ST: nem todo acordo prevalece sobre a CLT. Decisão contraria presidente e STF
São Paulo – Decisão do Pleno do Tribunal Superior do Trabalho (TST) contrariou o presidente do órgão, Ives Gandra Filho, voto vencido, e precedente do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre prevalência de acordos coletivos sobre a CLT. O caso se refere a ação movida por um trabalhador rural contra a Usina de Açúcar Santa Terezinha, de Maringá (PR), condenada a pagar adicional de hora extra e reflexos sobre verbas trabalhistas. A empresa havia recorrido, alegando que firmou acordo com o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Mariluz.
“Uma coisa é flexibilizar o cumprimento das leis trabalhistas e valorizar a negociação coletiva. Outra, muito diferente, é dar um sinal verde para a pura e simples redução de direitos, contrariando a natureza e os fundamentos do Direito do Trabalho”, afirmou o ministro João Oreste Dalazen, ex-presidente do TST. O atual mandatário, Gandra Filho, considerava que o caso se encaixava em precedente do ministro Teori Zavascki, do STF, baseado em artigo da Constituição que admite flexibilização de salário e jornada. “Não está em jogo a saúde do trabalhador nem a indisponibilidade de direitos”, declarou.
No julgamento, o TST reafirmou sua própria jurisprudência sobre a natureza salarial das chamadas horas in itinere (de deslocamento entre casa e trabalho). Assim, a maioria do Pleno negou recurso à empresa, que havia sido condenada a pagar o adicional. O Tribunal Regional (TRT) do Paraná havia entendido que a supressão de horas in itinere e direitos relacionados só poderia acontecer se houvesse alguma vantagem compensatória para os funcionários definida em acordo coletivo.
Em seu recurso, a Usina argumentou que houve um acerto entre as partes, “com chancela sindical”, evocando incisos do artigo 7º da Constituição, sobre direitos dos trabalhadores urbanos e rurais. A Segunda Turma do TST negou recurso à empresa, e o caso acabou no Pleno. O relator do processo, ministro Augusto César Leite de Carvalho, listou seis fundamentos para também negar recurso, dos quais dois prevaleceram: a autonomia sindical não é absoluta e os precedentes do STF não se aplicam ao caso em questão. A maioria dos magistrados entendeu que não houve contrapartida aos trabalhadores.
Em um dos precedentes, o Supremo admitiu quitação ampla a trabalhadores que aderiram a um plano de demissão voluntária no Banco do Estado de Santa Catarina. No outro, em decisão monocrática (individual), o ministro Teori Zavascki validou acordo coletivo que suprimiu horas in itinere em uma usina de Pernambuco.
Assim, ficaram vencidos, além do presidente, os ministros Barros Levenhagen (outro ex-presidente do TST), Maria Cristina Peduzzi e Dora Maria da Costa. Defensor da flexibilização das leis trabalhistas, Gandra Filho também discordou do entendimento de que não houve contrapartida.
“Está em jogo a própria amplitude das negociações coletivas de trabalho no país diante dos direitos da Constituição e das leis”, afirmou, em seu voto, o ministro José Roberto Freire Pimenta. “Em jogo, o princípio da prevalência do negociado sobre o legislado”, acrescentou.
“Tivemos um julgamento histórico, fixando parâmetros que vão nos balizar no TST”, declarou Gandra Filho. A Usina ainda pode recorrer ao STF.