Orçamento para mulheres tem queda em 2021
Segundo dados apresentados em reunião na Câmara, proposta para o próximo ano é 19% menor ao proposto para 2020
A proposta de orçamento para 2021 da Secretaria Nacional de Políticas para Mulheres, vinculada ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, é 19% menor em relação ao proposto inicialmente para 2020. O dado foi apresentado em reunião do grupo técnico Mulher e Economia da Secretaria da Mulher da Câmara na última sexta-feira (25).
A consultora legislativa Júlia Rodrigues disse que, neste ano, as ações relacionadas às mulheres na secretaria do governo têm uma contratação de 56% até agora, mas a ação específica de enfrentamento à violência contra a mulher teve um empenho de apenas 9%. Essa ação não consta da proposta para 2021.
Os números refletem o orçamento autorizado para a secretaria para 2020, que foi suplementado por emendas parlamentares. Júlia Rodrigues explicou que boa parte das ações deverá ter mais recursos em 2021 justamente por causa das emendas.
“Tirando o Disque 180, praticamente tudo o que está sendo executado é fruto de emendas parlamentares, seja de emenda individual, emenda de bancada estadual ou emenda de relator”, explicou.
No caso da ação relacionada às Casas da Mulher Brasileira, que são centros de acolhimento de mulheres vítimas de violência, a queda nos recursos para 2021 é de 45%.
A coordenadora do grupo, deputada Alice Portugal (PCdoB-BA), disse esperar que a ministra Damares Alves explique por que não usou os recursos aprovados pelo Congresso Nacional no combate à violência contra a mulher durante a pandemia.
“R$ 45 milhões lhe foram disponibilizados. Ela usou apenas R$ 11,3 milhões. E é sabido que a violência contra a mulher cresceu na pandemia. Em São Paulo dobrou o número de feminicídios. No Disque 180 dobrou também a quantidade de denúncias.”
Estratégia
Questionada, a secretária nacional de Políticas para as Mulheres, Cristiane Britto, disse que existe uma estratégia de contar com o apoio das emendas para 2021. Em relação a este ano, ela explicou que parte do dinheiro só foi disponibilizada em maio; além disso, ela aponta dificuldades dos municípios em tomar o dinheiro.
“Às vezes, os recursos serão executados por meio de convênios e as instituições e os entes públicos, o município por exemplo, que vai de fato realizar o projeto, pode ter uma pendência fiscal que o impede de receber o recurso naquele momento. Isso atrasa e exige um pouco mais de tempo”, exemplificou.
A deputada Alê Silva (PSL-MG) complementou a justificativa, ressaltando que o momento é de crise fiscal.
“Temos que lembrar que o país se encontra numa crise orçamentária em razão do novo coronavírus e vários valores do nosso orçamento tiveram que ser remanejados para ações prioritárias. Não que o combate à violência não seja uma ação prioritária. Mas com certeza o que ficou de orçamento no ministério é o necessário e atende as demandas da classe feminina no combate à violência”.
Ações genéricas
Ainda na reunião do grupo da Secretaria da Mulher, Carolina Tokarski, especialista em políticas públicas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), disse que o orçamento efetivamente gasto da Secretaria Nacional de Políticas para Mulheres subiu entre 2003 e 2013, mas, em seguida, caiu de maneira contínua. Ela afirma ainda que as ações são genéricas, difíceis de fiscalizar. A especialista defende a confecção de um orçamento onde todas as ações, e não apenas as do ministério específico, tenham um olhar para a desigualdade de gênero.
“Quando a gente decide alocar menos recursos na construção de creches, é evidente que o impacto será maior sobre as mulheres porque são elas que historicamente se responsabilizam pelo cuidado com as crianças. Outro exemplo já trazido aqui é do teto de gastos. A gente tem uma redução dos recursos para a saúde e manda as pessoas de volta pra casa. Quem vai cuidar dessas pessoas dentro de casa?”
Recursos x trabalho
A pesquisadora Margarita Olivera, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), disse que a Argentina está tendo essa preocupação agora e até buscou medir o trabalho não-remunerado das mulheres — basicamente, os cuidados com a casa e os familiares. Cálculos preliminares mostram que isso pode atingir 16% do PIB e que, na pandemia, teria subido 5 pontos.