Pesquisa Ipec entrega a Lula boas notícias – e um importante recado

Base popular de Lula – aquela que simpatiza mais com o presidente – segue confiando no sucesso da administração e lhe garantindo uma aprovação razoável

André Cintra

Há uma boutade segundo a qual “a estatística é a arte de torturar os números até que eles confessem”. O pior, segundo o professor Abraham Laredo Sicsú, da FGV, é que “eles sempre confessam”.

Os números da segunda pesquisa Ipec sobre o governo Lula, divulgados nesta terça-feira (11), permitem a profusão de leituras. Passados cem dias do início da gestão, o presidente é aprovado por 39% dos brasileiros. Para eles, a administração, até aqui, está “ótima” ou “boa”.

No outro extremo, 29% dos entrevistados julgam o governo Lula como “ruim” ou “péssimo”. É o que chamamos de rejeição – um dos indicadores mais temidos por governantes e homens da política em geral. Outros 30% qualificam a gestão como “regular”.

No início de março, Lula tinha dois pontos percentuais a mais de aprovação e dois pontos a menos de reprovação. As duas oscilações, embora numericamente desfavoráveis ao presidente, ocorreram dentro da margem de erro.

Parte da oposição divulgou que a rejeição a Lula cresceu – um dado rigorosamente falso em termos estatísticos. Já a base do governo frisou que os números de Lula a esta altura do mandato são melhores que os do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em período similar do mandato.

A disputa de versões e narrativas é parte do teatro da política. Mas pesquisas de opinião – as de confiança, claro – apontam tendências que, se bem contextualizadas, vão além de qualquer jogo de cena.

No geral, a pesquisa Ipec confirma um cenário já captado, no final de março, em levantamento do Datafolha. Mesmo que já tenha entregado 250 realizações em cem dias – com destaque para a retomada de programas como o Bolsa Família, o Minha Casa, Minha Vida e o Mais Médicos –, o governo não está imune à polarização, ainda elevada, da sociedade brasileira.

Essa divisão arrefeceu ligeiramente desde as eleições presidenciais, mas segue marcante. Em dezembro passado, pesquisa Datafolha usou duas categorias genéricas e até imprecisas – “petistas” e “bolsonaristas” – para medir quão polarizado estava o eleitorado. Na ocasião, 32% se declararam “petistas” e 25% se diziam “bolsonaristas”. Agora, as taxas caíram, respectivamente, para 30% e 22%.

Há muitos apoiadores de Lula que não se veem como petistas, assim como existem eleitores conservadores, de direita, que não se apresentam como “bolsonaristas”. Feita essa ressalva – que não é secundária –, temos um dado relevante nos resultados do Datafolha: pouco mais da metade do eleitorado (52%) se identifica hoje com um desses polos políticos.

Não é pouco, e a imagem do governo junto aos brasileiros está circunscrita a essa realidade. A reprovação atual, na faixa de 29%, não é a ideal para governo nenhum, mas tampouco indica perda de apoio para Lula. Ao que tudo indica, para baixar a rejeição a patamares inferiores a 20%, o presidente precisará não apenas de uma gestão indubitavelmente diferenciada – mas também de tempo.

Este é o mais importante “recado” da pesquisa: a resistência ao governo não chegou sequer a 30% apesar das restrições orçamentárias e políticas, apesar da cobertura majoritariamente negativa por parte da grande mídia, apesar da oposição golpista e apesar da persistência das fake news contra Lula, a esquerda e a própria gestão.

No campo das boas notícias, uma sobressai: a base popular de Lula – aquela que simpatiza mais com o presidente – segue confiando no sucesso da administração e lhe garantindo uma aprovação razoável. Lula não teve a tradicional lua de mel que é conferida a governos em início de mandato, mas “atravessou o deserto” e começa a pôr as vitrines do governo de pé.

É preciso sublinhar que a pesquisa foi feita antes de eventos como a celebração dos cem dias de governo, antes de anúncios como os esperados na viagem de Lula a China e antes da consolidação da política macroeconômica com qual o presidente promete entregar mais avanços e crescimento. A popularidade será testada à medida que indicadores sociais e econômicos mudarem – para melhor ou para pior.

Se a marca dos cem dias é o ponto de partida para um balanço inicial, Lula está bem aos olhos dos brasileiros, mas sem gordura para queimar. Com a recriação de programas sociais bem-sucedidos e medidas como a valorização do salário mínimo, o presidente mantém apoio maior entre moradores da região Nordeste (55%) e aqueles com renda familiar de até um salário mínimo (53%). O desafio é ampliar.

O Ipec ouviu 2 mil eleitores, em 128 municípios de todas as regiões do País, entre os dias 1º e 5 de abril. A margem de erro é de dois pontos percentuais.

Vermelho

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