Abertura do Seminário Internacional destaca experiências educacionais globais

Na tarde desta quarta-feira (9), teve início o Seminário Internacional “Educação em Diálogo – Desafios e Perspectivas no Mundo”, realizado na sede da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee), em formato híbrido, reunindo presencialmente e virtualmente representantes de diversos países. O evento promove um espaço fundamental de troca de experiências, reflexões críticas e articulação internacional para fortalecer a luta por uma educação pública, democrática e de qualidade em escala global.

Delegações da Argentina, Brasil, Bolívia, Uruguay, Cuba, Espanha, Honduras, México, participaram da abertura, compartilhando as particularidades dos seus contextos educacionais, as políticas públicas adotadas, as estratégias de resistência e os avanços conquistados em seus países.

A coordenadora da Secretaria de Relações Internacionais da Contee, Cristina Castro, abriu os trabalhos, destacando a relevância do seminário diante do cenário atual: “Este é um seminário importante num momento mundial crucial para as nossas lutas, para o nosso fortalecimento enquanto trabalhadores e trabalhadoras. Contamos com a participação de vários países e de entidades nacionais que compõem essa caminhada conosco.”

Em seguida, Fernando Rodal, membro do Comitê Executivo da Confederação de Educadores Americanos (CEA) saudou os presentes, ressaltando a importância da integração global das lutas sociais e educacionais e refletiu ainda sobre o atual cenário geopolítico e o papel do Brasil e da América Latina na transformação global: “O Brasil, hoje, como muitos outros países, tem um papel relevante na América Latina e no mundo. Estamos vivendo um momento de transformação global. A realização dos BRICS aqui mesmo no Brasil é um exemplo claro do avanço de um mundo multipolar, que rompe com o domínio unipolar dos últimos 30 anos. Os sindicatos e as organizações de trabalhadores não estão à margem dessa mudança. Cabe a nós atuar de forma proativa nessa nova realidade.”

Vozes internacionais na defesa da educação

Argentina

Bernardo Beltrán, do Sindicato Argentino de Docentes Privados (SADOP), falou sobre a importância da educação privada controlada pelo Estado: “Estamos formando uma coordenação que representa os trabalhadores da educação privada, um setor que ganha cada vez mais importância dentro do sistema educativo, mas que enfrenta grandes desafios. Reivindicamos a educação privada controlada pelo Estado, não como privatização, mas para garantir representação sindical e direitos para esses trabalhadores. Na Argentina, por exemplo, nossa organização sindical, fundada em 1947 com o apoio de Eva Perón, nasceu para defender os docentes privados, que por muito tempo estiveram desprotegidos e sem condições laborais dignas. Atualmente, enfrentamos dificuldades como a falta de negociação salarial nacional e a ausência de políticas públicas efetivas, o que demonstra o descaso do governo com a educação e seus trabalhadores. A união entre trabalhadores da educação pública e privada é fundamental para fortalecer nossa luta e garantir direitos em toda a América Latina.”

Maria Cassala, do Sindicato Argentino de Docentes Privados (SADOP), denunciou o avanço do neofascismo e seus impactos na educação: “Estamos vivendo na Argentina uma ofensiva brutal do neofascismo, que atinge a educação, os direitos sociais e a democracia. O governo Milei desmantela conquistas históricas, ignora a Lei Nacional de Educação e rompe com mecanismos fundamentais como a paritária docente nacional, aprofundando as desigualdades entre as províncias. Soma-se a isso a ausência de um convênio coletivo para os docentes do setor privado, altamente feminizado e precarizado. Diante desse cenário, fortalecer a solidariedade internacional entre os trabalhadores da educação não é só urgente — é estratégico. Precisamos construir, juntos, uma resposta coletiva à altura dessa crise, para defender nossos povos e nosso direito à educação com justiça social.”

Daniel Ricci, presidente da Federação de Sindicatos Docentes das Universidades da América do Sul (FESIDUAS), completou ressaltando a importância da solidariedade na luta contra o avanço do fascismo: “Lamentavelmente, atravessamos uma situação difícil na Argentina, com mais de cem por cento de inflação, uma economia mutada e um governo fascista que deteriora os pressupostos para a ciência e tecnologia. Resistimos firmes na Argentina e sabemos que essa luta está vinculada à luta de todos nas organizações sindicais, políticas e sociais da América Latina contra o avanço do fascismo. Pedimos solidariedade mútua para derrotar essas políticas que tanto ameaçam nossa região. Como companheiro e presidente, acredito que devemos trabalhar juntos para fortalecer a democracia, a educação pública e formar profissionais comprometidos com a justiça social”.

