Grupos extremistas se espalham pelas redes e desafiam a ausência de regulação

Dark web e Discord: Dois caminhos para a propagação da violência na internet

Mais de 20 grupos de extrema direita atuam no Brasil, com forte presença nas redes sociais. Boa parte deles espalhou discurso de ódio, desinformação e incita à violência sem qualquer controle das plataformas. O alerta vem de um estudo do Projeto Global Contra o Ódio e o Extremismo (GPAHE), organização internacional de direitos humanos.

O levantamento de parcerias que essas organizações têm perfis ativos no Facebook, X (ex-Twitter), YouTube e Telegram. O estudo também demonstrou que a ausência de regulação e o alto consumo de internet no Brasil fez com que o país num terreno fértil para a radicalização.

Entre os alvos mais frequentes estão mulheres e a população LGBTQIA+. A Força Nacionalista Brasileira (FNB), por exemplo, publicou no X que mulheres a favor do aborto são “cúmplices do morticínio de bebês”. Já o grupo Falanges de Aço, defensor da separação da Região Sul, divulgou mensagens racistas e xenofóbicas contra nordestinos. O Instituto Conservador-Liberal, fundado por Eduardo Bolsonaro (PL), e o próprio PL aparecem no relatório por divulgar conteúdos LGBTfóbicos e religiosos extremistas.

Os números

As denúncias de crimes cibernéticos diminuíram 33% no Brasil em 2024. A ONG SaferNet recebeu 100.077 novos registros — 50.770 a menos que no ano anterior.

Do total, 52.999 envolveram imagens de abuso e exploração sexual infantil. Ainda que o número represente uma queda de 26% em relação a 2023, o presidente da organização, Thiago Tavares, alerta: o volume continua alto. É o quarto maior da série iniciada em 2006.

Tavares vê a redução nas denúncias com cautela. Para ele, isso não indica menor ocorrência dos crimes. O que mudou foi como os conteúdos circulam. “Hoje, eles aparecem menos na internet aberta e migraram para grupos fechados em aplicativos de mensagens. E nesses espaços, quem acessa dificilmente denuncia”, explicou.

Em 2024, as denúncias de crimes de ódio caíram 49% no Brasil. A SaferNet registrou 14.108 casos únicos ligados a racismo, intolerância religiosa, xenofobia, neonazismo, LGBTfobia, misoginia e crimes contra a vida.

Foi a primeira vez, desde 2018, que uma eleição coincidiu com a queda nesse tipo de registro. O presidente da ONG, Thiago Tavares, atribuiu a proteção ao caráter das disputas municipais.

Numa entrevista à Agência Brasil, explicou: “Nas eleições gerais, como nas de presidente e Congresso, os ataques se intensificam. Já nas municipais, os episódios se espalharam de forma localizada, principalmente em grupos de WhatsApp, o que reduz o volume de denúncias”.

Os principais caminhos de disseminação da violência e do discurso de ódio na internet

Dark Web

Longe dos mecanismos de busca intencionalmente, a Dark Web abriga conteúdos ilegais e atividades criminosas. Para acessá-la, é necessário utilizar softwares específicos que garantam anonimato e dificultem rastreamentos.

Diferente da internet comum — chamada de Clear Web —, essa camada oculta da rede concentrada desde fóruns de hackers até mercados ilegais de drogas, armas e documentos falsos. Também circularam conteúdos perturbadores, como pornografia infantil, tortura e homicídios.

A estrutura criptografada impede a identificação dos usuários e dificulta as investigações. O caráter sigiloso da Dark Web se transformou em um refúgio para crimes digitais, o que tem mobilizado autoridades em diversos países. Os governos buscam estratégias para conter o uso desse espaço como ferramenta para práticas ilícitas.

Discórdia

Criado em 2015 pelo americano Jason Citron, o Discord nasceu como uma alternativa aos sistemas falhos de comunicação entre jogadores de videogame. Desenvolvido com foco em acessibilidade e estabilidade, o serviço oferece chamadas de voz e texto com qualidade superior, além de permitir a criação de servidores e canais temáticos. A proposta caiu no gosto do público gamer e, em pouco tempo, a plataforma virou referência.

De lá pra cá, o Discord ampliou suas funções e passou a reunir milhões de usuários em comunidades variadas — não apenas ligados ao universo dos jogos. Com isso, também cresceu a preocupação com os riscos do ambiente virtual.

Casos de violência extrema, como o ataque terrorista em Christchurch, na Nova Zelândia, em 2019, lançaram o alerta. Os comentários usaram o Discord para detalhar o plano antes de transmitir o massacre ao vivo. Desde então, uma empresa diz que intensificou o combate ao discurso de ódio, banindo grupos extremistas e reforçando a moderação.

Além disso, há relatos do uso do Discord como ferramenta para intimidação em jogos online. Os jogadores se organizam para hostilizar rivais, minando o espírito de competição saudável. Isso leva a consequências graves para os adolescentes, como ansiedade, depressão, distúrbios do sono e queda na autoestima.

Regular é preciso

Além de uma atuação em conjunto entre a sociedade e as empresas de tecnologia, é necessário, a regulamentação, por parte do governo federal, das redes sociais. Essa regulamentação fortalece a democracia, combate o discurso de ódio e garante um ambiente digital seguro. Para o senador Paulo Paim (PT-RS), em depoimento ao site do Senado, controlar o espaço virtual é um passo decisivo para preservar os direitos humanos.

Paim defende regras claras e eficazes para responsabilizar as plataformas digitais. “Liberdade de expressão não é espalhar notícias falsas, ofensas ou ameaças. Isso é estratégia de quem ataca a democracia”, alertou. Ele também ressaltou que o Brasil precisa garantir a soberania e promover um ambiente digital inclusivo.

O governo Lula finaliza um projeto de lei que muda o foco da regulação das plataformas digitais: em vez do combate às notícias falsas, o texto agora prioriza a proteção de crianças e adolescentes. A proposta prevê avaliações para redes sociais que não cumpram medidas básicas de segurança, como a remoção de conteúdos ilegais.

Em casos graves e reincidentes, o texto autoriza, como última medida, a retirada do ar de plataformas que descumprirem determinações da Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD), que será responsável pela fiscalização.

A versão atual do projeto foi definida em reunião no Palácio do Planalto, em 22 último, com a presença de nove ministros, entre eles Ricardo Lewandowski (Justiça), Sidônio Palmeira (Comunicação Social), Rui Costa (Casa Civil), Gleisi Hoffmann (Articulação Política) e Jorge Messias (AGU).

O ponto ainda em debate é o procedimento legal para retirar plataformas do ar. O Ministério da Justiça defende que a Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD) tenha poder para aplicar a sanção, observando o devido processo legal. Já a Secretaria de Comunicação Social considera que a medida deve passar obrigatoriamente pelo Judiciário, mas aprovar a necessidade de mecanismos para agilizar essas decisões. O texto segue sob análise do Ministério da Justiça e será encaminhado ao Planalto e, antes de chegar ao Congresso, passará pela Casa Civil.

Da CUT

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