SinproABC: Grupo Educacional Metodista, a visão míope de uma recuperação judicial
Por Rodrigo Valente
“o momento de pagar essa conta vai chegar, e o principal papel até então exercido pelos sindicatos é o de garantir que tais créditos sejam pagos, sem que se estabeleça o iminente calote, considerando que as próprias associações educacionais confessam que não dispõem de patrimônio para pagamento do imenso volume de credores, estando a depender do auxílio financeiro das Igrejas Metodistas.”
Tenho dedicado considerável tempo ao processo de recuperação judicial da intitulada Educação Metodista. Particularmente, seguindo a linha de responsabilização solidária imposta pela Justiça do Trabalho, prefiro chamar de Grupo Educacional Metodista.
Assessorando Sindicatos de Professores, a pergunta que mais tenho recebido por parte dos docentes é: a recuperação judicial é um bom negócio?
Sim! Não há dúvidas que sim! O objetivo de toda recuperação judicial é viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, preservando a empresa através de um plano de pagamentos que possa manter vivos a geração de riqueza e de trabalho.
O plano de pagamentos, mais conhecido como plano de recuperação judicial, é sem sombra de dúvidas a bússola norteadora do bom êxito da recuperação, mas pode conter armadilhas recônditas as quais, se não descortinadas, podem representar um alto preço para os credores.
O processo de recuperação judicial do Grupo Educacional Metodista encontra-se suspenso por força de determinação exarada pela Desembargadora Isabel Dias Almeida, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Para as associações educacionais devedoras, essa paralisação representa uma ótima oportunidade para angariar votos favoráveis ao plano, mais precisamente daqueles “desavisados” que não conseguem enxergar além dos panos do teatro, que divide o palco e seus bastidores.
Um dos mais importantes efeitos da recuperação judicial é a suspensão de todas as ações e execuções contra os devedores, que (a) não mais estão sujeitos a qualquer tipo ou espécie de penhora ou constrição (bloqueio) de seus bens; (b) encontra-se liberado das travas bancárias (bloqueios das receitas em conta) para garantir o pagamento dos vultosos empréstimos tomados junto às instituições financeiras; e, por fim, (c) os devedores não possuem a obrigação de pagar qualquer dívida, as quais somente passam a ser exigíveis nos moldes propostos no plano que vier a ser aprovado.
No caso específico do Grupo Educacional Metodista, a proposta para pagamento dos créditos trabalhistas, de natureza alimentar (que representa mais de 60% de todo o passivo) é a de que se faça em até 36 meses (3 anos); outras chegam até 120 meses (10 anos).
Por óbvio, a suspensão do processo favorece os devedores, que ganham ainda mais tempo com todas essas benesses, especialmente quando o montante que se deve na praça pode ser estimado em mais de R$1 bilhão, sem considerar o crédito tributário, que igualmente beira o mesmo patamar.
Ocorre que o momento de pagar essa conta vai chegar, e o principal papel até então exercido pelos sindicatos é o de garantir que tais créditos sejam pagos, sem que se estabeleça o iminente calote, considerando que as próprias associações educacionais confessam que não dispõem de patrimônio para pagamento do imenso volume de credores, estando a depender do auxílio financeiro das Igrejas Metodistas.
A garantia de pagamento dos débitos, especialmente os trabalhistas, passa, necessariamente, pela assunção (compromisso) de responsabilidade por parte das Igrejas Metodistas, que ostentam um patrimônio estratosférico, o que, aliás, já era de sua incumbência na condição de mantenedoras das associações educacionais, conforme as reiteradas decisões tomadas no âmbito da Justiça do Trabalho.
Não obstante, é exatamente essa responsabilidade das Igrejas Metodistas que o plano de recuperação judicial, sistematicamente, tenta excluir, através de procedimentos jurídicos estratégicos que, em última análise, retiram qualquer espécie de responsabilização patrimonial das igrejas, e é exatamente esse movimento ardiloso que causa perplexidade e fundadas dúvidas quanto ao efetivo pagamento do passivo – mais precisamente o trabalhista.
Isso porque, uma vez aprovado, da forma como se encontra, o plano nunca será descumprido nos dois anos que se seguirem à sua provação, já que a proposta dos devedores estabelece que os pagamentos somente seriam exigíveis por parte dos credores a partir de trinta e seis meses. Como consequência, uma vez ultrapassado o prazo de dois anos, o juízo encerrará a recuperação judicial, por sentença, e o plano está definitivamente consolidado sem qualquer tipo de responsabilização futura das igrejas; se não cumprido o plano, restará aos credores apenas buscar o recebimento de seus créditos, já assolapados pelos deságios, mediante execução de título judicial, insista-se, sem a garantia de recebimento.
Não se iluda! O salário que hoje é pago convenientemente em dia, beneficiados pelas suspensões dos processos, com todo o respeito, tem servido de arapuca perfeita para os citados “desavisados” que não conseguem enxergar os bastidores, o movimento jurídico profissionalmente realizado para extrair responsabilidade das igrejas; não se pode esquecer, contudo, que a hora de honrar os compromissos assumidos no plano chegará, mais cedo ou mais tarde, e a conveniência do pagamento dos salários em dia – uma vez calado este canto da sereia – tornar-se-á um pesadelo aos incautos professores, que de boa-fé se enfeitiçaram, deixando-os à margem da mínima segurança no recebimento de seus créditos, em virtude de um plano recuperatório que eles próprios, em tese, teriam aprovado por conta de uma miopia que lhes contagiou e lhes tomou de assalto!
Que Deus olhe por todos! Porque a Igreja Metodista…
*Rodrigo Valente Mota, sócio advogado de Drummond, Piva e Valente Advogados Associados