Escolaridade alta garante ocupação, mas não os melhores empregos, diz Dieese
Trabalhadores e trabalhadoras com ensino superior estão aceitando baixos salários, vagas que exigem menor escolaridade, trabalhar sem carteira assinada, ou mudar de profissão, virar pessoas jurídicas (PJs) ou autônomas para garantir uma renda no final do mês.
Esse é o reflexo da crise econômica e política, iniciada em 2014 e agravada em 2016, quando o ilegítimo e golpista Michel Temer (MDB-SP) usurpou o cargo da presidenta Dilma Rousseff.
Com a desculpa da crise econômica, muitos empregadores têm se ‘aproveitado’ para contratar pessoal mais qualificado para postos e funções que antes não exigiam escolaridade mais alta e salários mais baixos.
É o que aponta uma pesquisa do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos (Dieese), que analisou os dados coletados entre 2014 e 2017 pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) Contínua, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Os rendimentos médios dos ocupados com ensino superior, que ingressaram nesses postos de trabalho no período, caíram 9,7% – mais do que o dobro da média do mercado de trabalho brasileiro.
Segundo a Coordenadora de Pesquisa do Dieese, Patrícia Pelatieri , existe um entendimento de que aumentando o nível de escolaridade é bom para a economia, melhora a produtividade e as condições de vida e ocupacional do trabalhador. No entanto, não é isso que vem ocorrendo.
“Os trabalhadores estão fazendo a sua parte, que é aumentar o seu nível de escolaridade, mas a economia não está fazendo a parte dela que é a de produzir empregos para uma mão de obra mais qualificada. Os patrões estão se beneficiando com a qualificação do trabalhador, sem pagar mais por isso”, diz Patrícia.
O levantamento mostra ainda que o número de trabalhadores e trabalhadoras ocupados com ensino superior completo aumentou quase 2,2 milhões no período analisado, mas só uma pequena parte desse total conseguiu trabalho com uma ocupação ‘típica’, como profissional liberal ou em cargos de maior complexidade relacionados à gestão e direção. Apenas 132 mil se inseriram como diretores e gerentes e 678 mil como profissionais das ciências e intelectuais.
Do total de 2,2 milhões de trabalhadores com ensino superior completo que conseguiram ocupação entre 2014 e 2017, 1,3 milhão (62%) se inseriram em trabalhos que não demandam essa escolaridade.
Dos 810 mil com ensino superior que conseguiram trabalho em ocupações ‘típicas’, apenas 172 mil tiveram a carteira de trabalho assinada, enquanto 331 mil trabalham por conta própria e 145 mil como assalariados sem carteira, reforçando o cenário geral de precarização das relações de trabalho.
Mais do que dobra número de motoristas, vendedores e serviços de limpeza com ensino superior
O número de pessoas com ensino superior mais do que dobrou em algumas das ocupações “não típicas” para essa escolaridade.
A quantidade de condutores de automóveis, táxis e caminhonetes com ensino superior completo também cresceu bastante entre 2014 e 2017: foi de 47 mil para mais de 105 mil, um aumento de 125%, no período.
Entre os vendedores em domicílio, os ocupados com ensino superior aumentaram 187%, passando de 49,2 mil para 141,2 mi – crescimento de 92 mil.
Os cargos de profissionais de enfermagem de nível médio estão sendo ocupados por trabalhadores com nível superior. Em 2014 e 2017, subiu de 10% para 13%, o que significa quase 61 mil pessoas a mais.
Também cresceu muito o número de trabalhadores com ensino superior nos serviços de limpeza de edifícios/escritórios/hotéis: 117% (35 mil pessoas a mais).
Cai número de trabalhadores ocupados com ensino médio e fundamental
O total de ocupados com até o ensino fundamental completo diminuiu 4,8 milhões. Os de ensino médio incompleto ou completo, também caíram em pouco mais de 1,5 milhão.
Para o técnico do Dieese subseção CUT/Brasília, Alexandre Ferraz, o aumento de trabalhadores e trabalhadoras com ensino superior ocupando funções que exigem o nível médio, tem dois efeitos dramáticos: 1) expulsa uma parcela mais vulnerável do mercado de trabalho; e, 2) é um desincentivo à formação, uma das marcas do golpe de 2016.
“Enquanto não tiver estabilidade política no país, não há perspectiva de melhora. O problema da economia é político”, avalia o técnico do Dieese.