uma criança maior, ainda que tenha 10 anos ou seja adolescente, precisa acompanhá-la, conversar, estabelecer vínculos. Mas se está na sala de aula dez horas por dia, não pode cuidar dessa vida que precisa de você.”

A busca por avanços é contínua

Edilene Arjoni comenta que a Secretaria da Mulher da Contee vai intensificar o debate sobre temas como direitos relacionados a filhos e dependentes, com aumento de ausências remuneradas para levar filhos ao médico ou cuidar de parentes internados; acolhimento menstrual e menopausa, garantindo o reconhecimento de crises fisiológicas sem estigmatização; saúde mental, com projetos em parceria com outras secretarias para apoiar professores e funcionárias em situações de estresse ou sobrecarga; interseccionalidade e combate a preconceitos, incluindo machismo, misoginia e etarismo; e licença remunerada para estudo e pesquisa científica, incentivando a participação feminina na ciência, historicamente negligenciada.

Diálogo e construção coletiva

A coordenadora reforça que sua gestão à frente da Secretaria da Mulher da Contee será marcada pelo diálogo e pela construção coletiva: “Meu objetivo é que tenhamos uma gestão plural, que ouça e seja capaz de traçar políticas que tragam benefícios, bem-estar, melhoria nas condições de trabalho e novas conquistas para as mulheres.”

Para Edilene, a luta é por todas as professoras e trabalhadoras da educação que enfrentam, diariamente, inúmeros desafios no chão da escola: “Queremos olhar para as mulheres que estão à frente desse trabalho tão difícil, enfrentando todos os tipos de problemas, e garantir que, acima de tudo, estejamos juntos, todos e todas nós, numa caminhada de resistência e esperança.”

Por Romênia Mariani

Artigos relacionados

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Botão Voltar ao topo
666filmizle.xyz