Pejotização em debate: Julgamento no STF pode fragilizar direitos trabalhistas

O ministro Gilmar Mendes, em decisão proferida no dia 14/04, suspendeu nacionalmente todos os processos que tratam da legalidade da contratação de trabalhadores autônomos ou por meio de pessoas jurídicas (pejotização). A medida foi tomada com a argumentação de sobrecarga no Supremo Tribunal Federal (STF) causada pelo grande número de reclamações contra decisões da Justiça do Trabalho que, em diferentes instâncias, deixam de aplicar o entendimento já consolidado pela Corte sobre o tema.
A suspensão está vinculada ao julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo 1532603, no qual o Plenário reconheceu a repercussão geral da matéria, registrada como Tema 1389. O caso envolve não apenas a validade desses contratos, mas também a competência da Justiça do Trabalho para julgar ações que questionam a existência de fraude e a definição de quem deve arcar com o ônus da prova: o trabalhador ou o contratante.
Com esse reconhecimento, a futura decisão de mérito do STF deverá ser observada por todos os tribunais ao julgarem casos semelhantes. A suspensão dos processos seguirá válida até que o mérito do recurso seja julgado.
O julgamento do Tema 1389 é considerado decisivo, pois definirá três pontos fundamentais:
- Se é legal contratar trabalhadores como PJs/autônomos, independentemente da existência de vínculo empregatício;
- Se é a Justiça do Trabalho o foro competente para julgar essas ações;
- Se a responsabilidade de comprovar a fraude contratual é do trabalhador ou da empresa contratante.
Essa discussão tem impacto direto sobre milhares de trabalhadores, inclusive os profissionais da educação contratados para atuar em cursos livres, ensino universitário, ensino técnico, educação a distância, consultorias e projetos temporários. É crescente o uso de contratos via MEI ou PJ por instituições educacionais com o objetivo de driblar encargos trabalhistas e flexibilizar obrigações legais — prática que, embora vantajosa para os empregadores, acarreta insegurança jurídica e precarização das relações de trabalho.
Em matéria publicada no jornal GGN, com o título “A bomba de nêutron contra a CLT”, o jornalista Luís Nassif alerta para o desmonte silencioso dos direitos trabalhistas, especialmente em setores historicamente precarizados. Segundo ele, se o STF reconhecer a legalidade irrestrita da pejotização, isso poderá colocar os contratos formais acima dos princípios constitucionais que asseguram a dignidade da pessoa trabalhadora, legitimando fraudes e reduzindo a proteção social. Nassif adverte ainda que a pejotização pode se espalhar por toda a economia, impulsionando uma corrida predatória por cortes de direitos em nome da competitividade: “mesmo empresas que decidam preservar o direito ao trabalho terão que aderir, para não serem engolidas pelos concorrentes”. Ele conclui que esse movimento, se consolidado, “inviabilizará definitivamente a Previdência Social e derrubará a arrecadação do Imposto de Renda”.
O julgamento do Tema 1389 vai além de uma disputa jurídica: trata-se de um embate sobre o modelo de sociedade e de trabalho que queremos para o presente e o futuro do país. Em um cenário de reformas regressivas e crescente desvalorização do trabalho, é fundamental que o movimento sindical permaneça vigilante, mantendo os trabalhadores informados e mobilizados.
Por Antônia Rangel