São Paulo fora do PNLD: por que isso implica privatização da educação?
Secretário de Educação do estado foi aspirante a ministro de Bolsonaro e é ligado a plataformas e institutos e fundações privadas
Em meados de 2020, quando Abraham Weintraub finalmente deixou o posto de ministro da Educação e bem antes da nomeação de Milton Ribeiro, um dos nomes que chegaram a ser contados para o comando do MEC foi o de Renato Feder, então secretário estadual de Educação do Paraná. Foi a ele, inclusive, que Jair Bolsonaro (PL) chegou a “pedir em namoro”, segundo o próprio vocabulário técnico do ex-presidente, embora o flerte, na ocasião, não tenha dado certo.
O Portal Contee citou Feder na matéria “Os últimos espólios de Weintraub e os interesses em disputa”, publicada no dia 23 de junho de 2020, a qual tratava da briga entre olavistas, Centrão e militares pelo Ministério da Educação. No texto, a Contee lembrava que Feder é coautor do livro “Carregando o elefante: como transformar o Brasil no país mais rico do mundo,”, que defende um modelo de distribuição de vouchers e privatização da educação pública.
“Embora Feder tenha alegado, tão logo viu-se cotado para o Ministério da Educação, que não sustenta mais tais propostas, que passavam até pela extinção do próprio MEC, fato é que já a sustentou. Portanto, mantendo-a ou não, descortina-se outra gestão liberal à vista”, apontava a Confederação.
Medida privatista
É justamente uma gestão ultraliberal e privatista que Renato Feder, agora secretário estadual de Educação de São Paulo, e Tarcísio de Freitas (Republicanos), governador bolsonarista, propõem com o anúncio de que o estado não vai aderir plenamente ao PNLD (Programa Nacional do Livro Didático) e que em vez disso, substituirá os livros impressos por material próprio e 100% digital.
Por trás da decisão, como destaca a coordenadora da Secretaria-Geral da Contee, Madalena Guasco Peixoto, está “a ligação do secretário com plataformas e institutos e fundações privadas”. Conforme veiculado pela imprensa, o ex-aspirante de ministro de Bolsonaro, é dono da empresa Multilaser, na qual há, justamente, uma linha completa de equipamentos para informática.
A empresa dele, contudo, não é a única interessada. Pelo menos desde 2016, com o livro “O capital global na educação brasileira’’, organizado por Madalena e lançado pela Contee e pela editora Anita Garibaldi, a Confederação denuncia que, embora mais acintosos no ensino superior, os processos de privatização do ensino invadem cada vez mais, por caminhos tortuosos, também a educação básica.
Esses processos se dão, inclusive, através de parcerias entre prefeituras, governos estaduais e grandes conglomerados editoriais — e, agora plataformas digitais — que passam a responder pelo material didático e até por suposta ‘‘capacitação’’ profissional, que nada mais faz do que retirar a autonomia pedagógica do magistério e atacar a educação naquilo que ela tem de mais caro: o papel de auxiliar na formação cidadã e no desenvolvimento soberano do Brasil. Não por acaso, o veto a livros didáticos vem acompanhado de determinação para “monitoramento” — que na verdade é espionagem — de professores.
Desperdício
A absurda decisão de Tarcísio e Feder, segundo Madalena, representa também um grande desperdício de dinheiro público, já que o PNLD é uma política federal que envia gratuitamente às escolas municipais e estaduais os livros do catálogo escolhidos pelos professores. E São Paulo ficará de fora.
Além disso, mesmo com a promessa de distribuição de computadores, dificilmente executável de forma a dar conta de dirimir as profundas desigualdades sociais e educacionais — algo que a experiência do ensino remoto durante a pandemia de covid-19 já mostrou —, a medida revela, nas palavras da diretora da Contee, “falta total de conhecimento da rede pública e das necessidades reais dos alunos e professores”.
“Países como Suécia e França — que possuem escolas equipadas e também acesso quase universal à internet — haviam decidido abolir o livro didático e utilizar plataformas, mas estão voltando atrás devido aos problemas que enfrentaram”, destaca Madalena. “Inclusive com um retrocesso na capacidade de leitura dos estudantes.”
Táscia Souza