Trabalhadores fazem fila de oito horas sob o sol por vaga de emprego

O trabalhador Marcelo Fernandes de Lima, de 21 anos, chegou às quatro horas da manhã na fila do mutirão do emprego promovido pela União Geral dos Trabalhadores (UGT), em São Paulo (SP). Na frente dele, havia pelo menos 150 pessoas, muitas das quais viraram a noite de segunda (25) para terça-feira (26) no Vale do Anhangabaú, na região central. São seis mil vagas oferecidas por 28 empresas, de diferentes setores, com salário médio de R$ 1,5 mil com carteira assinada.

Por volta do meio-dia, depois de oito horas de espera sob o sol, o jovem trabalhador estava prestes a entrar no prédio da central sindical quando conversou com a reportagem do Brasil de Fato. Ao todo, eram 20 mil trabalhadores na fila.

Lima trabalha desde os 15 anos de idade e passou por várias empresas. Há um ano, está desempregado. A notícia da demissão veio na mesma época em que o governo Michel Temer (MDB) anunciou a reforma trabalhista, com a promessa de gerar dois milhões de empregos.

“É só ver a fila. Está todo mundo procurando, e nada. Não se pode escolher mais. O que vier, a gente está abraçando”, disse.

No último trabalho registrado em carteira, em uma fábrica de roupas, o jovem recebia um salário mínimo. “Fazia um esforço extra e conseguia um trabalho por fora”, explicou.

Segundo Lima, a estagnação econômica e a precarização do mercado de trabalho, após a reforma trabalhista, dificultam o acesso a empregos formais. A taxa de desemprego no Brasil aumentou para 12% em três meses, conforme os dados mais atualizados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgados em janeiro. Ao todo, são 12,7 milhões de pessoas desempregadas.

Em seis anos no mercado de trabalho, Marcelo conseguiu somar nove meses de carteira assinada. Ou seja, em média, a cada dez meses de trabalho, ele contribuiu com o INSS durante um mês e seis dias.

Se mantiver essa média de tempo de trabalho formal e contribuição com o INSS, Marcelo teria que trabalhar por 160 anos para conseguir somar os 20 anos de contribuição que a proposta do presidente Jair Bolsonaro (PSL) exige para a aposentadoria.

Lima manda recado durante o tempo de espera na fila. (Foto: Vanessa Nicolav)

O presidente da UGT, Ricardo Patah, também diz que a situação econômica do Brasil se reflete na oferta de empregos.

“A reforma foi feita para acabar com o movimento sindical. Não gerou nada de emprego, gerou vaga na informalidade. Várias reportagens apontam o aumento de postos de trabalho nessa área. Tem lá o trabalho intermitente que, sem regra nenhuma, é trabalho análogo à escravidão”, lamentou Patah. “Para dar um exemplo, teve uma empresa que contratou as pessoas para ganharem R$ 4,85 por hora. Por semana, seria, R$ 25. Por mês, dá R$ 100. O pessoal aceita porque tem que comprar o pão para casa. Só que esqueceram que, para estar no sistema previdenciário, precisa recolher 8% do salário mínimo, ou seja, R$ 80. A pessoa que faz o trabalho intermitente nesta empresa paga para trabalhar. É uma vergonha”.

A meta do mutirão, que vai até sexta-feira (29), é preencher 90% das seis mil vagas. A fila por emprego aumentou mais de 185% na comparação com os dois mutirões realizados pela UGT no ano passado.

“Nas vezes anteriores, tinha fila de seis, sete mil pessoas. Hoje tem 20 mil. Está demonstrada a cara do desemprego, da desmotivação da população brasileira. Isso nos preocupa muito, porque números, todo mundo tem, mas quando você vê a cara, pessoas com a família, sofridas, passando a noite aí…”, lamentou Patah.

As estimativas de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) foram reduzidas duas vezes desde o início do governo Bolsonaro, o que reflete a estagnação econômica e a falta de perspectivas.

Nos dois primeiros mutirões, que aconteceram em julho e agosto de 2018, foram 6 mil vagas oferecidas, e 3,5 mil trabalhadores conseguiram um emprego. O índice só não foi maior porque, segundo a UGT, parte dos trabalhadores não tinham a qualificação e a capacitação exigidas pelas empresas.

Neste mutirão, a UGT também fechou parcerias com o Senai e o Centro Paula Souza para cursos gratuitos de capacitação.

O Palácio do Planalto não respondeu as perguntas do Brasil de Fato sobre a estagnação da economia, as promessas de geração de emprego da campanha e os impactos da reforma trabalhista nos índices de desemprego.

Do Brasil de Fato

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