Marcelo Magnasco, Federação Latino-Americana de Cientistas / Membro do Comitê Executivo da Confederación de Educadores Americanos (CEA), evidenciou os ataques à ciência e educação: “Vivemos um momento em que a ciência e a educação estão sob ataque em várias partes do mundo, inclusive em nossa região. Na América Latina, 80% dos pesquisadores estão vinculados às universidades públicas, que enfrentam cortes, desmantelamentos e tentativas de silenciamento. Precisamos defender esses espaços como territórios de trabalho, pensamento crítico e soberania científica. Não podemos permitir que sistemas científicos, premiados e reconhecidos, sejam destruídos por governos autoritários que criminalizam o conhecimento e atacam os direitos da classe trabalhadora.”

Uruguai

Claudia Lártiga, do Sindicato Nacional de Trabajadores y Trabajadoras de la Ensen anza Privada del Uruguay (SINTEP), ressaltou o compromisso pela cooperação e solidariedade: “Reafirmamos nosso compromisso de continuar trabalhando em coordenação pela cooperação e solidariedade com nossas organizações e as organizações sociais de nossas comunidades em defesa da educação pública, dos direitos dos trabalhadores e dos interesses de nossa classe. Até que a dignidade se torne um costume.”

Brasil

Madalena Guasco, coordenadora da Secretaria-Geral da Contee, falou sobre os retrocessos e resistências no país: “Desde 2016, enfrentamos um projeto determinado de ataque à educação pública, de privatização, de ataque aos direitos e à educação democrática. Sofremos retrocessos com reformas trabalhistas e sindicais que precarizaram os direitos dos trabalhadores da rede pública e privada. Apesar das dificuldades, o movimento educacional no Brasil permaneceu unido e potente, resistindo aos desmontes dos espaços democráticos de participação e às tentativas de esvaziar as organizações sociais. Conseguimos algumas vitórias importantes, como a derrota da extrema-direita nas eleições, que representou uma esperança de resistência. Reconstruímos o Fórum Nacional de Educação, promovemos uma Conferência Nacional que estabeleceu um novo Plano Nacional de Educação, e obtivemos a regulamentação da educação privada, conquistando um marco regulatório essencial para garantir responsabilidade social. Internacionalmente e internamente, o que nos une são as bandeiras pela educação pública e democrática, e a resistência firme contra a direita que avança no mundo todo, inclusive no Brasil, onde seguimos nos preparando para garantir que o projeto democrático continue vitorioso.”

Cristina Del Papa, Coordenadora-Geral da Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnico-Administrativos em Instituições de Ensino Superior Públicas do Brasil – Fasubra Sindical, alertou para os cortes e desafios orçamentários que atingem pesquisa e ensino público: “No mundo inteiro, vemos a direita e a extrema-direita tomando o poder, e o enfrentamento piora a cada dia. Mesmo com um partido de esquerda no governo, o Congresso tenta a todo momento tirar poderes, aprovando 60 milhões em emendas que saem do serviço público e dos investimentos sociais, com cortes na educação e na saúde. Tivemos cortes no último governo, que nos levaram a ter menos orçamento do que em 2009. O governo tentou recuperar, mas a educação pode sofrer novos cortes. Hoje, 95% da pesquisa no Brasil é feita pelas universidades e institutos federais, que são parte fundamental dos serviços públicos. Educação representa 49,5% dos servidores do executivo. Cortes atingem pesquisa, extensão, assistência e salários dos servidores. Seguimos firmes na luta.”

Manoel José Porto, Coordenador-Geral do O Sindicato Nacional dos(as) Servidores(as) Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica (SINASEFE), denunciou o autoritarismo crescente: “A gente verifica que em alguns casos o Milei consegue ser ainda mais caricato, mas tem uma coisa que é comum nesses governos fascistas: é um ódio à educação, um ódio à ciência, um ódio aos professores e àquilo que a gente chama aqui de técnico-administrativos em educação, os servidores da educação. Essas escolas que visam disciplinar nossa juventude e engajar nossas crianças num projeto fascista não admitem que certas coisas sejam discutidas, criticadas ou sequer pensadas, especialmente em disciplinas como história, sociologia e filosofia. Isso é um projeto autoritário, antidemocrático, que precisa ser enfrentado com firmeza.”

