Educação precisa mudar para incluir indígena
“Venham todos ao centro da aldeia, vamos nos reunir para brincar”. É em forma de canto na língua do seu povo que o escritor indígena Daniel Munduruku chama as crianças que assistem à sua palestra para conhecer o mundo dos indígenas brasileiros. Indígena, sim, que quer dizer aquele que nasceu em determinada região. Índio, não. “No Brasil, somos cerca de 315 povos, com culturas diferentes entre si. Não podemos ser rotulados apenas como índios, isso nos foi imposto pelos colonizadores e precisa mudar”, ensina o autor de 43 livros, doutorado em Educação pela USP (Universidade de São Paulo) e pós-doutorando em Literatura pela UFSCar (Universidade Federal de São Carlos).
Aos 15 anos, Daniel deixou sua aldeia, encravada na Floresta Amazônica em Belém do Pará, para se tornar professor. “Mas não deixei de ser munduruku”, garante. Ao longo da carreira que abraçou, ganhou diversos prêmios, entre eles o Jabuti e a menção honrosa do Prêmio Literatura para Crianças e Jovens na Questão da Tolerância, da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura).
Daniel critica a forma como as escolas educam para a questão indígena. “Os alunos ouvem a história contada pelos supostos vencedores, os colonizadores que vieram saquear o Brasil. Na verdade, a colonização é a história do grande roubo das riquezas do País.”
O especialista defende que a educação formal deve incluir os indígenas e os negros como formadores do povo brasileiro, assim como os portugueses e demais europeus que por aqui desembarcaram. “O papel do indígena é do resistente, e não do preguiçoso, selvagem.”
Na quarta-feira, Daniel esteve na Biblioteca Machado de Assis, no Riacho Grande, em São Bernardo, e falou sobre os costumes mundurukus para cerca de 30 alunos de 7 e 8 anos da Emeb Profª Suzete Aparecida de Campos. A palestra integrou a programação especial do Dia do Índio, comemorado hoje.
Ao se pintar com urucum tirado de bolsa de palha, deixou rostos surpresos na plateia mirim. E, no momento em que tirou da sacola o cocar de penas, provocou dúvidas nos estudantes. “É uma saia?”, chegou a perguntar um deles. Alguns disseram que era para colocar na cabeça, mas poucos souberam dizer que se tratava de um cocar. “A lei que obriga as escolas a incluírem a história afro-brasileira e indígena na grade curricular (11.645/08) é um passo importante. Mas o que precisa é mudar a consciência.”
Daniel acredita que é importante preservar a cultura de cada povo, mas entender que ela está viva e em movimento. “Se usamos roupas, computador, internet, celular, as pessoas acham que não somos mais indígenas. O que sou não muda, mas sim a forma como lido com o mundo.”
Ao escolher a escrita como caminho para espalhar o conhecimento transmitido a ele de forma oral, Daniel acredita na literatura como instrumento pedagógico. “Não é apenas a escola que ajuda a formar a criança. Cantar, dançar, ler, tudo isso faz parte do processo de aprendizagem.”
Ribeirão Pires recebe fórum sobre o tema
Ribeirão Pires sediará no dia 27, a partir das 14h, o 1º Fórum Nacional de História Indígena Arandú (Sabedoria Indígena, em tupi-guarani). O encontro será realizado no Castelo de Robson Miguel – Centro de Referências e Estudo da Cultura, Tradições, Literatura Indígena Brasileira e Medieval (Rua do Castelo, 310 – Quarta Divisão) e terá como tema central da discussão as trilhas indígenas do Peabirú. Interessados devem efetuar o pagamento da tava de manutenção no valor de R$ 10.
Estarão presentes memorialistas e historiadores que estudam a causa indígena na região e na Capital, tais como o museólogo e arquiteto Julio Abe; a diretora do Museu de Ribeirão Pires, Marlene Oliveira Spiandorelo; o presidente da Associação Pró-Memória da cidade, Américo Del Corto; e o historiador Arnaldo Boaventura, entre outros.
As mesas de debates, que se iniciam a partir das 14h40, abordarão temas como os povos indígenas ágrafos e suas nativas tecnologias da informação e localizações geográficas, a história de Padre Leonardo Nunes Abarebebé, João Ramalho, Bartira, Tibiriçá, Caiuby e Piqueroby e a história de Ribeirão Pires como sendo a possível antiga Vila de Santo André da Borda do Campo.
Cidades fazem programação para o Dia do Índio
Comemorado hoje em todo o Brasil, o Dia do Índio tem programação especial em Diadema e São Bernardo. A data comemorativa foi criada em 1943 pelo presidente Getúlio Vargas, por meio do decreto lei número 5.540.
O Jardim Botânico diademense realiza hoje, a partir das 19h, atividade de monitoria noturna e acampamento. A programação será baseada no dia do índio, com palestras de educação ambiental e sustentabilidade com resgate histórico da região.
A vivência em meio à natureza trará aos participantes a oportunidade de aprender sobre os hábitos de espécies noturnas do local. Após a monitoria, quem quiser pode montar as barracas para pernoitar na área verde.
São Bernardo realizou palestras ao longo da semana e faz no fim de semana visitas monitoradas para grupos de 40 pessoas às aldeias guarani tenondé porá Barragem, amanhã, e Krukutu, no domingo. O objetivo é conhecer um pouco mais da cultura desses povos que moram tão próximos à região.
Por Camila Galvez, do Diário do Grande ABC