Brics no Rio: Declaração da Cúpula traça nova arquitetura da governança global

Reforma institucional, justiça climática, soberania digital e combate à fome marcam prioridades do Sul Global lideradas pelo Brasil na 17ª Reunião de Líderes

A Declaração do Rio de Janeiro , aprovada neste domingo (6) na 17ª Cúpula de Líderes do BRICS, consolida uma inflexão estratégica: o bloco ampliado emerge como polo articulador de uma governança global mais justa, inclusiva e sustentável. Sob a presidência brasileira, a reunião — realizada no Rio — fortaleceu a cooperação política entre os países do Sul Global e lançou uma agenda propositiva com resultados concretos em áreas como clima, saúde, tecnologia, finanças e comércio.

Com o lema “Fortalecendo a Cooperação do Sul Global para uma Governança mais Inclusiva e Sustentável”, a cúpula reafirma o BRICS como herdeiros políticos da Conferência de Bandung e do Movimento Não-Alinhado, agora expandido e institucionalmente mais robusto. Em meio à crise de substituição da ONU e à fragmentação das instituições multilaterais, o bloco atua como pesquisas de reformas e como fórum alternativo de convergência entre países do mundo em desenvolvimento.

Reforma da governança global: compromisso com multilateralismo inclusivo

A principal mensagem da Declaração é clara: o sistema internacional atual é disfuncional, anacrônico e excludente. Em resposta, os líderes reiteram a urgência de reformar o Conselho de Segurança da ONU, com apoio explícito da China Rússia e da ampliação da presença do Brasil e da Índia como membros permanentes. Também reafirmamos a necessidade de revisão da governança das instituições financeiras internacionais, como o FMI e o Banco Mundial, com aumento da participação dos países em desenvolvimento.

As potências do BRICS rejeitaram medidas coercitivas unilaterais e avaliações extraterritoriais, denunciando sua ilegalidade e impacto no comércio global. Em contrapartida, reafirmamos o apoio à Organização Mundial do Comércio (OMC) e celebramos documentos como o Marco sobre Comércio e Desenvolvimento Sustentável e a Declaração sobre a Reforma da OMC, refletindo a aposta do bloco em um comércio multilateral equilibrado.

Clima, saúde e IA: soluções do Sul Global para problemas globais

A cúpula também produziu três declarações temáticas inovadoras, assinadas por todos os membros e endossadas por Malásia e Bolívia:

– A Declaração-Marco sobre Finanças Climáticas, que propõe mecanismos próprios de financiamento verde, como o Fundo Floresta Tropical para Sempre (TFFF), e estratégias para mobilização de recursos até 2030;
– A Declaração sobre Governança Global da Inteligência Artificial, que marca a entrada do Sul Global no debate regulatório internacional, destacando temas como acesso a dados, soberania digital e competição justa;
– A Parceria para a Eliminação de Doenças Socialmente Determinadas, que conecta desigualdade, pobreza e saúde em uma estratégia integrada, centrada na equidade e na justiça social.

O fortalecimento da OMS como autoridade multilateral em saúde, assim como a consolidação de redes próprias — como o Centro de P&D em Vacinas do BRICS e a Rede BRICS de Pesquisa em Tuberculose — refletem a estratégia do bloco de construir capacidades próprias de resposta global.

Cooperação financeira e tecnológica: do resseguro à soberania digital

Na frente financeira, a Declaração do Rio avança no debate sobre o uso de moedas locais no comércio intra-BRICS e a interoperabilidade entre os sistemas financeiros. Um novo projeto para a criação de uma Iniciativa de Garantias Multilaterais (GMB) e o desenvolvimento de soluções em resseguros foram lançados como prioridades para os próximos anos.

Na área de ciência, tecnologia e inovação (CTI), destaca-se o lançamento do Plano de Ação BRICS para Inovação 2025–2030 e a proposta de estabelecer uma rede de cabos submarinos de comunicação de alta velocidade entre os países do grupo, aumentando a autonomia digital e a segurança da informação.

Agricultura, fome e terras degradadas: aliança para justiça social e ambiental

Na área de desenvolvimento, o BRICS firmou o compromisso com a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza e lançou uma Parceria para a Restauração de Terras, integrando segurança alimentar, sustentabilidade ambiental e combate à exclusão. A agricultura, a pesca e a aquicultura aparecem como vetores estratégicos para erradicar a pobreza, fomentar o desenvolvimento rural e enfrentar a má nutrição.

Essas iniciativas complementam a proposta de desenvolvimento de capacidades produtivas próprias em setores-chave para o Sul Global, em meio à crescente incerteza nos mercados internacionais.

Participação social e fortalecimento institucional: BRICS se abre à sociedade civil

Pela primeira vez, a cúpula deu espaço formal ao Conselho Civil do BRICS, além dos fóruns tradicionais empresariais, sindicais, acadêmicos e parlamentares. O relatório entregue aos líderes e a integração progressiva de novos membros e países parceiros foram relatados como sinais de amadurecimento institucional. O documento destaca o esforço brasileiro em democratizar e descentralizar os processos decisórios do bloco, com mais de 200 reuniões técnicas envolvendo 30 ministérios e agências ao longo do ano.

O BRICS como vetor da nova ordem: entre ambição e urgência

A Declaração do Rio de Janeiro não é apenas um compêndio diplomático, mas uma plataforma estratégica do Sul Global para reformar a ordem mundial. Em tempos de crise climática, conflitos armados, fragmentação institucional e ameaças digitais, os BRICS apostam na construção de um novo multilateralismo, fundado na cooperação, na equidade e na soberania.

A presidência brasileira, que se estende até o fim de 2025, promete dar continuidade aos compromissos reforçados, consolidando o BRICS como um dos principais eixos da transição para um mundo multipolar. Num cenário de paralisia do Norte Global, o Sul assume uma frente.

Do Vermelho

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