Cuba

Niurka Gonzalez Orbera, Presidenta do Sindicato Nacional de Trabalhadores da Educação, da Ciência e do Esporte de Cuba (SNTECD), destacou o modelo educacional cubano: “Enquanto o capitalismo promove a privatização, a mercantilização e a precarização da educação pública — desde a pré-escola até a universidade —, em Cuba isso não acontece. Isso é fruto do hermoso projeto social que estamos construindo, que protege nossa educação, nossa dignidade e nosso povo. Mas, conscientes do que enfrentam tantos países irmãos, reafirmamos: estamos dispostos, junto a vocês, a continuar lutando por uma educação emancipadora e contra a ofensiva neoliberal que tenta desmantelar esse direito em todo o mundo.”

Espanha

María Luz González Rodríguez – Responsável pela Ação Sindical da Federação de Sindicatos de Trabalhadores e Trabalhadoras da Educação (STEs-i) reafirmou o compromisso com uma educação pública, laica e inclusiva: “Defendemos um sistema educativo laico, inclusivo e gratuito, que sirva à cidadania e não a interesses econômicos. Reivindicamos uma carreira profissional justa e digna para o professorado, com condições laborais adequadas e autonomia profissional, pois o professor é agente ético e cultural, não mero aplicador de conteúdos impostos por plataformas digitais. Valorizamos muito os espaços internacionais de encontro para construir alianças que nos permitam resistir e imaginar alternativas pedagógicas pautadas na justiça social e na liberdade. Reiteramos nosso compromisso com uma educação pública, democrática e transformadora, porque esse modelo educativo não só é possível, mas urgente e necessário.”

México

Javier Carretero Villanueva, do Sindicato Nacional de Trabajadores de la Educación (SNTE), salientou a preocupação com a previdência e a luta social: “Hoje, 70% dos trabalhadores estão inseridos em um regime de contas individuais e, em 2037, a primeira geração que ingressou nesse sistema receberá apenas 30% ou 40% do último salário. Isso precisa ser revisto. Nossa direção tem apresentado propostas e solicitado essa revisão, com base em projeções atuariais que permitem essa alteração. O trabalhador que se aposenta deve receber uma pensão digna, que lhe permita manter o padrão de vida conquistado após anos de dedicação ao trabalho educativo e social. Além disso, realizamos campanhas permanentes em cada centro escolar, envolvendo trabalhadores, pais e alunos, para conscientizar sobre o cuidado com os recursos naturais, a promoção da cultura de paz e o combate ao uso de drogas — um flagelo em nossa região. Trabalhamos para o povo, defendendo a esfera pública e os direitos trabalhistas e sindicais. Enviamos nossa solidariedade e apoio aos irmãos da Argentina, certos de que, das crises, sempre saímos fortalecidos.”

Honduras

Bessy Yolanda Berríos, Primer Colégio Profesional Hondureno de Maestros,  abordou sobre o desafio de ampliar o acesso à educação: “A educação em Honduras enfrenta um grande desafio: mais de 200 mil crianças continuam fora do sistema escolar. Nosso compromisso, como organização magisterial e com o apoio de um governo popular, é ampliar o acesso à educação pública gratuita e inclusiva, desde a pré-básica até a média, garantindo matrícula sem custos, merenda escolar, material didático e infraestrutura adequada. Também estamos lutando para fortalecer a formação docente, com programas de capacitação contínua e criação de materiais pedagógicos que promovam uma educação mais libertadora, crítica e acessível a todos, especialmente aos setores historicamente excluídos.”

Bolívia

Carlos Salinas, Confederação Universitária de Docentes (CUD), denunciou o subfinanciamento das universidades públicas: “As universidades públicas na Bolívia têm enfrentado, há mais de 20 anos, uma política sistemática de subfinanciamento, que condiciona sua sobrevivência e compromete seu papel como último bastião intelectual do sistema público. É urgente fortalecer os espaços universitários e docentes como trincheiras de resistência frente aos abusos de poder e aos ataques que atingem toda a América Latina e o Caribe.”

Escola sob ataque: seminário reforça urgência de ação coletiva

Cristina Castro da Contee, encerrou o primeiro dia do seminário com um alerta sobre os efeitos da desvalorização da escola e dos profissionais da educação:

“Quando desqualificamos a escola como espaço transformador, abrimos caminho para o ódio. A violência que cresce fora dos muros entra pelas portas da escola — e isso tem consequências reais, como vimos recentemente com estudantes influenciados por jogos violentos, tragicamente envolvidos em ataques.”

Ela defendeu a construção de uma resposta coletiva, destacando a importância da solidariedade internacional para enfrentar o avanço da extrema direita, os retrocessos sociais e os ataques à democracia.

O seminário segue nesta quinta-feira (10), com discussões sobre a inteligência artificial na educação, o impacto das novas tecnologias e os desafios para o fortalecimento do movimento sindical frente ao cenário internacional.

Por Romênia Mariani

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