Agro e evangélicos montam ofensiva contra plano de educação do governo Lula
Bancadas pedem adiamento de conferência por suposto cunho político e ideológico dos debates
João Gabriel
As bancadas ruralista e evangélica do Congresso Nacional se mobilizaram contra o PNE (Plano Nacional de Educação) do governo Lula (PT).
Em nota conjunta publicada nessa quarta-feira (24), os dois grupos, além de outras frentes do Congresso ligadas a movimentos conservadores, pediram o adiamento da Conae (Conferência Nacional de Educação) deste ano e teceram críticas às políticas educacionais da gestão petista.
A ação dos parlamentares acirra ainda mais os ânimos da relação entre o governo petista e a ala mais conservadora do Congresso, e coloca novamente a educação como palco dessa disputa política.
Em novembro de 2023, a bancada ruralista já havia criticado o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) e pedido anulação de questões relacionadas ao agronegócio —as perguntas, segundo o ministro da Educação, Camilo Santana, tinham sido elaboradas no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Mais recentemente, após Lula revogar uma norma que concedia benefício tributário a pastores, a bancada evangélica fez críticas à gestão petista e pediu a retomada da vantagem.
A Conae de 2024 foi convocada de forma extraordinária pelo governo Lula para debater o Plano Nacional de Educação e está marcada para começar em 28 de janeiro. A programação vai até o dia 30.
As frentes parlamentares criticam trechos do documento de referência da conferência e que deve balizar as discussões do grupo. Elas afirmam que há pontos com viés político e ideológico no documento.
A Conae propõe, por exemplo, a desmilitarização das escolas, critica a prática de “homeschooling” (ensino em casa), o movimento Escola Sem Partido e políticas chamadas de ultraconservadoras. Também defende temas como diversidade de gênero e religião, debates sobre questões LGBTQIA+ e ambientais.
“O texto-base expõe diversas questões político-ideológicas, sem embasamento científico, ao qual recomendamos a suspensão para que todos os setores econômicos e sociais possam participar ativamente das discussões”, reclamam evangélicos e ruralistas, em nota.
Aliados de Lula reagiram. O deputado Pedro Uczai (PT-SC) afirmou que o documento é fruto de um processo democrático de construção, e que tentar obstruir a conferência é um movimento contra o pluralismo e o debate de opiniões diversas.
“A bancada evangélica e a bancada ruralista têm legitimidade para se contrapor a determinados temas, mas não podem inviabilizar o processo democrático. Eles não são muito afeitos à democracia e à participação social”, disse.
“Esses setores têm que conviver com a democracia, com a diversidade e com a pluralidade. Essa é a essência da democracia e de uma república num país. Somente aqueles que querem efetivamente colocar só o seu posicionamento como vitorioso na sociedade, autoritariamente, que são capazes de criticar ou colocar em questão ou sugerir transferência, suspensão da Conferência Nacional de Educação”, completou.
A nota das frentes parlamentares é mais um capítulo da tensão entre Executivo e Legislativo.
A bancada evangélica se mobilizou contra Lula após a revogação dos benefícios tributários para pastores.
No início de 2024, cumprindo um acordo firmado no início de 2023, a Frente Parlamentar Evangélica voltará a ser comandado pela ala mais conservadora e bolsonarista –avessa à gestão petista.
Após ser comandada por Silas Câmara (Republicanos-AM), deputado que mantém diálogo com integrantes do governo Lula, o grupo passará a ser liderado por Eli Borges (PL-TO), do partido de Bolsonaro.
Já a bancada ruralista se consolidou durante o governo Bolsonaro como uma das frentes mais poderosas da Câmara dos Deputados.
Em 2023, liderou não só os movimentos contra o STF (Supremo Tribunal Federal), mas também aplicou derrotas importantes no governo Lula.
A Conae é uma das mais importantes etapas de discussão e subsídio do Plano Nacional de Educação, que é elaborado pelo Executivo.
A mobilização das bancadas evangélica e ruralista, que detém a maioria dos parlamentares do Congresso, é relevante porque o plano do governo federal precisa ser apresentado em forma de projeto de lei e, portanto, ser aprovado pela Câmara e pelo Senado, onde pode também ser modificado.
Também assinam o documento contra a Conae outras frentes parlamentares, como a de Comércio e Serviço, da Segurança Pública (ligada à bancada da bala) e a do Brasil Texas.