Juízes chamam PL de inconstitucional e pedem ‘dignidade do trabalhador’
Brasília – Ao participar de uma audiência pública no Senado Federal que teve o objetivo de discutir o Projeto de Lei (PL) 4.330, da regulamentação da terceirização, o presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), ministro Barros Levenhagen, disse que o momento é delicado e que espera que os senadores atuem com equilíbrio ao receberem a matéria da Câmara dos Deputados – onde está prevista para ser votada amanhã (14). Levenhagen afirmou que é preciso verificar se o texto não resultará em precarização e levar em conta o artigo 1º da Constituição Federal, que destaca os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa no mesmo patamar como fundamentos da República.
Segundo deixou claro o presidente da mais alta corte da Justiça trabalhista, o inciso IV do artigo 1º da Constituição Federal coloca os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa no mesmo patamar como fundamentos da República. “Não se pode pensar num Brasil grande, com melhor distribuição de renda, sem a garantia da dignidade do trabalhador, da mesma forma que não se pode pensar no empregado sem valorizar a empresa”, ressaltou.
Barros Levenhagen, que já havia se posicionado anteriormente assinando um documento que criticava a terceirização das atividades-fim, disse que falava na audiência muito mais como cidadão do que como magistrado. E, sendo assim, não consegue entender “que a garantia da produtividade implique subtrair direitos dos trabalhadores”.
Ele enfatizou, ainda, que confia no Senado para, como casa revisora, fazer um debate menos acalorado sobre o tema, acalmar as tensões hoje existentes e evitar a precarização excessiva. O debate do ministro foi feito em meio a vários juízes trabalhistas, procuradores do Ministério Público do Trabalho e representantes de centrais sindicais e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Sem protecionismos
O presidente do TST também afirmou que, aproveitando para esclarecer mal entendidos, existe uma ideia equivocada de que a Justiça do Trabalho seja protecionista, pois, na verdade, o que os tribunais fazem é aplicar uma legislação que tenta equilibrar as forças, “dando superioridade jurídica ao trabalhador, frente à superioridade econômica da empresa”, conforme acentuou. E acrescentou que enquanto não for sancionada uma lei sobre a regulamentação da terceirização, o TST continuará decidindo com base na sua Súmula 331, que proíbe a terceirização na atividade-fim.
Levenhagen lembrou que a súmula 256 – a primeira a tratar do tema no âmbito do tribunal – foi construída pelo TST com o intuito de conter o que chamou de “terceirização predatória” que estava em curso no país na época (1993) – tendo sido depois substituída pela súmula 331 (em 2003).
No tocante ao texto do PL 4.330 em si, o presidente do tribunal sugeriu, como modificações a serem feitas, o estabelecimento de um percentual máximo para a contratação de terceirizados e a adoção de mecanismos que possam garantir isonomia entre empregados efetivos e prestadores de serviços, observando-se as convenções coletivas de trabalho da categoria principal do tomador de serviços. Sugeriu ainda, dentro destes percentuais, que fiquem em torno de 30% os prestadores de serviços terceirizados por cada empresa. E também que os vencimentos dos terceirizados nunca sejam inferiores a 80% dos salários dos empregados diretos.
‘Mais tempo’
A fala do presidente do TST deixou animados vários parlamentares que são contrários ao projeto atual. Principalmente o presidente da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado, senador Paulo Paim (PT-RS), que disse ter conversado com o presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), sobre o assunto. Conforme contou Paim, Renan Calheiros garantiu que, ao chegar no Senado, o projeto terá mais tempo para discussão. “Não deixaremos que aconteça, nesta Casa, uma discussão atabalhoada como sendo observado na Câmara”, criticou.
Durante a audiência, o presidente da Comissão de Trabalho da OAB, Dino Andrade, também se manifestou afirmando que o PL 4.330 prejudicará os trabalhadores por não obrigar as empresas a cumprir direitos básicos como o atendimento médico, ambulatorial ou de refeição aos seus empregados.
Quantidade, não qualidade
Outro ponto que chamou a atenção no debate foi a crítica do presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), Carlos Azevedo Lima, sobre o projeto a ser votado na Câmara. De acordo com Lima, o PL 4.330 pode levar ao aumento de casos de corrupção no país, pois poderá fazer com que aumente o número de indicações políticas nestas vagas de terceirização.
A juíza trabalhista Noêmia Aparecida Oliveira, por sua vez, acentuou que com o avanço da terceirização a perspectiva futura para os empregados por meio desta prática tende a ser de baixos salários, aumento de acidentes de trabalho e o fim do direito de férias para esses trabalhadores. Ao abordar a terceirização na atividade-fim e o argumento que tem sido apresentado por empresários no sentido de que dessa forma será possível gerar mais empregos, a magistrada disse que o que está em jogo “não é o número de empregos, mas a qualidade do emprego no país”.
Já o procurador do Ministério Público do Trabalho (MPT) Helder Amorim afirmou que a terceirização na atividade-fim é inconstitucional porque atinge direitos fundamentais como o direito à greve, acordos e convenções coletivas, reduz a remuneração dos trabalhadores e as contribuições para a Previdência.