Onde professor é criminoso, coloca-se a polícia no comando do Inep
Pode-se considerar no mínimo curioso — e isso é um eufemismo — que os dois fatos tenham ocorrido no mesmo dia, esta segunda-feira, 15 de abril: o primeiro, a detenção da professora Camila Marques pela Polícia Civil no campus de Águas Lindas do Instituto Federal de Goiás (IFG); o segundo, a nomeação do delegado da Polícia Federal Elmer Coelho Vicenzi para a Presidência do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Os dois casos não estão diretamente relacionados, ao menos a priori, mas são ambos sintomáticos no sentido de que, como observa o coordenador-geral da Contee, Gilson Reis, “estão criminalizando a educação”. É “a educação atrás das grades”.
Segundo a Revista Fórum (https://www.revistaforum.com.br/professora-e-detidaa-pos-policia-invadir-campus-do-instituto-federal-de-goias/), Camila Marques, que é coordenadora-geral do Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica (Sinasefe), foi detida ao impedir os policiais de entrarem em sua sala de aula “para interrogar alunos que teriam feito denúncias sobre supostas ameaças recebidas por eles”. Ao se contrapor à polícia, ela, que já vinha sofrendo perseguição por “doutrinação política”, foi levada à delegacia e autuada por desacato.
Dentro de uma sala de aula num instituto federal, a presença, à força, da Polícia Civil parece um corpo tão estranho quanto um delegado da PF no comando do Inep, órgão federal criado em 1937, vinculado ao Ministério da Educação (MEC), com o objetivo de promover estudos, pesquisas e avaliações periódicas sobre o sistema educacional brasileiro, a fim de subsidiar a formulação e implementação de políticas públicas para a área educacional. Vale lembrar que o instituto é responsável pelo Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), ameaçado desde o encerramento das operações da gráfica contratada para a impressão das provas; ou desde o pedido de demissão de Paulo César Teixeira, ex-coordenador do exame; ou desde que, pela primeira vez em 22 anos, o governo anunciou que avaliará antes as questões a serem aplicadas, para evitar — ela de novo — a “doutrinação”.
Há que se pensar: o que um delegado, especialista em direito penal, ex-professor da Academia Nacional de Polícia e ex-diretor do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) fará à frente do Inep? Num Estado em que os professores são tratados como inimigos — e, mais gravemente — como criminosos — colocar a polícia do comando parece um ato bastante simbólico. E funesto.
Por Táscia Souza