Anhanguera está na mira do governo
A compra da UniABC pela Anhanguera Educacional, realizada em julho, está em apuração na Secretaria de Acompanhamento Econômico, do Ministério da Fazenda. O objetivo é verificar se há monopólio do Ensino Superior por parte da instituição, que já adquiriu outras quatro faculdades no Grande ABC – Uniban, UniA, Anchieta e Faenac.
O procedimento é obrigatório quando há aquisições de empresas na qual uma das acionistas, no caso a Anhanguera, tem faturamento superior a R$ 400 milhões no ano anterior à realização do negócio. Além da SAE, a Anhanguera também foi obrigada a notificar a Secretaria de Direito Econômico, do Ministério da Justiça, e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica, mas a apuração da aquisição é iniciada sempre pelo Ministério da Fazenda.
Conforme explicou o assessor técnico da secretaria, Ricardo Faria, cabe ao órgão produzir relatório para ser enviado ao Cade, que tem o poder de aprovar ou não a compra da UniABC. “O prazo para elaborar a documentação é de 30 dias, mas cada vez que precisamos solicitar informações, ele é interrompido”. No caso do processo da Anhanguera, já se passaram 158 dias corridos. “É possível perceber que há preocupação do ministério em apurar se há ou não monopólio, pois a maioria dos atos de concentração que chegam até nós são julgados dentro do prazo de 30 dias”, observou.
As informações para compor o relatório são colhidas com outras instituições de Ensino Superior privadas da região, que compõe o mercado concorrente da Anhanguera. O Diário teve acesso a documento enviado pela SAE à Fundação Santo André com pedido de esclarecimentos. Segundo Faria, o procedimento é padrão e outras instituições da região poderão ter de responder ao questionário.
Caso seja constatada a formação de monopólio, o Cade pode obrigar a Anhanguera a se desfazer de parte do patrimônio adquirido, ou de sua totalidade. O problema é que a instituição promoveu a demissão de 348 professores das faculdades que comprou antes mesmo de ter a aprovação do órgão.
Mudanças
Conforme a Lei 8.884/94, as empresas são obrigadas a informar os órgãos federais sobre aquisições e fusões apenas após a concretização do negócio. Segundo o advogado especialista em Direito da Concorrência José Inácio Gonzaga Franceschini, isso deve ser alterado a partir do dia 1º de junho, quando entra em vigor nova legislação.
Franceschini destaca ainda que os prazos propostos pelos órgãos avaliadores, na prática, não têm muito significado. “Processos complexos costumam levar mais de um ano para serem apurados.”
O especialista, porém, não acredita que as compras promovidas pela Anhanguera na região deverão se reverter. “O entendimento do Cade sobre esse assunto ainda é nebuloso, mas há tendência de encarar como produto o curso, e não o Ensino Superior como um todo”. Neste caso, pode ser constatado que a Anhanguera monopilizou uma determinada graduação no Grande ABC, e então o Cade poderia obrigá-la a vender determinada faculdade. “Mas é difícil, pois o Cade avalia o espaço geográfico do mercado como sendo estadual, e não regional.”
A Anhanguera afirma, por meio de nota, que o procedimento é padrão e que está cumprindo as exigências da lei. Quanto à preocupação por parte da SAE, a instituição se limitou a dizer que o Cade avalia todas as aquisições realizadas pela Anhanguera em diversas cidades brasileiras, independente da região, sem, portanto, haver dedução antecipada de concentração do grupo no Grande ABC.
Educação virou fetiche, garante especialista
Para o professor do Departamento de Educação da Universidade Federal de São Carlos e autor do livro Novas Faces da Educação Superior no Brasil, João dos Reis Silva Júnior, a monopolização da Anhanguera no Ensino Superior demonstra que a Educação se tornou fetiche. “O aluno vê o que não existe, no caso, a formação universitária, e não enxerga o que existe, que é a ilusão de que será profissional qualificado.”
O especialista aponta ainda que a Anhanguera é uma empresa com capital na Bolsa de Valores e que possui, inclusive, investidores internacionais. “Trata-se da segunda maior instituição de Ensino Superior privada do mundo.”
Silva Júnior acredita que monopólios como esse podem, inclusive, piorar a qualidade da Educação Básica no País, já que a maioria dos cursos são de formação de professores. “Com mensalidades de R$ 200 e baixa qualidade de ensino, estamos criando um círculo vicioso com consequências desastrosas”, prevê.
Universidade terá de indenizar demitidos
O presidente do Sindicato dos Professores do Grande ABC, Jorge Maggio, informou ontem que a Anhanguera Educacional terá de pagar indenizações aos 384 professores que foram demitidos no Grande ABC. A conquista foi obtida após negociações entre a entidade e o grupo. O acordo evitou que a questão fosse parar na Justiça.
O número exato de demissões foi divulgado ontem. Em todo o Estado, foram 1.500. Todos serão beneficiados com a medida. Metade dos docentes demitidos era da UniABC e 80% do total eram mestres e doutores.
O grupo concordou em pagar metade de um salário para cada professor desligado da instituição, além da garantia de três meses de plano de saúde. As exigências passam a valer após a conclusão das homologações, prevista para dia 3.
Agora, volta à pauta a discussão pedida ao Ministério da Educação sobre o plano pedagógico adotado pela instituição, que é acusada por funcionários e pelos próprios alunos de precarizar o Ensino Superior. A troca de comando da Pasta irá atrasar a análise. O novo ministro, Aloízio Mercadante, assume hoje o lugar de Fernando Haddad. (Maíra Sanches)
Fonte: Diário do Grande ABC