Sinproep-DF: A excrescência do abuso do direito de expressão do deputado que atacou educadores
Por Trajano Jardim*
A Constituição de 1988, denominada Cidadã, por Ulisses Guimarães, não é contextualizada isoladamente nos seus preceitos. Tanto que os constitucionalistas STRECK; OLIVEIRA; NUNES afirmam que “quanto à expressão quaisquer de suas opiniões, palavras e votos, reforça o entendimento de que a imunidade material abrange as esferas penal, cível e administrativa/política. Mas isso não quer dizer que possa invocar a prerrogativa o parlamentar que tenha feito pronunciamento – dentro ou fora do parlamento – em desconexão com o exercício do mandato legislativo.”
Ou seja, a imunidade somente deflui de atos praticados em decorrência da função parlamentar. Imunidade não é blindagem. Seria uma contradição que, em nome da democracia e da garantia da liberdade do exercício do mandato, viéssemos a entender que o parlamentar é uma pessoa acima da lei, podendo “dizer qualquer coisa” e invocar a proteção da expressão semântica “quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”.
Assim, diante dos preceitos legais da Carta Magna, podemos compreender que a compatibilização da liberdade de expressão com a responsabilização pelo discurso manifestado encontra perfeita expressão na vedação à censura (art. 5°, IX CR/88). Mas, nem por isso, podemos afirmar que essa vedação não é absoluta, como se espera pela compreensão de que não existem direitos absolutos (com a possível exceção da vedação à tortura).
A par desses argumentos, as declarações do líder do governo Bolsonaro na Câmara, que ataca os educadores brasileiros, escancaram o real motivo do PL 5595/20, de autoria da deputada Paula Belmonte (Cidadania-DF), que reconhece a educação básica e a educação superior, em formato presencial, como serviços e atividades essenciais e, na sua finalidade, é estabelecer entraves aos docentes para que não possam usar o preceito constitucional de lançar mão da greve para garantir direitos.
O deputado federal Ricardo Barros (PP/PR) é uma dessas figuras oportunistas da política brasileira. O parlamentar compõe o conhecido bloco político denominado de Centrão. Está no sexto mandato. Pertence ao que se convencionou chamar de baixo clero da Câmara e nunca se posicionou por qualquer projeto de país, apenas garantiu a possibilidade de se manter em algum cargo, para si e para seus apadrinhados, e amealhar as benesses do poder com negociatas.
Durante a sua carreira de parlamentar, foi líder nos governos Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT), além de vice-líder no governo Dilma Rousseff (PT). Foi ainda ministro da Saúde de Michel Temer (MDB). Tem uma trajetória política marcada por problemas na Justiça, em que acumula dezenas de processos. Em outubro de 2019, teve o mandato cassado pelo Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR) acusado de comprar votos durante a campanha eleitoral de 2018.
É esse tipo de indivíduo, nanico da política nacional, que, na sua estultice, em entrevista concedida à rede de televisão CNN Brasil, teve a pachorra de dizer que não existe conectividade nas escolas brasileiras, porque não existe demanda. Que as escolas não pedem a conectividade. Em seu raciocínio torpe, afirma que as diretoras das escolas não entendem de informática. O deputado, engenheiro de formação, mas que nunca exerceu a profissão, na declaração demonstra desconhecer o papel que os educadores prestam ao País, recebendo salários aviltados, enquanto centenas de ignorantes aproveitadores recebem fortunas para nada produzirem em prol da nação.
O deputado Barros faz parte de um governo de fanfarrões que tem como único projeto a destruição do País. Não se podia mesmo esperar nada diferente de seu líder na Câmara. Não bastasse isso, o parlamentar, que já foi ministro da Saúde do governo golpista de Michel Temer e, por isso, responde a processo instaurado pelo Ministério Público Federal por improbidade administrativa na compra de medicamentos.
Essa é a figura que, sem cerimônia, ataca os(as) profissionais da educação do Brasil, no momento em que passamos pela pior fase da pandemia em nosso país e quando parcelas dos profissionais da educação estão se reinventando, colocando em risco a saúde e a vida para cumprir com o seu dever cívico de cidadão, diferente dos parlamentares do seu grupo, que, além de pouco trabalharem em tempos normais, trabalham menos ainda em tempo de pandemia. A declaração desse senhor demonstra o seu caráter desonesto. Memo assim, ele se arvora em ser um representante do povo. Pobre povo que lhe concedeu 85 mil votos.
Os(as) educadores(as) brasileiros(as), senhor deputado, estão trabalhando muito nesta pandemia. Alguns, como os da rede privada, de forma presencial, mesmo correndo riscos e a rede pública não presencialmente, para não aprofundar o caos no país promovido por seu governo e por parlamentares como o senhor. Estamos todos(as), professores(as) e funcionários(as) da educação, desdobrando-nos no ensino remoto, aquele que tanto precisa da conectividade, que o senhor, de forma venal, ousou dizer que não tem demanda por parte das escolas.
Por isso, senhor deputado, estamos lutamos pela derrubada do veto presidencial nº 10/2021, que tem impedido estados, DF e municípios de receberem cerca de R$ 3,5 bilhões, neste ano de 2021, para satisfazer as necessidades de oferta universal e de qualidade no ensino básico público do país.
Após essas falas desrespeitosas, com aquela que é a profissão mais nobre de todas, pela qual o senhor passou e parece que nada aprendeu, desnudou a intenção do projeto do governo em aprovar o PL 5595/20. Trata-se de um projeto que tem como objetivo, sob o manto de classificar a educação como atividade essencial, retomar as atividades presenciais nas escolas brasileiras à força. Dentro dos moldes ditatoriais defendidos por toda a sua corja.
Continuaremos na nossa trincheira com a certeza de que os ventos da democracia trarão novos tempos. E nós vamos fazer a Educação que sempre sonhamos, na ótica de Paulo Freire: libertadora, formadora de cidadãos conscientes, que não serão enganados por qualquer Ricardo Barros.
*Trajano Jardim é professor Universitário – Mestre em Ciência Política – Cientista Político – Diretor do Sinproep-DF – Jornalista Profissional.