Sinproep-DF: Grupos Educacionais Privados na Bolsa de Valores
O diretor jurídico do Sinproep-DF e coordenador da Secretaria de Assuntos Institucionais da Contee, Rodrigo de Paula, analisa neste artigo, o caminho avassalador da financeirização do sistema educacional no Brasil, a partir de um estudo do Instituto Tricontinental de Pesquisa Social, publicado em uma cartilha sobre o assunto
O Instituto Tricontinental de Pesquisa Social, uma instituição internacional, impulsionada por organizações populares e políticas da Ásia, da África e da América Latina, que tem como objetivo desenvolver pesquisas e investigações que fortaleçam o entendimento da realidade e a atuação dos diversos atores na sociedade; acaba de publicar uma cartilha denominada A Educação brasileira na bolsa de valores: as oito empresas privadas de capital aberto que atuam no setor educacional.
A Constituição Federal, no capítulo III, que trata da educação, define, em seu artigo 205, que a educação é direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Ainda nesse sentido, o artigo 209 abre espaço para o ensino privado, desde que atendidas as seguintes condições: I – cumprimento das normas gerais da educação nacional; II – autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Público.
Com a pressão do capital financeiro junto ao MEC, nos últimos anos, principalmente nos governos Collor e Fernando Henrique, a abertura da educação ao setor privado se deu de forma avassaladora no segmento do Ensino Superior. Isso aconteceu principalmente na gestão do ministro Paulo Renato, que abriu espaço para interpretação equivocada do artigo 209 da CF/88, considerando a educação como qualquer mercadoria, e que as instituições de ensino poderiam seguir os preceitos do direito privado, sem a interveniência do Estado.
Dessa forma, o documento busca mostrar como o capital financeiro se insere na educação brasileira e é dirigido, basicamente, para militantes, ativistas, sindicalistas, estudantes e pessoas que não dominam o “economês”, mas que têm interesse em entender como as instituições privadas educacionais funcionam hoje no Brasil e como elas se inseriram no mercado educacional, em empresas de capital aberto, com altos investimentos nas Bolsas de Valores nacionais e internacionais, com uma visão mercadológica do ensino voltada exclusivamente para o lucro.
A cartilha apresenta algumas informações básicas sobre oito empresas de capital aberto que atuam no setor: Kroton Educacional S.A. (também conhecida como Cogna), Yduqs Participações S.A., Ser Educacional S.A., Ânima Holding S.A., Bahema Educação S.A., Arco Educação S.A., Afya Participações S.A., Vasta Plataform Limited. Instituições bem conhecidas, embora nem todas estejam entre as maiores do ramo.
O espectro das instituições educacionais privadas no Brasil é dividido em modalidades diversificadas. Pelo estudo do Tricontinental, identificam-se instituições filantrópicas, geralmente vinculadas a entidades religiosas, assim como as empresas limitadas e as sociedades anônimas de capital fechado e de capital aberto, que não foram objeto da pesquisa, que trata apenas das empresas que têm capital aberto e que, portanto, negociam seus títulos de propriedade na Bolsa de Valores.
O fluxo de financeirização no setor privado ampliou-se, envolvendo não apenas a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), mas também a Bolsa de Valores de Nova York (Nasdaq), na qual algumas empresas brasileiras vêm se inserindo desde 2017. Conforme define a cartilha, hoje temos cinco empresas de serviços educacionais cotadas na Bovespa (Kroton, Yduqs, Ser, Ânima e Bahema) e três cotadas na Nasdaq (Arco, Afya e Vasta). Além delas, a Eleva Educação, de propriedade de Jorge Paulo Lemann, anunciou recentemente a pretensão de abrir capital na Bolsa de Nova York.
O estudo mostra, também, que esse fenômeno conhecido como financeirização pode ser definido como a ampliação e a autonomização relativa da esfera financeira em relação ao mundo da produção material de riquezas. Esse fenômeno ganhou impulso crescente em escala internacional a partir da crise dos anos 1970 e se aprofundou com a implantação do modelo neoliberal nas décadas mais recentes. Esses “mecanismos, pelos quais a financeirização se apropria das atividades educacionais, faz com que essas empresas sejam regidas não apenas pela lógica do lucro, provindo da venda de produtos e serviços, mas também pela lógica financeira e especulativa do comércio de títulos”.
Hoje, a educação no Brasil segue a lógica do mercado financeiro, em todos os segmentos, em um grave atentado à soberania nacional, além de interferir na qualidade do ensino, que passa a ser dirigido pela necessidade da rápida rentabilidade. Transformando-se em um grande obstáculo que teremos de superar, no decurso das nossas lutas, é necessário buscar estudar os mecanismos e os seus graus de complexidade da lógica da financeirização que regem o funcionamento dessas empresas.
E reafirmar a nossa luta: “Educação não é mercadoria”.
Acesse aqui a Cartilha do Tricontinental