Stédile: Derrota do fascismo no Brasil depende de políticas que protejam a classe trabalhadora
Em seis meses, governo Lula consegue avançar em várias áreas, mesmo carregando herança do bolsonarismo
No último episódio da terceira temporada, o podcast Três por Quatro fez um balanço do que foram os primeiros seis meses do novo governo Lula, desde a posse do novo presidente, a superação de uma tentativa de golpe, reorganização de políticas públicas e articulações para formação de base do governo no Congresso, instalação de CPIs e a inelegibilidade de Jair Bolsonaro.
Para Marina Slhessarenko Barreto, pesquisadora do Núcleo Direito e Democracia do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap) e do Centro de Análise da Liberdade e do Autoritarismo, a impressão é que “a gente está vivendo seis meses que foram décadas”.
“Num primeiro momento, a gente pode respirar aliviado, no sentido de que até aqui as instituições estavam vivendo muito em modo de autodefesa. Então a gente viveu quatro anos de destruição total. Todo mundo engajado em fazer o mínimo, defender suas próprias atribuições institucionais. Agora, a gente está vivendo […] um momento em que está se punindo pelo que aconteceu”, afirma a pesquisadora.
O comentarista João Pedro Stédile, liderança do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), também avaliou a nova conjuntura política instaurada pelo novo governo. Para ele, o Brasil teve uma vitória eleitoral muito importante que reconduziu as forças progressistas, ao executivo: “Isso alterou a correlação de forças políticas. Mas não alterou a correlação de forças da sociedade, do ponto de vista econômico, que é como se movem as classes sociais no Brasil”, explica.
Confira o episódio completo:
Segundo Stédile, o governo Lula tem focado em três objetivos: combater o fascismo, fortalecer a política externa e recuperar a economia. “Primeiro, derrotar os resquícios do fascismo dentro do estado brasileiro. Que não é uma tarefa fácil, nem rápida, porque os ‘fascistinhas’ colocados pelo ‘capetão rachadinha’ estão incrustados em todo aparato do estado brasileiro. Houve trocas na cabeça política dos ministérios, mas entre a burocracia tem muita gente infiltrada ainda fascista”.
Em segundo, Stédile pontua a política externa. “Nisso o governo tirou nota dez com louvor. Porque o Lula gosta de viajar, é da natureza dele a negociação, ele se movimentou muito bem e foi a China, Europa, Argentina, convocou os presidentes da América do Sul para Brasília. Então ele, de fato, avançou muito e recuperou o Brasil como um expoente na geopolítica internacional”, explica.
Já em terceiro lugar, a liderança do MST destaca a recuperação da economia. “Aí estamos tendo mais dificuldades. Porque para recuperar o Estado como indutor da economia, o Estado vai atuar fundamentalmente nas inversões produtivas, e isso leva tempo. Ainda estamos funcionando com o piloto automático”.
Neste cenário, a pesquisadora Marina Barreto evidencia as tendências negativas nesses últimos seis meses de governo. Entre elas, as novas narrativas utilizadas pela extrema direita.
“O que a gente também percebeu é como a extrema direita está sabendo manipular um discurso que era da esquerda, um discurso que era progressista, de criticar as instituições dentro de um cenário democrático. […] É muito importante a gente fazer nesse momento: é disputar essa narrativa, disputar uma narrativa de que podemos e devemos criticar as instituições, mas dentro de um quadro democrático, dentro de um quadro de respeito às instituições”.
Já Stédile ressalta os resquícios do antigo governo infiltrados na estrutura política atual. Segundo ele, a herança que o ex-governo Bolsonaro deixou em Brasília, segue “cobrando um pedágio caríssimo”. “Essa semana mesmo, o Lula teve que liberar dois bilhões em emendas. E todos os beneficiários são os deputados de direita. Então, a direita segue se locupletando com o mesmo Modus Operandi, com as emendas e com favores que o executivo tem que dar”.
O Três por Quatro não deixou de falar sobre a recente decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que declarou a inelegibilidade do ex-presidente da Jair Bolsonaro, por 5 votos a 2. No bate-papo, Marina lembrou que a questão avaliada pelos ministros era, justamente, abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação, em caráter eleitoral.
Para Stédile, o ex-presidente já é “carta fora do baralho”. “A liderança do MST acredita que Bolsonaro não tem força própria, ele só se elegeu presidente porque a burguesia o elegeu com seu poder econômico. Então agora eles recolocaram o Bolsonaro no seu devido lugar. Lá perto da lata de lixo. […] E acho que o poder judiciário seguirá enquadrando outras forças de direita. Como à própria os oficiais do exército que se envolveram no golpe.”, destaca.
Agora a expectativa é para novas personalidades que possam surgir na política nacional para encabeçar as ideologias defendidas pela extrema direita. “Eles vão ter que pensar muito bem como que eles vão estruturar o discurso daqui pra frente porque não vai ser aceitável que eles tentem entrar nessas empreitadas absolutamente golpistas”, conclui Marina.
O podcast Três por Quatro é apresentado por Nara Lacerda e Rodrigo Gomes, que atuam na equipe de jornalismo do Brasil de Fato. Novos episódios são lançados toda sexta-feira pela manhã.
Edição: Rodrigo Gomes