Era para nunca mais ter acontecido
Faz 57 anos que não há nada a ser comemorado nos dias 31 de março no Brasil. Antes de mais qualquer coisa, porque a data é uma mentira. O que fez o 31 de março ser adotado como “celebração” pelas Forças Armadas — festa que, inclusive, deveria ser proibida, tamanha sua incompatibilidade com a democracia e com a Constituição — foi apenas a tentativa de fugir da piada pronta do 1° de abril, dia em que de fato, em 1964, aconteceu o golpe civil-militar que derrubou o presidente João Goulart e no qual tiveram início 21 anos de ditadura no país.
Mas não há motivo para comemorar, sobretudo, porque foi exatamente isso o que houve há 57 anos, que se completam amanhã: um GOLPE, e jamais, como pregam, uma revolução. E se os militares que continuam comemorando-o parecem não ter aprendido nada ao longo destas quase seis décadas, o forte braço civil que o apoiou também não, haja vista a responsabilidade de empresários e imprensa na derrubada da presidenta Dilma Rousseff em 2016 e na eleição de Jair Bolsonaro, um dos mais declarados entusiastas da ditadura, dois anos depois.
Jair Bolsonaro, este que declarou que o regime civil-militar matou pouco e decidiu que, ainda que de outra forma, mataria mais: 300 mil a mais (e contando.) Jair Bolsonaro, este que se coloca publicamente como admirador de torturadores e da tortura e que segue torturando o povo brasileiro, com seu descaso, sua omissão e sua política de extermínio, todos os dias. Jair Bolsonaro, cujo governo, ao mudar o sistema de registro de mortes por Covid-19, oculta os cadáveres de milhares de mortos pelas mãos do Estado brasileiro e sob sua conivência.
Muito tem se temido nos últimos dias a ameaça de um novo golpe de um novo estado de exceção. Golpe já houve e continua havendo, exatamente hoje. Estado de exceção já vivemos, exatamente agora. Denunciar e combater é nossa tarefa sempre.
Era para não ser esquecido. Era para nunca mais ter acontecido.
Por Táscia Souza